“…É aqui que ações cosméticas (que depois servirão de vitrine e propaganda às empresas) ganham relevo no EIA ao destacar que os "participantes do projeto farão investimentos consideráveis em programas e ações ambientais", incluindo "monitoramento e educação ambientais e criação de APP no entorno das PCHs" (Brasil, 2010b, p. 23). Esse tipo de retórica (visando persuadir que tudo está sob controle e que medidas adequadas serão tomadas) e prática (cujo fim é disciplinar a ação das pessoas, a exemplo da inusitada pretensão de dar aula de educação ambiental aos indígenas), insere-se no que Zhouri et al (2005) chamam de "paradigma da adequação ambiental". Trata-se de institucionalizar a crença de que o saber competente, a "hidrelétrica limpa" e a gestão racional de conflitos via técnicas de negociação garantiriam soluções "consensuadas" e "sustentáveis".…”
Section: Componente Indígena E a Produção Da Aceitação Social Das Pchsunclassified
Artigo recebido em 21 de fevereiro de 2017, versão final aceita em 13 de outubro de 2017.
RESUMO:O artigo analisa o conflito entre grupos das etnias Kaingang e Guarani e aqueles que representam a tentativa de se construir quatro pequenas centrais hidrelétricas (PCHs) no rio Jacuizinho/RS. O foco da análise recai especificamente sobre uma das etapas do licenciamento ambiental das obras: a elaboração do "Componente Indígena" (CI) que, em tese, deveria ser elaborado com os Estudos de Impacto Ambiental. No caso do licenciamento, ele é aqui analisado sob a perspectiva de um ritual, um evento vivido coletivamente como drama social, com etapas mais ou menos formalizadas. Como se tenta mostrar, apesar da relativa maleabilidade e amplitude de indefinições e aberturas para o imprevisto que surgem ao longo de uma sequência de ritos prévios, cada um dos atores (Funai, Fepam, empreendedor, empresa intermediadora, peritos que participaram do CI, lideranças políticas locais, lideranças Guarani e Kaingang, seus familiares e aliados) ocupa determinados papéis (ou são levados a), desempenha uma performance e constitui ações e estratégias na disputa pela apropriação material e simbólica de um mesmo território.Palavras-chave: povos indígenas; conflito ambiental; licenciamento ambiental; PCHs
ABSTRACT:The present article analyzes the conflict among Kaingang, Guarani and individuals who represent the attempt to build four small hydroeletric stations (PCHs) at the Jacuizinho river/RS. The analyses focuses on one of the stages of the environmental permission for the construction: the elaboration of the Indigenous Component,
“…É aqui que ações cosméticas (que depois servirão de vitrine e propaganda às empresas) ganham relevo no EIA ao destacar que os "participantes do projeto farão investimentos consideráveis em programas e ações ambientais", incluindo "monitoramento e educação ambientais e criação de APP no entorno das PCHs" (Brasil, 2010b, p. 23). Esse tipo de retórica (visando persuadir que tudo está sob controle e que medidas adequadas serão tomadas) e prática (cujo fim é disciplinar a ação das pessoas, a exemplo da inusitada pretensão de dar aula de educação ambiental aos indígenas), insere-se no que Zhouri et al (2005) chamam de "paradigma da adequação ambiental". Trata-se de institucionalizar a crença de que o saber competente, a "hidrelétrica limpa" e a gestão racional de conflitos via técnicas de negociação garantiriam soluções "consensuadas" e "sustentáveis".…”
Section: Componente Indígena E a Produção Da Aceitação Social Das Pchsunclassified
Artigo recebido em 21 de fevereiro de 2017, versão final aceita em 13 de outubro de 2017.
