Mulheres curdas, corpos-territórios em lutaKurdish Women, struggling cuerpos-territorios Mujeres Kurdas, cuerpos-territorios en lucha Embora pouco conhecido no Brasil, o povo curdo é um dos maiores povos sem Estado do mundo. Formado por aproximadamente 40 milhões de indivíduos, essa comunidade étnica encontra-se dividida entre os Estados da Síria, da Turquia, do Irã e do Iraque; além das mais de cinco milhões de pessoas dispersas na diáspora -sobretudo nos Estados Unidos e em países da Europa central, como a França, Alemanha, Bélgica e Holanda.Apesar dos diversos levantes nacionalistas e da autonomia relativa conquistada nos territórios no Iraque, o Curdistão jamais conseguiu se unificar e se tornar independente. Diante disso, as populações curdas, autóctones dessa região, foram sendo violentamente assimiladas e sistematicamente negadas pelos processos de formação dos Estados-nação que ocupam o seu território.Recentemente, os curdos -e sobretudo as mulheres curdas -tornaram-se conhecidas pela sua heroica atuação no combate a grupos extremistas islâmicos tais como o ISIS 1 no Iraque e na Síria. As unidades de proteção femininas e seu protagonismo no enfrentamento aos terroristas islâmicos em meio à guerra civil síria chamou a atenção do mundo ocidental que, rapidamente, estampou em diversas capas de jornais a beleza e a bravura dessas mulheres com retratos de lindas jovens portando suas Kalachnikovs e usando lenços floridos típicos.Contudo, para além dos estereótipos homogeneizantes e por vezes fetichistas de mulheres duronas 2 (Dilar DIRIK, 2014) e destemidas, as mulheres curdas desenvolvem uma potente resistência que avança em direção a um projeto revolucionário de autodefesa e de libertação.É no contexto dessas resistências cotidianas, nem sempre armadas ou publicizadas, que o livro Kurdish Women's Stories (Houzan MAHMOUD, 2021) reúne histórias de um povo em luta. Histórias de Mulheres Curdas, em tradução livre, propõe uma jornada através das múltiplas e diversas experiências de resistência protagonizadas por mulheres comuns.Além dos estereótipos que são impostos sobre suas identidades e resistências, Houzan Mahmoud nos convida a fazer contato com mulheres de cinco gerações, nascidas em diferentes