Neste artigo pretendo analisar algumas tendências de transformação na atualidade do campo religioso brasileiro, captadas por vários pesquisadores, entre os quais me incluo, sobre trajetórias religiosas individuais, duplicidades e multiplicidades religiosas. De início, contudo, pretendo resgatar algumas análises do fenômeno religioso na modernidade realizadas por um autor que, apesar da reconhecida importância de sua obra, é pouco mencionado e conhecido entre nós: Ernst Troeltsch, notável historiador alemão da religião e originalmente teólogo, contemporâneo e interlocutor de Max Weber. Não há traduções de seus textos para o português, a não ser alguns pequenos excertos de sua obra mais conhecida, sobre os conceitos de igreja e seita, publicados em coletâneas e revistas 1 . No entanto, fugirei da discussão sobre a distinção institucional entre as formas associativas (igreja e seita) propostas pelo autor, pois ele próprio já as considerava ultrapassadas para explicar a vida religiosa de seu tempo: a religiosidade eclesiástica, em ambas as formas citadas, estaria em crise já em inícios do século XX, embora não acreditasse ele em seu futuro desaparecimento. Sua crise adviria do repúdio ao autoritarismo eclesiástico no moderno mundo cristão, tanto no católico como no protestante, devido sobretudo à preocupação com a realidade imanente trazida pela modernidade