Os afetos não constituem um tema novo nas ciências sociais. Teorizado, entre outros, por Simmel (1998Simmel ( [1895) ou Goode (1959), o amor ganhou protagonismo crescente desde as primeiras décadas do século XX. Primeiro, tornou-se central na reconstituição histórica da vida privada, desde que Ariès (1973 [1960]) ou Shorter (1995Shorter ( [1975) elegeram a sentimentalização das relações familiares como uma das linhas de força da modernidade, frisando a importância do romantismo que, florescente no século XIX, concedeu destaque aos afetos -entre cônjuges, entre pais e filhos -, legitimando um ideal de família-refúgio, íntima e livremente escolhida (Costa, 2005). Do amor, princípio orientador das relações familiares, dependeriam a reciprocidade e a dádiva, organizadas contra a lógica de mercado imperante na esfera pública e contra os rígidos códigos de uma família, instituição voltada para a sobrevivência material do grupo, fortemente hierarquizada e subordinada ao poder inquestionável do patriarca. Mediante a força transformadora do amor, legitimaram-se novas conexões entre instituição e indivíduo, passando a predominar lógicas individualizadas que foram minando o holismo das sociedades tradicionais (Dumont, 1985). 1 Neste ponto, Bourdieu (1998) vai ainda mais longe chamando ao amor "ilha encantada", o único momento em que é possível suspender a dominação masculina. O único momento em que os indivíduos são únicos e iguais, rompendo com as forças poderosas do englobamento e da subordinação.O amor ganhou, portanto, enorme relevo na conceitualização da própria individualidade. Na