A tradição de pensamento conhecida como Teoria Crítica, que conta com os nomes de Horkheimer, Adorno, Marcuse e Habermas, entre muitos outros, é composta por diferentes modelos críticos. Encontramos, numa mesma geração ou ainda num mesmo autor, diferentes formulações da crítica social apoiadas em diagnósticos do tempo renovados. O presente artigo procura pensar as condições de renovação dos diagnósticos a partir da qual os obstáculos à emancipação ou potenciais emancipatórios, quando presentes numa dada sociedade, sejam considerados e analisados de modo crítico. Essa renovação implica desvincular a fundamentação normativa da crítica do "paradigma produtivista" e conceber as lutas emancipatórias na pluralidade de seus sentidos.
O artigo procura repensar o conceito de esfera pública em dois níveis de reconstrução. Em primeiro lugar, compreendemos a esfera pública não em termos puramente normativos, mas como ponto de partida socialmente constituído para a reconstrução de categorias críticas. Em segundo lugar, mantendo a preocupação metodológica com a gênese prática do conceito, mostramos de que maneira o conceito de esfera pública pode ser reconstruído como um processo de circulação do poder, que nos permite diagnosticar criticamente as relações atuais entre política e direito, mais especificamente a democratização do sistema político colocada em marcha pelos conflitos sociais.
e as lutas por reconhecimento na teoria política contemporânea ** From theory to praxis: Axel Honneth and the struggles for recognition in contemporary political theoryA entrada da categoria do "reconhecimento" no vocabulário da teoria política contemporânea pode ser compreendida segundo duas razões principais. A primeira, de ordem "negativa", remete ao enfraquecimento das grandes narrativas (teoria da luta de classes, contradição entre capital e trabalho, relação entre base econômica material e superestrutura política, utopia da sociedade do trabalho) para produzir um diagnóstico adequado sobre a dinâmica dos conflitos sociais em condições de capitalismo tardio (com intervenção do Estado, democracia de massas e bem-estar social). A segunda, de ordem mais propositiva, remete ao engajamento da sociedade civil e à ampliação da agenda política que acompanhou as reivindicações plurais dos novos movimentos sociais 1 .Assim, no lugar dos conflitos tradicionalmente concentrados em torno da propriedade, da redistribuição, do salário ou do emprego, os novos conflitos * É professor do Departamento de Ciência Política da Universidade de São Paulo (São Paulo, SP) e pesquisador do CEBRAP. E-mail: rurion@usp.br. ** Uma versão reduzida deste texto foi apresentada na 37ª ANPOCS, em outubro de 2013. Agradeço aos participantes do Seminário Temático de Teoria Política, coordenado pelos professores Cícero Araújo e Christian E. C. Lynch, especialmente aos professores Luiz Carlos Bresser Pereira e Sérgio Costa pelas críticas e sugestões. 1 Praticamente todos os principais autores que se apropriam do conceito de "reconhecimento" remetem a essa configuração comum, ou seja, são conscientes de que as lutas por reconhecimento se referem tanto à pluralidade cultural quanto ao fim das "grandes narrativas". Cf. principalmente Young, 1990;Taylor, 2000; Habermas, 2002; Honneth, 2003; Fraser, 2001; Benhabib, 2002. Para uma recente exposição de conjunto em relação à atualidade e transformações do conceito, ver Honneth, 2013a; e Honneth e Stahl, 2013.Revista Brasileira de Ciência Política, nº15. Brasília, setembro -dezembro de 2014, pp. 17-36.
O presente artigo busca analisar a ideia da democracia como forma de vida com base nos trabalhos mais recentes de Axel Honneth. Na primeira seção, eu diferencio a concepção normativa de democracia social desenvolvida por Honneth, comparando-a às versões republicana e procedimental. Em seguida, analiso de que maneira a eticidade democrática poderia ser apresentada em um maior grau de complexidade, dando atenção à efetividade da liberdade em três esferas sociais centrais: relações pessoais, interações econômicas e formação política da vontade. Trata-se aqui de atentar, sobretudo, para o modo como a cultura política democrática condensa a correlação entre as diferentes esferas sociais. Eu encerro o artigo ressaltando alguns limites da reflexão proporcionada pelo autor. De um lado, fenômenos sistemáticos de violência e dominação, que colocam de fato em risco uma democracia socialmente efetiva, estão ausentes de sua formulação; de outro, não fica claro o papel das lutas sociais para a realização diferenciada da liberdade em nossa cultura política.
