RESUMO:O artigo tem por objetivo discutir o estatuto dado pela psicanálise a experiências de gênero não inteligíveis, demonstrando que, ao considerar o inconsciente, a relação entre sexo e gênero mostra-se necessariamente refratária a qualquer tipo de normatividade. A partir da reconstrução da história política do termo heterossexual, apresentaremos uma analogia ao tipo de mecanismo crítico em jogo na utilização do termo cisgênero. Após uma discussão sobre o lugar da retórica da subversão dentro da comunidade psicanalítica, sublinharemos como a clínica promove a passagem a uma ética da fala, na qual os apegos identitários normativos são postos em questão. Ao prescindir da oposição corrente entre o normal e o patológico, a psicanálise questiona a dicotomia entre trans e cis a partir da ideia de que a inadequação a um corpo sexuado é constitutiva de todos os seres falantes. PALAVRAS-CHAVES:gênero; transsexualidade; cisgênero; Lacan; diferença sexual. Abstract:The paper proposes a discussion of the status given by psychoanalysis to unintelligible gender experiences, demonstrating that, taking the unconscious into account, the relation between sex and gender presents itself as necessarily refractory to any kind of normativity. From the reconstruction of the political etymology of the term heterosexual, we present an analogy to the kind of critical mechanism involved in the use of the term cisgender. After a discussion on the place of the rhetoric of subversion within the psychoanalytic community, we underline how the clinical context promotes a passage to an ethics of speech, in which attachments to normative identities are called into question. Dispensing with the opposition between normal and pathological, psychoanalysis questions the trans and cis dichotomy from the idea that the inadequacy of a sexed body constitutes all speaking beings. Keywords: gender; transsexuality; cisgender; Lacan; sexual difference.Resumén: El trabajo tiene como objetivo discutir el estatus dado por el psicoanálisis a las experiencias de género ininteligibles, mostrando que, al considerar el inconsciente, la relación entre el sexo y el género se muestra necesariamente refractaria a cualquier tipo de normatividad. A partir de la reconstrucción de la historia política del término heterosexual, presentamos una analogía con el tipo de mecanismo crítico implicado en el uso de la expresión cisgénero. Siguiendo una discusión sobre el lugar retórico de la subversión dentro de la comunidad psicoanalítica, subrayamos la forma por la cual la clínica promueve un pasaje a una ética del hablar, en que los apegos identitarios normativos son puestos en cuestión. Prescindiendo de la oposición entre lo normal y lo patológico, el psicoanálisis cuestiona la dicotomía entre cis y trans, a través de la idea de que la inadecuación a un cuerpo sexuado constituye a todos seres hablantes.
Pela constatação dos desafios colocados pelas teorias de gênero à psicanálise, o artigo discute a reformulação da teoria da sexuação por meio da máxima, enunciada por Lacan (1974, p. 187), “[...] o ser sexual só se autoriza por si mesmo e por alguns outros”. Baseando-se nesse dizer, o texto explora a relação entre os polos 'alguns outros' e 'si mesmo' por meio do resgate de desenvolvimentos lacanianos anteriores ao período de hegemonia estruturalista de sua obra. Em primeiro lugar, a relevância de uma alteridade plural na estruturação subjetiva é discutida a partir da análise de 'O tempo lógico', texto no qual o psicanalista concebe o advento do sujeito como um processo indissociável da lógica de uma coletividade indeterminada. Demonstra-se de que maneira o ato antecipado que parte do erro rumo à certeza é central também em 'O estádio do espelho', em que a ideia da constituição de um si mesmo é apresentada como uma unificação de caráter singular. Propõe-se, por meio de uma discussão sobre o júbilo, da retomada da relação entre imaginário e real feita por Lacan em 'A terceira' e da poesia de Fernando Pessoa, uma nova leitura da noção de gozo do Outro, amparada por uma compreensão mais ampla da teoria da sexuação. Conclui-se que tal releitura lacaniana da sexuação permite tomá-la na qualidade de um processo que não só articula diversos períodos de seu ensino como coloca o debate da psicanálise com questões de gênero em outros termos.
