O modelo de atenção à saúde indígena no Brasil tem como fundamentos a atenção integral à saúde, associada à noção de atenção diferenciada, e prevê o respeito à diversidade cultural, buscando a incorporação de práticas terapêuticas tradicionais nos serviços de saúde destinados a atender estas populações. A questão que se coloca é entender de que forma é possível conciliar o acesso universal aos bens e serviços de saúde a uma atenção que garanta a diferenciação, sem interferir, no entanto, na qualidade dos serviços ofertados. Para além disso, é preciso definir quais parâmetros utilizar para avaliar a qualidade e a eficácia desses serviços oferecidos em um contexto intercultural. Com base em um estudo de caso - a implementação dos serviços de saúde no Alto Xingu - apresento questões relacionadas aos usos políticos e os "perigos" associados aos "espaços da saúde" e as distintas concepções (de índios e não índios) do que seja saúde e qualidade dos serviços de saúde. Essas questões se interpõem e afetam não apenas as ações de saúde, mas também a situação política local.
The aim of this work is to describe and analyze the different types of relationships established between the peoples of the Upper Xingu through their regional rituals. Starting from a description of the uluki exchange ceremony, we will discuss how this ritual, by mobilizing Xinguano ideas about friendship, produces contexts of interaction in which characteristics of intra-village sociality are extended to regional sociality. At the same time that the uluki defines, together with other regional rituals, a certain “Xinguano interiority” (the world of multi-community rituals), it is also one of its main forms of opening, having the potential to attract to the Xinguano world not only singular persons, but entire groups.
Este artigo investiga algumas relações entre xamanismo, poder político e feitiçaria no Alto Xingu, a partir da descrição da trajetória de um xamã daquela região. Trata-se de um homem que passou por uma experiência atípica de transformação em xamã, marcada por uma aliança com “espíritos” muito poderosos e pela incorporação de elementos do cristianismo. Em seu período de ascensão, ele foi considerado “mestre” dos xamãs em muitas aldeias da região, introduziu novas práticas de cura e ensaiou, em sua aldeia de origem, o exercício de um tipo ambíguo de influência marcada ao mesmo tempo pelo respeito e pela coerção. O objetivo deste trabalho é reunir elementos que permitam compreender esta trajetória que, apesar de peculiar, reúne e esclarece aspectos importantes das dinâmicas políticas alto-xinguanas.
Resumo Neste texto, serão apresentadas algumas reflexões acerca das implicações de um processo de aproximação dos Kalapalo em relação ao ‘mundo dos brancos’. O foco está principalmente na abertura de uma estrada ligando a aldeia Aiha (localizada na margem direita do rio Culuene) ao município de Querência, Mato Grosso, e na criação de um ponto de conexão com a internet, na mesma aldeia. Ambos os processos estão diretamente relacionados à ampliação do fluxo de dinheiro na aldeia, principalmente por meio das políticas previdenciárias e de transferência de renda, e vêm produzindo significativas transformações no cotidiano do local desde meados de 2018. O argumento central do texto é de que esses elementos – o dinheiro, a estrada e a internet – possibilitam aos Kalapalo a criação de conexões espaço-temporais, aproximando territórios e pessoas antes desconectados. Esse movimento, ao mesmo tempo que amplia as possibilidades de experimentação de outros modos de vida, garante, em alguma medida, a configuração de uma noção de ‘boa distância’ em relação ao mundo não indígena.
O objetivo deste artigo é discutir algumas relações entre poética e política no Alto Xingu, a partir da análise de canções do ritual kuambüentre os Kalapalo (falantes de língua karib daquela região). Por meio da repetição de canções compostas por outros ou de improvisos, o kuambüé um contexto marcado pela expressão musical pública de conflitos, medos, acusações, demandas ou reflexões sobre problemas cotidianos. Este trabalho analisa um fragmento deste repertório, buscando evidenciar algumas das características dos cantos, e compreender as relações entre as composições e as situações que lhes deram origem. Pretende-se demonstrar como este ritual, com seu tom ao mesmo tempo grave e jocoso, constitui um momento em que fraturas micropolíticas do cotidiano podem ser expostas e negociadas por meio de uma linguagem poética, revelando uma face geralmente oculta da socialidade do grupo local e criando condições para sua reinvenção.
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