ResumoO objetivo deste artigo é discutir o papel da mulher no desenvolvimento do pensamento agroecológi-co no Brasil, o qual se apresenta como uma proposta que alia ciência, tecnologia e movimento social, orientada por premissas éticas e epistemológicas, nas quais são centrais as características ambientais, a pluralidade cultural, o respeito aos diferentes povos, assim como a não exploração nas relações de trabalho e comercialização. Embora ele seja um pensamento progressista, ainda comporta reprodução da desigualdade de gênero, o que tem aparecido em diversos debates dentro do próprio campesinato, nos ambientes de militância e acadêmicos brasileiros. A agroecologia e, de forma mais ampla, a agricultura familiar sempre tiveram a participação signifi cativa das mulheres. Porém, apenas há pouco mais de duas décadas o trabalho feminino na agricultura familiar e também na agroecologia tem sido desconsiderado proporcionalmente a sua real contribuição. Nesse sentido, discutiremos que não existe agroecologia sem feminismo, pois são mulheres que ocupam posições centrais e sustentam vários tipos de resistência ao modelo convencional de produção agrícola, com a organização de movimentos sociais agroecológicos e práticas associativas de produção. A relação aparentemente paradoxal entre as relevantes contribuições das mulheres e a negação das questões de gênero na agroecologia será discutida buscando estabelecer diálogos entre o pensamento agroecológico das mulheres e a perspectiva feminista.Palavras-Chave • Tecnologia. Agroecologia. Gênero. Resistência.
IntroduçãoEm 2010, a Organização das Nações Unidas, por meio de seu Conselho de Direitos Humanos, publica o relatório elaborado por Olivier De Shutter sobre direito à alimentação, no qual afi rma a agroecologia como modelo de desenvolvimento agrícola capaz não apenas de viabilizar o acesso ao alimento saudável, mas também de garantir a sustentabilidade econômica de pequenos agricultores ao redor do mundo.Nesse documento, a agroecologia é apresentada tanto como uma ciência quanto como um conjunto de práticas agrícolas: enquanto ciência "é a aplicação da ciência ecológica ao estudo, desenho e manejo de agrossistemas sustentáveis" e, enquanto , São Paulo, v. 15, n. 1, p. 73-96, 2017 http://dx