Muitas das recentes reflexões acerca da produção da diferença e da análise da desigualdade social vêm investindo na articulação entre os chamados "marcadores sociais da diferença". Nesse amplo cenário que envolve os debates acerca dos direitos diferenciados e das políticas de reconhecimento, da produção de novas sensibilidades e da concomitante ressemantização de antigas formas de exclusão, a intersecção entre raça, nação, sexualidade e gênero ganha destaque. O objetivo deste artigo é refletir sobre a forma como um certo conjunto de marcadores da diferença vem sendo agenciado em reflexões acadêmicas e políticas recentes. Mais especificamente, este artigo irá focar três eixos: 1) o da (re)construção dos Estados nacionais e de certas representações de nação; 2) o campo dos direitos humanos: da regulação à construção de sujeitos de direitos; e 3) o das identidades subjetivas, do espaço de agência, do cuidado de si e da inserção em novas ou renovadas redes de sociabilidade.
O objetivo deste artigo é refletir sobre um conjunto de questões relativas ao racismo, à sexualidade e ao contato intercultural na África do Sul, mais especificamente em Cape Town. Esta cidade, que já foi reconhecida como democrática, com expressiva população coloured e gay friendly se apresenta atualmente como uma das mais desiguais da África do Sul pós- apartheid. Percorremos trajetórias de homens e mulheres homo e heterossexuais, de diferentes raças e regiões, no sentido de abrir a escuta para suas experiências, dar inteligibilidade a seus campos de negociação e qualificar formas ressemantizadas de exclusão. Objetiva-se analisar uma nova e relativamente recente sensibilidade social advinda com a "rainbow"nation" - a experiência de mistura em sua articulação com marcadores sociais da diferença.
O objetivo deste artigo é trazer à cena um outro pólo de um esquema comparativo que tradicionalmente toma como referência os Estados Unidos e que aparece em muito menor destaque nas análises clássicas sobre as relações "raciais": a África do Sul. O foco desta comparação serão os relacionamentos afetivo-sexuais "inter-raciais" em ambos os países. Tais relacionamentos, sejam eles formais ou não, são tidos como uma espécie de sismógrafo do grau e extensão do preconceito e da discriminação "raciais" e fornecem um rico campo exploratório para o inter-cruzamento e análise sobre alguns arranjos possíveis entre "raça", sexualidade e gênero.
IntroduçãoO objetivo deste trabalho é analisar a inter-relação entre "raça", 1 gênero e erotismo na África do Sul, a partir da discussão de dois casos perfilados na Law Report e enquadrados na Immorality Actlei que proibia intercurso carnal "inter-racial", decretada em 1927 e que recebeu em 1950 (início da era do apartheid) uma nova emenda, que concedia ao Estado maior poder de vigilância e controle sobre os relacionamentos afetivo-sexuais "inter-raciais". 2 Meu objetivo é ajustar o foco para a percepção de "raça" que preside esse empreendimento, assim como dar visibilidade à importância das assimetrias de gênero e sexualidade na sua construção.Ao contrário da "etiqueta racial" brasileira, que impôs na esfera pública e política certo silêncio sobre as relações afetivo-sexuais "heterocrômi-cas", 3 na África do Sul tais relacionamentos foram regulados (e organizados) explicitamente mediante uma legislação específica, constituída sob a lógi-ca de uma razão de Estado. As idéias sobre separação e "mistura", assim como a própria construção da alteridade "racial" tiveram, no Brasil e na África do Sul, em um certo âmbito, tratamentos absolutamente diferenciados. A valorização do contato e da "mistura" no eixo das representações sociais no Brasil não exclui, entretanto, no interior dessa mesma esfera, a "separação" 4 -a própria tendên-
Resumo:A África do Sul é um país com uma história recente inflamada por lutas por direitos. O fim do apartheid e a criação de ações afirmativas marcam importantes momentos nessa história. Este artigo enfoca algumas recentes reverberações desses marcos nas experiências de jovens na Cidade do Cabo. Nesse contexto, a competência em diferentes línguas e sotaques emerge como uma estratégia de disputa social, econômica e identitária, carregada de representações que rememoram os longos anos da polí-tica de racismo legal. Por meio da análise de entrevistas no formato de história de vida, pretende-se explorar essas estratégias enquanto manobras possíveis num complexo campo de poder.
Sempre me impressionou a permanente e trágica ingerência da minoria racista da África do Sul no meu país, onde, sobretudo na década de 1980, incontáveis moçambicanos viram o rumo das suas vidas desviado ou, simplesmente, deixaram de existir, por vontade e por ordem dos defensores do apartheid. Lília Momplé, em Neighbours 3 Esse projeto foi concebido originalmente por
Apresentação Neste dossiê partilhamos com os leitores alguns dos resultados da pesquisa internacional Relations among "race", sexuality and gender in different local and national contexts. 1 Seu principal objetivo foi desenvolver uma ampla pesquisa comparada sobre raça, sexualidade, gênero, classe e os cuidados com a saúde, especialmente aqueles relativos à prevenção das DSTs/Aids no Brasil (Rio de Janeiro e São Paulo), África do Sul (Cape Town e Johannesburg) e Estados Unidos da América (São Francisco e Chicago). Mais especificamente, o projeto objetivou analisar o lugar da raça (cor/etnicidade) e do racismo; do gênero e dos estereótipos acerca da construção das identidades sexuais e, finalmente, das condições materiais na vida de jovens entre 18 e 24/26 anos. O ponto de partida que informa essa pesquisa está calcado na ideia de que as intersecções entre raça, sexualidade, classe e gênero são de fundamental importância no acesso a bens e status, ocupação/emprego, na trajetória escolar, nas escolhas afetivosexuais, além de incidirem sobre a vulnerabilidade dos indivíduos frente às DST/AIDS. Portanto, o projeto teve por objetivo analisar o impacto dessas intersecções na construção de si, nas vivências afetivo-sexuais, nas atividades profissionais e de lazer, no enfrentamento cotidiano do preconceito e da exclusão. Em cada uma das cidades incluídas no projeto foi desenvolvida pesquisa qualitativa que consistiu, primeiramente, de um trabalho de campo etnográfico, em lugares freqüentados por 1 A coordenação internacional da pesquisa esteve a cargo da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas-USP/Núcleo de Estudos sobre Marcadores Sociais da Diferença-NUMAS (
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