Enquanto narrativas podem ser pensadas como produtoras de "ordenamentos" e como manifestações simbólicas de formas ideológicas, por outro lado, podemos também enfatizar a dimensão poética da narrativa, apontando a produção de significados e a proliferação de signos mediados pelo ato de narrar o mundo. A partir desta perspectiva teórica, este ensaio busca explorar as muitas estórias sobre os chamados espíritos do "povo da rua", enfatizando a dimensão performativa da narrativa. Contadas por "clientes", "filhos-de-santo" e pelos próprios "espíritos", tais narrativas não são meramente simbólicas ou representativas, mas também constitutivas do próprio "poder sobrenatural" tido como inerente aos espíritos. Mais do que narrar uma "realidade" supostamente exterior a elas, as estórias tornam-se parte inextricável da "realidade" que narram. Ao deslocar o foco para além dos rituais demarcados espacial e temporalmente, a narrativa etnográfica busca aqui articular um espaço interpretativo onde se possa evocar a socialidade do narrar o mundo.
Although narratives can be conceived both as a mode of 'ordering' meaning and as symbolic manifestations of ideological forms, the poetic dimension of narrativity also involves the production of meanings and a proliferation of signs mediated by the act of 'narrating the world.' Adopting this theoretical premise, the essay seeks to explore the many stories of the so-called spirits of the 'povo da rua' ('street people'), emphasizing the performative dimension of narrative. Recounted by 'clients,' 'practitioners' and the spirits themselves, such narratives are not only symbolic or representative, but also constitutive of the 'supernatural power' attributed to the spirits. More than narrate a reality external to the stories, the narratives themselves become an inextricable part of the reality they narrate. By shifting the focus away from the framed space and time of ritual, the ethnographic narrative also seeks to evoke the very sociality of this narrating of the world
Resumo Neste ensaio, estamos interessados menos em “objetos” do que em certos tipos de coisas: coisas como fumaça, gestos, imagens, encruzilhadas, pessoas e entidades. Tomando um evento em particular – uma festa de exu –, buscamos explorar a circulação de tais coisas, que se configuram numa nebulosa encruzilhada entre coisa e signo, ação e significado. Longe de explorarmos a festa por seus conteúdos simbólicos, abordamos o próprio jogo tenso entre significação e materialidade que ali ganha vida. Tais matérias nebulosas envolvem não movimentos claramente identificáveis ou transições entre coisas pré-constituídas, ou mesmo os processos ordenados/ordenadores pelos quais essas coisas são constituídas, mas estados potenciais indeterminados e atos imprevistos, processos materiais e performativos de circulação em que as coisas ganham vida na festa.
Mediators between different realms, the spiritual entities known as the people of the streets can be taken as the very materialization of the principle of indeterminacy, being considered to be at once dangerous and powerful. Such indeterminacy acts upon processes of objectification and subjectification that unfold at the very heart of ritual. I turn my attention to the sessions of consultation, taking that encounter between clients and entities as a moment of instability, where the vulnerability of language -the danger of words -is at the center of ritual efficacy. If all human encounters involve a risk of un-understanding, such risk is certainly intensified in the session of consultations with the people of the streets, where instability is an implicit quality of the type of knowledge one seeks in such encounters, which are centered on issues of love, disaffections, betrayals and lived violences, all domains inherently unstable.Keywords: language; performance; ritual; Afro-Brazilian religions; povo da rua. Risco e (des)compreensão nas consultas com o povo da rua ResumoMediadores entre diferentes esferas, as entidades conhecidas como povo da rua podem ser tomadas como a própria materialização do princípio de indeterminação, sendo consideradas perigosas e poderosas. Tal indeterminação age sobre os processos de objetificação e subjetivação que acontecem no ritual. Me volto aqui para as sessões de consulta, tomando o encontro entre entidades e seus clientes como um momento de instabilidade, onde a vulnerabilidade da linguagem -o perigo das palavras -está no cerne da própria eficá-cia ritual. Se todo encontro envolve um risco de des-entendimento, tal risco é certamente intensificado nas sessões de consulta com o povo da rua, onde a instabilidade é uma qualidade implícita do tipo de conhecimento que ali se busca, o qual envolve questões de amores, desafetos, traições e da violência vivida, todos domínios inerentemente instáveis.Palavras chave: linguagem; performance; ritual; religiões de matriz africana; povo da rua.
Neste capítulo de livro, publicado originalmente em 2003, Susan Harding e Kathleen Stewart analisam a explosão de teorias da conspiração nos Estados Unidos do pós-Guerra. Elas evitam o apelo comum de isolar o pensamento conspiratório como mero padrão hermenêutico exótico ou tipo de ideologia específica ao tratá-lo como parte de uma “estrutura de sentimento”, “sistema nervoso” e “discurso metacultural” amplo, difuso e inclusivo, apesar de atualizado em diversas intensidades. A “ansiedade de influência”, o sentimento agudo de estarmos sendo manipulados pelos próprios sistemas de expertise que sustentam a ordem contemporânea, dá vazão a uma semiótica ansiosa, obcecada pela leitura de “sinais” que desvelam uma Verdade final intencionalmente obscurecida e gera práticas encarnadas que funcionam simultaneamente como cura e sintoma. Essa estrutura paranoica de sentimento é analisada por meio de uma cuidadosa reconstituição etnográfica de duas comunidades “remanescentes”: o apocalipticismo otimista da igreja pentecostal-carismática Calvary Church e o trágico, mas igualmente otimista, “plano de fuga” extraterreno do movimento de base ufológica Heaven’s Gate.
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