Resumo: Com a conhecida crítica do "déficit sociológico", Honneth apontou a incapacidade de Horkheimer de realizar o programa principal da teoria crítica, a saber, vincular filosofia social com uma análise da sociedade que também se baseasse em pesquisas sociais empíricas. Contudo, por ter se distanciado do paradigma da "luta" e desenvolvido uma teoria preocupada mais com a "reconstrução normativa" das instituições de nossa vida democrática, Honneth acabaria dando menos atenção à relação com a pesquisa social. Defendemos que os trabalhos de Horkheimer da década de 1930 poderiam indiretamente nos ajudar a resolver algumas dificuldades metodológicas concernentes a uma espécie de "novo déficit sociológico" que a teoria crítica estaria enfrentando hoje.Palavras-chave: teoria crítica; pesquisa social; Horkheimer; Honneth; teoria do reconhecimento. Abstract:With the well-known critique of "sociological deficit", Honneth pointed out Horkheimer's inability to carry out the main program of critical theory, namely, to link social philosophy with an analysis of society that was also based on empirical social research. However, because he distanced himself from the paradigm of "struggle" and developed a theory more concerned with the "normative reconstruction" of the institutions of our democratic life, Honneth would end up paying less attention to the relation with social research. We argue that Horkheimer's works of the decade of 1930 could indirectly help us to solve some methodological difficulties concerning a kind of "new sociological deficit" that critical theory would be facing today. Desde muito cedo, Axel Honneth se defrontou com a história da primeira geração da teoria crítica, em especial com a figura de Max Horkheimer. As dificuldades apontadas por Honneth em confronto com os trabalhos de Horkheimer tanto reforçaram uma determinada maneira de recepcionar a história da primeira geração da teoria crítica quanto, principalmente, marcaram decisivamente os obstáculos e desafios da renovação desta tradição de pensamento. Na esteira de Jürgen Habermas, Honneth adotou uma perspectiva crítica diante da obra deixada por Horkheimer. KeywordsPorém, é preciso sublinhar, ele identificou também de que maneira poderíamos dar continuidade às contribuições originais de Horkheimer consideradas frutíferas para o * Uma versão levemente modificada do presente texto foi apresentada no Colóquio Internacional Max Horkheimer e a Teoria Crítica, ocorrido em setembro de 2016, na USP.
Quando Celso Furtado dedicou-se a escrever seu testemunho sobre as disputas políticas e econômicas das décadas de 1950 e 1960, caracterizou o período como uma fantasia que acabou sendo desfeita. Ele sugere, assim, que o otimismo e a esperança da época, em que a superação do subdesenvolvimento da economia brasileira parecia estar ao alcance da mão, tinham algo de ilusório, fantasioso. A ruptura brusca e violenta ocorrida em 1964, com o golpe civil-militar, desfez a fantasia, jogando luz sobre as tensões que vinham se acumulando até ali. Narrando sua partida para o exílio, Furtado (2014, p. 496) ressalta a força da desilusão: "Agora, essa fantasia estava desfeita, desmoronara como uma estrela que se estilhaça. Era como se uma enxurrada tudo houvesse arrastado".Ressalvadas as diferenças entre o período que o autor examina e o momento atual, a ideia de uma fantasia que se desfaz cai também como uma luva para descrever a brusca reversão de expectativas que se observou no Brasil sobretudo a partir de 2013 ou 2015, conforme o observador. Passou-se, em um intervalo curto de tempo, do otimismo para o desalento, do crescimento para o colapso econômico, da sensação de que os problemas estavam sendo superados para o sentimento de que não há saídas para a crise.Embora socialmente dramáticos, tais períodos de crise servem de estímulo à reflexão. Foi assim no final dos anos 1960, quando se elaborou uma série de revisões críticas das interpretações anteriores sobre a economia, a sociedade e a política brasileiras. Várias dessas revisões foram formuladas, aliás, no próprio Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap) e publicadas como Estudos Cebrap.Esse tipo de balanço crítico voltou a ser fundamental. A experiência dos últimos quinze anos, desde a chegada do Partido dos Trabalhadores (pt) à presidência até os colapsos tanto econômico quanto político atuais, precisa ser analisada em detalhe e sob diversos pontos de vista, para que suas lições sejam aprendidas. No calor do momento,
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