RESUMO:Este artigo utiliza um método pouco explorado nos estudos sobre hermenêutica no Brasil: o storytelling como meio de desvelamento do sentido das normas jurídicas. A experiência de um sujeito concreto, o autor deste texto, serve como ponto de partida para uma reflexão sobre a relevância da raça no processo interpretativo. Parte-se do pressuposto de que o lugar social do intérprete e as relações de poder que o definem determinam em grande parte a forma como ele compreende as funções do Direito. Isso significa que a análise da experiência de grupos minoritários pode ser uma referência importante para o debate sobre as possibilidades de promoção da emancipação social pelo sistema jurídico. Assim, no lugar das tradicionais reflexões teóricas sobre a igualdade, o artigo formula uma narrativa de caráter contra-hegemônico ao propor uma compreensão desse princípio a partir da voz de um sujeito subalterno. Palavras-chave: storytelling, igualdade, hermenêutica, justiça constitucional, identidade racial.ABSTRACT: This article applies a method rarely explored in the studies on hermeneutics in our country: storytelling as a means of unveiling the meaning of legal norms. The personal experience of a concrete subject, the author of this essay, operates as a reference for considerations about the relevance of race in the interpretive process. It claims that the social place of the interpreter and the relations of power that defines its position in various social hierarchies determine to a large extent the way in which he understands the role and purposes of law in a democratic society. This means that the experiences of minority groups can be an important reference for the debate about the possibilities of social emancipation through legal interpretation. Thus, instead of the traditional theoretical discussions about equality, the article formulates a counter-hegemonic narrative based on an understanding of law from the perspective of a subaltern subject.
ResumoEste artigo afirma que as teorias tradicionais sobre as funções dos direitos fundamentais não oferecem parâmetros suficientes para a promoção da emancipação de minorias dentro de minorias, como é o caso de pessoas que são negras e também homossexuais. Primeiro porque elas ignoram o impacto do pertencimento a grupos minoritários no exercício da cidadania; parte-se do pressuposto de que os cidadãos existem apenas como indivíduos. Segundo porque os que elaboram demandas de direitos em nome dessas pessoas desconsideram a diversidade interna da própria comunidade, consequência das hierarquias de poder nela existentes. Em função disso, a experiência de marginalização desses indivíduos permanece invisível aos olhos do direito porque não encontram expressão adequada nas articulações políticas por justiça racial e sexual. Com o intuito de apontar uma possível solução para o problema descrito, este trabalho utiliza teorias complexas de discriminação e de igualdade para demonstrar o potencial emancipatório de decisões judiciais recentes que afirmaram a constitucionalidade de cotas raciais e que reconheceram a identidade sexual como uma categoria merecedora de proteção jurídica. Esses acórdãos promoveram transformações sociais que podem modificar padrões sociais que impedem a igualdade de status entre grupos. Palavras-chave: direitos fundamentais, minorias, igualdade, multidimensionalidade INTRODUÇÃOA intensificação das lutas pela integração social de minorias raciais e sexuais nas últimas décadas evidencia a crescente relevância da política da identidade nas democracias liberais. Não restam dúvidas de que o pertencimento a esses grupos impede o pleno exercício da cidadania, motivo pelo qual as discussões sobre as relações entre igualdade e diversidade são agora referências centrais para a interpretação dos direitos fundamentais. Observamos o 1 Agradeço os comentários e sugestões de Alexandre Melo
RESUMOEste artigo defende a constitucionalidade de cotas raciais em concursos públicos a partir da reconstrução de um argumento comumente utilizado por uma parcela significativa de seus opositores. Muitos deles alegam que ações afirmativas são inerentemente problemáticas por causa da miscigenação do povo brasileiro, um claro empecilho à identificação de seus beneficiários. Segundo esses atores sociais, nosso amalgamento racial e cultural permitiu a construção de uma moralidade pública responsável pela formação de relações harmônicas entre negros e brancos. Embora este trabalho reconheça a relevância do pluralismo racial na formação da identidade nacional brasileira, ele afirma que cotas raciais em concursos públicos são cabíveis porque o grupo que controla quase todas as instituições públicas e privadas brasileiras é racialmente homogêneo. Tal fato é produto de processos sistemáticos de exclusão social que afetam negativamente brasileiros cujos fenótipos denotam origem africana ou ameríndia, a mesma razão pela qual oportunidades profissionais estão concentradas nas mãos dos membros do grupo racial dominante. Com o intuito de contribuir para a transformação dessa situação, este ensaio faz uso do conceito substantivo de diversidade e de certos princípios