Cet article discute l’introduction, l’acceptation et le refus des théories sur le genre par la psychanalyse. L’axe central consiste à aborder l’articulation entre psychanalyse et études de genre dans une perspective ample, en mobilisant des débats spécifiques pour interroger la manière dont ces questions sont traitées au sein de la théorie psychanalytique. Le problème initial découle de la reconnaissance que les débats psychanalytiques sur les questions de genre sont souvent peu développés et se résument à des approches limitées et fréquemment caricaturales. Une question directrice pourrait donc être définie en ces termes : « les questions liées au genre sont-elles prises dans leur plein potentiel disruptif par les psychanalystes ou la communauté psychanalytique a-t-elle pris des positions défensives afin d’éviter un débat inconfortable » ? Ce type de questionnement conduit à réfléchir au-delà du contenu des avancées théoriques réalisées au cours des dernières décennies, pour ainsi envisager la fonction que de tels débats jouent dans la communauté psychanalytique. Cela signifie qu’analyser la manière dont ces discussions sont proposées et ont lieu pourrait indiquer des signes d’ouverture ou de refus de la psychanalyse à l’égard de ces questions. Comprendre les raisons de ce positionnement sur un sujet aussi crucial est une tâche essentielle pour les psychanalystes qui s’engagent dans la construction d’une praxis psychanalytique à la fois présente dans la culture et politiquement impliquée.
RésuméConsidérant la place centrale de la tension pour la production de savoir dans le champ psychanalytique, cet essai cherche à donner des pistes pour une approche entre la question des dites identités de genre et une des théories lacaniennes sur l'identification, à savoir, celle présentée au séminaire de 1961-1962. Après avoir repris quelques développements de Lacan sur la constitution du sujet dans le contexte du trait unaire et de la critique du principe d'identité -présente aussi chez Butler -nous proposons que le processus d'identification sexuée peut être repensé comme une réponse performée au désir de l'Autre. Mots-clés:Genre; identification; sexuation; Lacan; Butler. Gender and identification AbstractConsidering the main role of the tension in the knowledge production in psychoanalysis, this essay aims to give some hints for a possible convergence between the question of the so-called gender identities and one of Lacan's identification theories, specifically the one presented in the seminar of 1961-1962. After revisiting some developments on the subjects' constitution, the trait unaire context, as well as the identity principle critique -also present in Butler -, we propose that que gendered identification process can be reconsidered as a performed response to the desire of the Other.
Resumo O artigo discute o estatuto dado à história pela psicanálise bem como suas possíveis consequências no interior da teoria e da prática analíticas. Recorre-se, em um primeiro momento, a dois textos freudianos que aportam noções paradigmáticas sobre a história: Moisés e a religião monoteísta e Construções em análise, a fim de sublinhar diferentes noções freudianas de história. Apresenta-se de que maneira a noção de história em psicanálise permite a reformulação de conceitos como os de verdade e materialidade. Passa-se, então, à análise do lugar dado à História por Lacan, com vistas a demonstrar sua centralidade, propondo uma distinção tripartite entre diferentes regimes de historicidade - real, simbólica e imaginária. Apresenta-se, por fim, desdobramentos clínicos de uma aproximação feita por Lacan entre o analista e o historiador.
O Prof. Roberto Garcia foi editor da Psicologia Revista no período de 2018 a 2020. Professor dedicado, não faltava às reuniões e sempre chegava no horário – com seu sorriso um tanto tímido –, se destacando pelo seu entusiasmo e por sua enorme capacidade de trabalho, sem se importar em ajudar qualquer que fosse a tarefa editorial. Foi editor responsável por diversos artigos durante esse período, mesmo que alguns destes não fossem exatamente de sua área (como na edição especial sobre Psicologia do Esporte). Isso não importava. Roberto trazia a sua experiência com outras revistas e tinha grande bagagem acumulada dentro do processo de revisão por pares. Basta ver o seu currículo para encontrar publicações suas em periódicos nacionais e internacionais, participação como autor em capítulo de livro e nos inúmeros congressos e cursos de que participou. Procurava sempre se atualizar e se aprofundar em sua área da Psicologia: a Psicologia Clínica. Em destaque, nos cabe ressaltar o prêmio que ganhou em 2017 da Associação Paulista de Psicologia por sua tese de doutorado, sob orientação da Profa. Dra. Denise Ramos, intitulada: “Fatores envolvidos nos comportamentos de omissão circunstancial e de recusa do uso do preservativo em Homens que fazem sexo com Homens”. A passagem do Prof. Roberto na Psicologia Revista, sempre alegre, nos marcou e ficará registrada nos números em que participou e nas memórias de nossas reuniões. Por conta disso, esse número da Psicologia Revista é dedicado in memoriam ao nosso amigo Roberto Garcia. A seguir, alguns depoimentos de colegas que trabalhavam com o Prof. Roberto na PUC-SP.Equipe Editorial da Psicologia Revista
scite is a Brooklyn-based organization that helps researchers better discover and understand research articles through Smart Citations–citations that display the context of the citation and describe whether the article provides supporting or contrasting evidence. scite is used by students and researchers from around the world and is funded in part by the National Science Foundation and the National Institute on Drug Abuse of the National Institutes of Health.
hi@scite.ai
334 Leonard St
Brooklyn, NY 11211
Copyright © 2024 scite LLC. All rights reserved.
Made with 💙 for researchers
Part of the Research Solutions Family.