RESUMO:O artigo analisa o conflito entre grupos das etnias Kaingang e Guarani e aqueles que representam a tentativa de se construir quatro pequenas centrais hidrelétricas (PCHs) no rio Jacuizinho/RS. O foco da análise recai especificamente sobre uma das etapas do licenciamento ambiental das obras: a elaboração do "Componente Indígena" (CI) que, em tese, deveria ser elaborado com os Estudos de Impacto Ambiental. No caso do licenciamento, ele é aqui analisado sob a perspectiva de um ritual, um evento vivido coletivamente como drama social, com etapas mais ou menos formalizadas. Como se tenta mostrar, apesar da relativa maleabilidade e amplitude de indefinições e aberturas para o imprevisto que surgem ao longo de uma sequência de ritos prévios, cada um dos atores (Funai, Fepam, empreendedor, empresa intermediadora, peritos que participaram do CI, lideranças políticas locais, lideranças Guarani e Kaingang, seus familiares e aliados) ocupa determinados papéis (ou são levados a), desempenha uma performance e constitui ações e estratégias na disputa pela apropriação material e simbólica de um mesmo território.Palavras-chave: povos indígenas; conflito ambiental; licenciamento ambiental; PCHs
ABSTRACT:The present article analyzes the conflict among Kaingang, Guarani and individuals who represent the attempt to build four small hydroeletric stations (PCHs) at the Jacuizinho river/RS. The analyses focuses on one of the stages of the environmental permission for the construction: the elaboration of the Indigenous Component,
“…Os autores concluem, portanto, que os conflitos ambientais evidenciam as relações de expropriação material e violência simbólica, conduzindo ao questionamento do modelo de desenvolvimento hegemônico (ACSELRAD, 2004;2005;ZHOURI, 2004;ZHOURI;LASCHEFSKI, 2010). Apontam, por essa razão, a necessidade de explicitar os dissensos e a diversidade de projetos em curso na sociedade, uma vez que, mapear um conflito ambiental consiste mais do que se dedicar à identificação dos processos objetivos da degradação e da espoliação das condições ambientais, implica em considerar, sobretudo, o papel das comunidades nesse processo.…”
Section: Conflitosunclassified
“…Em cada configuração de modelo de desenvolvimento, salientaFleury et al (2014, p. 65), tende-se a encontrar modalidades específicas de conflitos ambientais predominantes, mas, geralmente, "a concentração de posse sobre o elemento da base material da sociedade por meio de grandes projetos de apropriação do espaço e do ambiente provoca efeitos de desestruturação de ecossistemas", ao passo que pequenos produtores, populações ribeirinhas e deslocados compulsórios são confinados em áreas exíguas.Segundo Andrea Zhouri e colaboradores (2010) a temática do desenvolvimento e dos conflitos ambientais distingue-se pela diversidade e heterogeneidade de atores sociais e dos seus modos de pensar o mundo e nele projetar o futuro. Para essa perspectiva teórica, que enfatiza o confronto entre racionalidades, via de regra "campo de lutas", os conflitos ambientais são decorrentes da implantação de um "paradigma da adequação ambiental", cuja visão tecnicista compreende o ambiente como realidade objetiva, passível de intervenção técnica e, portanto, de "adequações"(ZHOURI et al, 2005a;ZHOURI; OLIVEIRA, 2005). Nessa ótica, ações do setor privado, de grupos de ambientalistas, assim como de políticas públicas têm sido orientadas sobre esse viés que institucionaliza a crença de que o conhecimento racional dos problemas ambientais proporciona soluções técnicas, despolitizando, por sua vez, as relações sociais imbricadas.ParaZhouri e Zucarelli (2008), o caráter conflituoso refere-se à forma como uma situação é objetivamente estruturada pelas relações entre as distintase, não raro, mutuamente excludentes pretensões de uso e significados atribuídos por diferentes atores sociais a um mesmo território em disputa.…”
O propósito deste artigo consiste em explicitar as controvérsias entre atores sociais com distintos modos de significação, uso e apropriação territorial no contexto de conflito ambiental em torno do Pontal da Barra, Laranjal, Pelotas/RS. As reflexões procedem da dissertação de mestrado da autora (NEBEL, 2014), cujo objetivo consistiu em incorporar a dimensão do conflito enquanto elemento central de análise desde uma perspectiva etnográfica. Para isso, partiu-se da proposta analítica de explicitação do conflito como forma de mapeamento dos diferentes atores sociais, contemplando suas visões, posições, interesses, discursos e estratégias de disputa e legitimação no campo ambiental. De modo mais específico, o presente artigo busca problematizar o modelo dominante e hegemônico de “desenvolvimento” na região, e como essas posturas de homogeneização e exclusão podem silenciar as controvérsias públicas, subsumindo os complexos processos sociais e os diversos atores neles envolvidos. Mediante esses conflitos revelam-se as contradições e as assimetrias no agenciamento de atividades e de formas sociais de apropriação e uso dos territórios que, em última análise, são reprodutoras de “injustiças ambientais”.Palavras-chave: Conflito ambiental; Etnografía; Pontal da Barra.
