21Este artigo analisa possíveis articulações entre comportamentos desviantes no trabalho e a ocorrência de práticas de corrupção em organizações do setor público. A partir dos relatos de servidores públicos de um governo estadual, foram observadas as percepções e experiências desses servidores em relação a atos de corrupção. A literatura sobre comportamentos desviantes no trabalho sugere que as práticas de corrupção nas organizações variam de um grau de desvio de comportamento grave a aceitável. No caso analisado, as evidências indicam o uso de mecanismos de aceitação e perpetuação de práticas de corrupção, como um posicionamento oficial de negação de que tenha ocorrido corrupção e uso de processos informais para tratar denúncias, como investigação e atribuição de sanções a delatores e delatados.
INTRODUÇÃOSão muitas as abordagens para analisar o fenômeno 'corrupção', o que se reflete na ausência de um consenso sobre sua definição. Brei (1996), por exemplo, ressalta que o termo pode incluir uma grande variedade de atos, como falsificação, suborno, extorsão, dentre outros. Nesse sentido, as definições sobre corrupção variariam conforme as perspectivas teóricas que a embasam, tais como teorias jurídicas, econômicas e políticas.Há, no entanto, certa associação entre corrupção e o setor público: embora parta de posicionamentos diferentes, um traço comum às teorias sobre corrupção é considerá-la como a sobreposição dos interesses privados ao interesse público, visando a obtenção de vantagens (Filgueiras, 2004). Tais definições, porém, seriam limitadas em função de não levarem em consideração certos valores compartilhados na esfera pública. Em vista disso, Filgueiras (2009) propõe a análise da corrupção a partir da antinomia entre normas morais e prática social: a corrupção estaria relacionada à "constituição de normas informais que institucionalizam certas práticas tidas como moralmente degradantes, mas cotidianamente toleradas" (Filgueiras, 2009, p. 387 As práticas de corrupção em organizações ocorrem misturadas com outros desvios de comportamento. No caso analisado tais desvios permaneceram sem um tratamento sistemático e formal, comentados informalmente, que se mantém pelo silêncio da governança. Organizações do setor público podem criar mecanismos para reduzir estas condições que ajudam a proliferar tais comportamentos.