Os cenários acadêmico e editorial, nos últimos anos, têm se aberto não apenas à problematização e reflexão crítica de temas subalternizados, mas também à inclusão de vozes de grupos minorizados e dissidentes. Tal movimento, ainda que não tenha dirimido a secular opressão sofrida por pessoas negras, principalmente mulheres, e LGBTQIA+s, principalmente transexuais/travestis, revela-se não apenas necessário, mas benfazejo, uma vez que possibilita a ampliação do conhecimento e do campo de debate. Nesse âmbito, destacamos a obra Pedagogia da desobediência: travestilizando a educação, da pedagoga, ialorixá e ativista Thiffany Odara, publicado pela Editora Devires, na coleção "Saberes trans", em 2020 1 .Publicações como a obra de Odara, objeto desta resenha, constituem em si mesmas um acontecimento, uma vez que marcam uma ruptura quanto ao silenciamento imposto à população trans e sua compulsória exclusão histórica dos espaços de produção de saber como sujeitas 2 e sujeitos de suas pesquisas -e não apenas como objeto, muitas vezes desvalorizado 3 . Corroboraram (e ainda corroboram) para esse silenciamento alguns fatores. Um deles é a psiquiatrização sofrida por essas sujeitas e sujeitos, uma vez que, apenas em 2018, o Conselho Federal de Psicologia retirou a transexualidade do rol das "psicopatologias, transtornos mentais, desvios e/ou inadequações" (Conselho, 2018). Tal psiquiatrização, em uma sociedade que historicamente relega o outro (e a outra) da dita "racionalidade" para o silêncio, conferindo à sua fala a pecha de incoerente, sem sentido ou inválida no complexo jogo do regime de produção de verdade.Outro desses fatores diz respeito ao alto índice de evasão de sujeitas e sujeitos LGBTQIA+s das escolas; índice que aumenta ainda mais se considerarmos a interseccionalidade dos sistemas de