Este texto tem como tema central os discursos sobre desenvolvimento que circundam o Programa de Cooperação Tripartida para o Desenvolvimento Agrícola da Savana Tropical em Moçambique – ProSavana, projeto de cooperação conjunta dos governos brasileiro, japonês e moçambicano. O objetivo é interpretar como a ideia de “vazio” é produzida e reforçada no material de divulgação oficial do programa, assim como em seu Plano Diretor. Subsidiariamente, algumas entrevistas com interlocutoreschave também foram utilizadas. A reflexão mobiliza o referencial teórico-metodológico da análise do discurso de matriz francesa em diálogo com perspectivas críticas do desenvolvimento. A análise aponta para (re)produção de uma ideia de que a savana moçambicana seria um “lugar vazio”, desabitado e à espera do desenvolvimento, a despeito dos sujeitos que lá estão e de suas formas próprias de existência no mundo. Ademais, ainda que o ProSavana não se pretenda formalmente um programa de “desenvolvimento sustentável”, é evidente o imperativo de mobilizá-lo como tal. No entanto, parece ser uma tentativa inócua, tendo em vista a repetição de práticas a despeito da inovação no discurso predominante que nada implica em sustentabilidade.
Resumo Bruno Latour é parte de uma geração de pesquisadoras e pesquisadores que se propuseram a transformar por completo a maneira como as Ciências Sociais investigam e analisam a produção de ciências e tecnologias. A hesitação diante de verdades monolíticas e a reverência ao trabalho de campo nos parecem marcas importantes da heterogênea obra latouriana e se fazem ver de forma explícita nos seus estudos em laboratórios científicos, quando o autor passa a se dedicar às ciências e às técnicas, temáticas então efervescentes. O empreendimento intelectual latouriano, a despeito de (ou, justamente, em função de) seu caráter heterogêneo e interdisciplinar, sublinha a importância da dúvida e da hesitação diante do que se apresenta como fato. Se esse tensionamento é colocado nos estudos de laboratório e na fabricação de verdades científicas, há que se registrar que as Ciências Sociais não passam incólumes a essa crítica: o gesto interpretativo de Bruno Latour estremece a sociologia dominante estabelecida. Ao fazermos, aqui, uma homenagem a esse importante autor, interessa-nos realizar um sobrevoo na sua vasta vida intelectual. Essa tarefa, contudo, exige cautela. Não pretendemos expor toda sua obra, mas compilá-la em movimentos que julgamos relevantes para animar novas perguntas às pesquisas sociológicas contemporâneas.
Marcelo Pelizzoli é graduado em Filosofia, especialista em Ciência Política, mestre em Antropologia Filosófica, doutor em Filosofia e possui pós-doutorado em Bioética. É professor da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) nas áreas de Ética prática, Saúde Coletiva (PICS), Direitos Humanos (Conflitos, Justiça Restaurativa). Integra o Grupo de Ciência e Cultura de Paz e a Comissão de Direitos Humanos Dom Helder Câmara da UFPE. O professor acumula a coordenação do Espaço de Diálogo e Reparação da UFPE e do Núcleo de Justiça Restaurativa de Pernambuco. Realiza atividades de extensão na área de direitos humanos e cidadania. A seguir, ele conta os resultados colhidos junto aos sujeitos participantes das práticas e o desenvolvimento da pesquisa na área.
A cobertura de temas ambientais, historicamente pouco e mal realizada, na última década vêm se defrontando com novas questões, as quais dizem dos tempos nos quais vivemos. Se em função da especificidade do tema, muitas vezes demasiado abstrato e localizado, a formação jornalística não encontra ferramentas para conectar com o noticiário ancorado no factual, quando versões pouco ortodoxas acerca de questões ambientais emergem e ganham força, surge um dilema: qual o limite de reproduzir discursos de fontes oficiais, independentemente de sua relevância e precisão, em nome da dita objetividade jornalística? Assim, a guerra de narrativas que assola o planeta tem tornado ainda mais árdua a tarefa de narrar o mundo: o negacionismo climático e os movimentos que advogam o terraplanismo fazem terra arrasada de debates que pareciam superados, tornando mais uma perspectiva algo que é consensual no campo científico. Não obstante a gravidade desta situação quando o que está em jogo são temas complexos e de alta abstração, recentemente enfrentamos também a recusa do reconhecimento de questões absolutamente materiais, como quando, diante das queimadas que destroem o Pantanal e a Amazônia, deixando um rastro visível de mortes e destruição, há quem diga que não há fogo.
Transbordando as notas de rodapé: apresentação do dossiê
Fruto de um acordo entre Brasil, Japão e Moçambique, o Programa de Cooperação Triangular para o Desenvolvimento Agrícola da Savana Tropical em Moçambique (ProSAVANA) prevê ações “de desenvolvimento” em uma área com mais de 14 milhões de hectares, situada ao norte do país africano. Diante da escassez de informações e falta de transparência, o ProSAVANA tem sofrido severas críticas, envolvendo denúncias de usurpação de terras em prol do agronegócio internacional e a violação de direitos. Articuladas com associações brasileiras e japonesas, organizações moçambicanas têm se manifestado contra o programa e tornado público seu descontentamento com o modelo de desenvolvimento escolhido. Dentre as contrapropostas está a defesa da agroecologia, ideia e prática que estão longe do escopo do Programa. Assim, este texto tem como tema os atravessamentos entre o desenvolvimento e seus modelos produtivos em um contexto de conflito, assumindo como objeto as redes que produzem, sustentam e expressam o ProSAVANA em torno à questão da “transferência de técnicas/tecnologias”. O objetivo é discutir uma pressuposta posição ambígua do Brasil – e dos modelos técnicos por ele ofertados – diante deste programa de desenvolvimento que é apresentado no âmbito da “cooperação Sul-Sul”. A reflexão, que deriva de uma pesquisa em curso, é influenciada pelo referencial teórico da socioantropologia do desenvolvimento e dos Estudos Sociais de Ciência e Tecnologia (ESCT), enquanto o percurso metodológico é inspirado em etnografias de projetos de desenvolvimento. O trabalho de campo foi realizado em Moçambique de janeiro a abril de 2018 e de fevereiro a março de 2017. Considerações preliminares indicam que a ideia de “transferência de técnicas/tecnologias” no ProSAVANA – expressas no agronegócio e na agroecologia – se rearranja quando de sua “exportação”.
Resumo Nesta obra, Isabelle Stengers retoma mais uma vez as contribuições da filosofia processual de Alfred North Whitehead para discutir a produção de conhecimento na modernidade, tema proeminente da vasta e pouco traduzida ao português obra da filósofa belga. Em diálogo com pensadores contemporâneos, como Anna Tsing, Bruno Latour e Donna Haraway, Civiliser la modernité? nos convoca a ponderar o que podem as Humanidades conhecer frente às contingências e incertezas de nosso tempo. A resenha busca explorar sobretudo as potenciais contribuições da obra para as ciências sociais, articulando a discussão filosófica e desdobramentos metodológicos.
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