“…A arena ambiental brasileira a que se refere a autora já foi discutida em distintas revisões sobre as linhas de pesquisa em ambiente e ciências sociais no Brasil (Vieira, 1992;Ferreira, 2005, entre outros), cabendo aqui ressaltar o espaço dos conflitos ambientais enquanto campo de investigação nesse contexto. Grosso modo, a partir dessas revisões contata-se que podem ser identificados três grandes grupos de autores e abordagens que configuram os conflitos ambientais como campo de investigação no Brasil atualmente: a) aqueles que dialogam com a sociologia ambiental internacional, considerada de modo amplo, orientando suas pesquisas a partir dos debates sobre arenas públicas, sociedade de risco, modernização ecológica, sustentabilidade e sociologia rural e interdisciplinaridade (Fuks, 2001;Ferreira, 1996;Almeida, 1997;Guivant, 1998;Brandenburg, 2005, entre outros); b) autores que se apropriam do arcabouço teórico-metodológico da sociologia crítica, influenciados pelas pesquisas de Pierre Bourdieu, e discutem conflitos ambientais a partir de relações simbólicas e de poder/dominação (Lopes, 2004;Acselrad, 2004;Zhouri; Laschefski, 2010, entre outros); e c) autores identificados com a antropologia, que discutem conflitos ambientais a partir de análises sobre povos tradicionais e grandes projetos de desenvolvimento. (Ribeiro, 1991;Almeida, 1996;Magalhães, 2007;Carneiro da Cunha, 2009).…”
unclassified
“…Assim, ainda que se possa considerar que este seja um campo em formação (Alonso; Costa, 2000; Zhouri; Laschefski, 2010), a relevância do tema conflitos ambientais no cenário nacional pode ser atestada pela presença de grupos de trabalho voltados para a sua discussão nos principais encontros brasileiros de ciências sociais, como nos encontros anuais da Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Ciências Sociais (ANPOCS), nos congressos da Sociedade Brasileira de Sociologia (SBS), nos encontros bianuais da Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Ambiente e Sociedade (ANPPAS), nas reuniões da Associação Brasileira de Antropologia (ABA), entre outros. Alguns balanços sobre a produção em conflitos ambientais vêm sendo publicados (Acselrad, 2004;Carneiro, 2009;Zhouri;Laschefski, 2010), e dentre as pesquisas mais emblemáticas desse campo cabe destacar em particular algumas abordagens.…”
Este artigo tem por objetivo contextualizar a concepção de ambiente como domínio de análise sociológica, com vistas a situar os conflitos ambientais como um de seus importantes desdobramentos. Para tanto, será apresentada inicialmente uma revisão de autores e pesquisas em sociologia ambiental com seus distintos enfoques, acompanhada da consideração de outras áreas da sociologia que se debruçaram sobre a relação sociedade-natureza no cenário internacional. Em seguida, será discutido como no Brasil este debate vem sendo realizado e com quais particularidades, direcionando a centralidade do enfoque para o debate acadêmico em torno do conceito de conflitos ambientais.
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