da Administração Pública para advogar a miscigenação dos círculos do poder por meio de ações afirmativas. Pensamos que isso deve ser visto como um requisito essencial para o avanço da democratização da sociedade brasileira. PALAVRAS-CHAVEAções afirmativas. Miscigenação. Diversidade. Igualdade. ABSTRACTThis article defends the constitutionality of racial quotas in selection processes for public employment by reverting the premises of an argument commonly deployed against this policy. Many of its opponents claim that affirmative action is an inherently problematic measure because of the difficulty in identifying its beneficiaries in a racially mixed society such as ours. They also argue that racial and cultural amalgamation allowed the construction of a public morality that favors harmonious race relations among blacks and whites. This paper recognizes the relevance of racial mixing in the formation of the Brazilian national identity, but it supports racially conscious initiatives because those who control the majority of private and public institutions belong to the same racial group. This racial stratification is the product of various processes of social exclusion that affect negatively those of African and Amerindian descent, the same mechanisms that
Adilso n José Moreira 2 ResumoEste artigo propõe uma formulação do conceito de cidadania racial, um parâmetro de controle de constitucionalidade utilizado por nossos tribunais em várias decisões sobre ações afirmativas. Apesar do seu uso frequente nesse contexto, nenhum desses acórdãos apresenta uma definição satisfatória desse princípio, o que justifica o presente esforço de sistematização. Sua aplicação como um postulado interpretativo da igualdade transcende a discussão sobre a constitucionalidade de políticas inclusivas para negros e indígenas. Primeiro porque ele também deve assegurar a igualdade de procedimento nas várias áreas do direito, outro requisito central para o alcance da justiça racial. Segundo porque expressa mudanças na compreensão do conceito de cidadania no mundo contemporâneo. Mais do que um mero status jurídico e político direcionado apenas à proteção de indivíduos, segmentos sociais que são vítimas de diversas práticas discriminatórias a caracterizam como um veículo privilegiado de demandas de direitos. Seus líderes afirmam que a cidadania pode ser um mecanismo privilegiado de inclusão se destinada a proteger grupos sociais vulneráveis. Este ensaio examina essas mudanças jurisprudenciais e políticas a partir de desenvolvimentos teóricos nos campos do direito constitucional, da ciência política, da sociologia jurídica, da filosofia política e da psicologia social para demonstrar a relevância da afirmação da cidadania racial na construção de uma sociedade genuinamente democrática no Brasil.Palavras chave: igualdade, racismo, cidadania, inclusão INTR ODUÇÃOA cidadania adquiriu importância renovada em debates políticos recentes, além de ocupar um lugar cada vez mais relevante no controle de constitucionalidade de atos governamentais. Trabalhos acadêmicos (MOUFFE, 1993; RICHARDSON, 1999) e decisões judiciais 3 apresentam hoje uma definição diferente de sua concepção tradicional como um status jurídico dentro de uma comunidade política. Muitos afirmam que a visão liberal da cidadania não abarca a totalidade da experiência humana porque ela pressupõe uma realidade social na
Resumo Este artigo aborda um aspecto importante do debate atual sobre ações afirmativas que permanece invisível aos olhos de muitos de seus participantes: embora o discurso jurídico seja representado como uma expressão da operação de parâmetros racionais e universais, ele pode ser usado para disseminar ideologias que pretendem legitimar projetos de dominação. Apesar de serem formuladas como manifestações do interesse comum, elas almejam promover o poder hegemônico de determinados grupos por meio da associação entre princípios jurídicos abstratos e narrativas culturais particulares.
Este artigo examina os motivos da violência dirigida a pessoas que pertencem simultaneamente a minorias raciais e sexuais e também as razões pelas quais ela pode levar esses indivíduos a praticar atos ilícitos. Com o intuito de compreender esse fenômeno complexo, desenvolvemos a noção de repertório identificatório, conceito que possui três significações: ele designa um conjunto de prescrições sociais que determinam as identidades que podem ser expressas no espaço público, um conjunto de representações positivas e negativas sobre grupos sociais conexos e também as condições institucionais necessárias para o alcance de objetivos pessoais. Ele será empregado para uma análise da trajetória do personagem principal do filme Moonlight, indivíduo que se torna um delinquente em função da significação social de diversas relações entre criminalidade e masculinidade em diferentes aspectos de sua vida. Essa história espelha a situação de centenas de milhares de pessoas cujo contexto de vida pode fazer com que elas recorram ao crime para que possam compensar o sentimento de frustração gerado pela violência baseada na identidade.
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