ROBERTA RAMOS MARQUES
PERFORMAR E PROFANAR OS PALCOS DA REPRESENTAÇÃO DEMOCRÁTICA EM TEMPOS DE GOLPE: REENACTMENT, HISTÓRIA, E MODOS DE AFETAR E SER AFETADO NA CRISEPerformar e profanar os palcos da representação democrática em tempos de golpe: Reenactment, história, e modos de afetar e ser afetado na crise
Roberta Ramos MarquesEm meio a um contexto histórico que, por um lado, relacionase com o passado brasileiro como reenactment (reencenação) -o que nos faz entender vários dos acontecimentos atrelados ao afastamento da Presidenta Dilma Rousseff e ao governo de Michel Temer como "retrocessos"-, por outro lado, as variadas formas de reenactment apresentam-se como modos potentes de construir contradiscursos históricos imediatos. Ainda afetados por fatos recentes, e desejantes de que leituras contra-hegemônicas desse momento atual afetem o público para impeli-lo a (re)agir, eu e estudantes da graduação em Dança (UFPE) e da Pós-graduação em Artes Visuais (UFPE/UFPB), realizamos duas intervenções performáticas, motivadas por uma reconstrução profanadora de fatos recentes, a saber: a votação da Câmara do Deputados, em 17 de abril de 2016, pela admissibilidade da abertura do processo de Impeachment da Presidenta Dilma Rousseff; e, dez dias depois, em 27 de abril, a iniciativa da Deputada Luiza Erundina, em ocupar a cadeira da presidência da Câmara dos Deputados, em protesto contra encaminhamentos do então presidente dessa instância parlamentar, Eduardo Cunha.O que as duas intervenções têm em comum e que desejo discutir aqui é que, para além de operarem como reenactments de acontecimentos recentes, a fim de ter deles novas e expandidas compreensões, ambas reconstroem e dotam de novos sentidos duas "cenas" sinalizadoras da crise do sistema representativo democrático, que parece atingir seu cume no Brasil com a ameaça à Democracia que está em curso.O cenário de instabilidade política pelo qual o Brasil passa, em 2016, consiste em um longo e tortuoso processo de tentativa, e efetivação, de um golpe de estado parlamentar, através da ferramenta de um impeachment contra o mandato da Presidenta Dilma Rousseff, eleita em 2014, com 54.501.118 votos. Segundo a análise de inúmeros juristas de diversos lugares do país e do mundo 1 , o processo de impeachment da presidenta eleita não apresenta consistência jurídica, uma vez que as práticas de que a dirigente é acusada não configuram crime de responsabilidade e, portanto, constituem-se como um golpe institucional, que se vale de nuances constitucionais para se autojustificar. Minha Vida, cotas sociais para inclusão na Educação, Bolsa-família, entre outras afrontas a avanços sociais já realizados. Além disso, a reestruturação radical e profunda, com legitimidade, questionada pelo Supremo Tribunal Federal, uma vez que se tratava de um governo interino e não permanente, incluindo a indicação de nomes inadequados, questionáveis e citados em casos de corrupção para a maioria das pastas restantes no Poder Executivo.Dez dias após a votação da Câmara dos Deputados, nessa mesma instância parl...