O artigo, filiado ao campo das pesquisas pós-críticas em Educação e inspirado em obras do horror gore e slasher, objetiva utilizar a imagem do zumbi para significá-lo como um modo de subjetivação em marcha. O argumento é o de que a subjetividade zumbi é um composto de posições de sujeito que carrega traços de um planeta em colapso e que urde um caráter de modelização e serialização dos sujeitos. Embora essa subjetividade possa ser demandada em diferentes instâncias e espaços, operamos com o currículo das narrativas midiáticas seriadas como um dos principais articuladores que atualizam as linhas de um “dispositivo da catastrofização”. Tal dispositivo tem servido para responder à necessidade de se definir o que conta, em um mundo em ruínas, como vivível ou matável. Concluímos o artigo afirmando que embora o currículo das narrativas seriadas acione uma necropolítica que objetive eliminar o que desordena as normas, ele terá de enfrentar uma resistência tão inventiva, astuciosa e agitadora quanto o poder que exerce.
O presente artigo toma de empréstimo uma frase de um famoso canal televisivo – “Não é TV. É HBO!” – e a reformula no sentido de mostrar um panorama investigativo que evidencia a emergência de um determinado artefato cultural: as narrativas midiáticas seriadas. O objetivo é o de evidenciar que uma narrativa seriada “Não é TV. Mas é currículo!”, a partir de contribuições das teorizações pós-críticas em intersecção com o campo dos estudos culturais. O argumento é o de que esse currículo tem disponibilizado uma “prática da maratona” que reforça a dimensão biopolítica da constituição de uma “cultura seriadora”, que não se encerra no objeto que aqui investigamos, sendo capaz de se estender a diferentes aspectos das nossas vidas, com diferentes efeitos em nossas composições como sujeitos. Com isso, passamos a significar o currículo das narrativas midiáticas seriadas como um agenciamento biopolítico desterritorializado, isto é, uma combinação de elementos díspares cujas redes constitutivas caracterizam-se fundamentalmente pela total ausência de fronteiras, atravessando um território ilimitado que não pode ser confinado por barreiras inamovíveis. Na produção dessa “cultura seriadora”, atentamos para a regulação da vida social da audiência em um exercício particular de poder, tramando-lhe em uma rede discursiva que tem demandado múltiplas posições de sujeito para comportar o máximo possível de indivíduos. Concluímos que há aqui em jogo uma “narcotização programada da vida”, capaz de provocar o empalidecimento das nossas potências, o congelamento das nossas forças vitais e a proliferação das formas estáticas e estabilizadas a partir de redundâncias subjetivas.
Inspired by the lines of force of Gilles Deleuze and Félix Guattari’s philosophies of difference, this article explores some schizoanalytical notes for the cartography of a curriculum of a cultural artifact. From the contributions of post-critical theories and their connections with the field of cultural studies, we understand serialized narratives as a curriculum. The text operates, in its stylistics, through an (auto)-fictional elaboration, bringing takes narrated by the Mapmaker, a character who presents some methodological notes of our cartographic investigation from fragments of his memories. The argument explored is that the constitutive lines of the curriculum of serialized narratives have presented a multiplicity that makes it understandable as an “anthological curriculum,” allowing us to visualize its control regions, derived from the state apparatus, and its contagion zones, typical of war machines. In this sense, the “anthological curriculum” is produced in the clash between the hard, flexible, and escape lines that compose it. Our conclusion is that the different ways in which we become ourselves and the different subject positions we assume throughout life are at stake in this artifact. Thus, we believe that the serialized narrative curriculum, by triggering lines of escape, opens spaces for other exits, providing less normative reasoning for subjects crossed by gender and sexuality dissidences.
Resumo O presente artigo, inspirado pelas linhas de força das filosofias da diferença de Gilles Deleuze e Félix Guattari, tem como objetivo explorar algumas notas esquizoanalíticas para a cartografia de um currículo de um artefato cultural. A partir das contribuições das teorias pós-críticas e suas conexões com o campo dos estudos culturais, compreendemos as narrativas seriadas como um currículo. O texto opera, em sua estilística, por meio de uma elaboração (auto)ficcional, trazendo takes narrados pelo Cartógrafo, personagem que apresenta algumas notas metodológicas da nossa investigação cartográfica a partir de fragmentos de suas memórias. O argumento explorado neste texto é o de que as linhas constitutivas do currículo das narrativas seriadas têm apresentado uma multiplicidade que o faz ser compreendido como um “currículo antológico”, permitindo visualizar as suas regiões de controle, derivadas do aparelho de Estado, e as suas zonas de contágios, próprias das máquinas de guerra. Nesse sentido, o “currículo antológico” é produzido no embate entre as linhas duras, as linhas flexíveis e as linhas de fuga que o compõem. Concluímos que o que está em jogo nesse artefato são as distintas maneiras com que nos tornamos nós mesmos, as diferentes posições de sujeito que assumimos ao longo da vida. Nesse sentido, apostamos que o currículo das narrativas seriadas, ao acionar linhas de fuga, abre espaços para outras saídas, proporcionando raciocínios menos normativos para os sujeitos atravessados por dissidências de gênero e de sexualidade.
O artigo focaliza o currículo das narrativas seriadas em suas duas expressões: a de um “currículo-maior”, constituído por linhas molares e que apresenta um sistema de referência pelo qual as formas binárias nos organizam e nos produzem enquanto sujeitos serializados; e a de um “currículo-menor”, que, ao acionar o riso e as paixões alegres, compõe um traçado de linhas de fuga capazes de desterritorializar o “currículo-maior” e a modelização da subjetividade. O argumento é o de que no currículo das narrativas seriadas pode-se ultrapassar convenções normativas e estabelecer a abertura para a constituição de outros modos de vida, apesar das linhas de força de conformidade a certos estratos. Ao cartografar duas narrativas seriadas, evidenciamos a composição de um “currículo-obsceno”, referente a série “Fleabag” e um “currículo-louco”, relativamente a série “Crazy Ex-Girlfriend”. Concluímos que no “currículo-menor”, o amor e o riso são vetores para a desagregação do “currículo-maior” das narrativas seriadas, capazes de rachar os estratos e inaugurar existências menores e criativas.
Neste artigo, investiga-se o currículo das narrativas midiáticas seriadas, significando-o como um “necrocurrículo”, um artefato pedagógico cuja ação regulatória dá-se em torno da qualificação de modos de vida e, consequentemente, distribuição de mandos de morte. O argumento é o de que, ao articular uma política de morte frente a marcadores da diferença, esse currículo tem criado e articulado significados que justificam a possibilidade de expurgo do que considera indesejado por meio de uma “tecnologia de apoptose” relacionada às práticas de programação de morte. Evidencia-se uma forma estilizada de extermínio do sujeito negro a partir desse currículo que, sob a desculpa de estar dramatizando a experiência do racismo, termina por reiterar e adicionalmente produzir a própria violência que alega estar criticando. Conclui-se que tal artefato tem atuado como uma atualização do “corpo supliciado”, de modo a ensinar que a qualquer momento um sujeito negro está vulnerável à violência e à morte.
Resumo: Filiados a uma perspectiva pós-crítica de pesquisa em Educação, significamos o artefato cultural das narrativas seriadas como um currículo. Investigamos a proveniência de um modo particular de produção de masculinidades a partir da categorização dos ‘homens difíceis’ das narrativas seriadas e perscrutamos o modo como o feminino também é enunciado nesse currículo. A partir das nossas aproximações com a esquizoanálise, argumentamos que esse currículo, ao se constituir como um “currículo-máquina” produtor de fabulações generificadas, tem sido estratificado por linhas duras, por linhas maleáveis e por linhas de fuga. Concluímos que esses discursos generificados têm apontado aquilo que é pensável e dizível acerca dos gêneros e das sexualidades de um determinado tempo.
À primeira vista, realidade e ficção parecem ser termos imiscíveis, difíceis de serem colocadas lado a lado, principalmente no que diz respeito à ação de narrar nossas histórias de vida. Conduzimos a partir desse artigo uma viagem por entre as fronteiras da realidade e da ficção, identificando e diluindo essas barreiras. Para tanto, traçamos uma discussão sobre o lugar cativo das histórias de vida, o dispositivo da memória e a biografemática. A partir dessas frentes, o objetivo geral do texto é esboçar algumas possibilidades de reinvenção de nossas histórias de vida. A linguagem cinematográfica do diretor cearense Karim Aïnouz emerge no texto como possibilidade imagética de conexão entre o real e o ficcional. Como de fato trata-se de uma viagem, o texto é intercalado por diários de bordo de Major Tom, personagem criado através da fusão dos autores do texto, inspirados no processo de escrita a dois de Deleuze e Guattari (2012), e que traz alguns relatos autobiográficos concatenados ao que é discutido. Por fim, concluímos que é possível se situar entre realidade e ficcionalidade, em nossas histórias de vida, transubstanciando o rotineiro em fantástico.
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