O artigo analisa, por meio de uma novela de G. Grass, uma tendência atual da literatura alemã sobre a II Guerra. Nesta nova literatura já não é mais a culpa, mas o sofrimento da população que se focaliza. O texto de Grass apresenta um cuidado particular nos fatos históricos, facilitando aos leitores distinguir entre elementos factuais e ficcionais. No âmbito da ação ficcional, o autor imita o gênero do testemunho, fato que contribui para qualificar sua novela como meio da memória colectiva. A ação ficcional desenvolve, além disso, uma argumentação política que explica a necessidade de comemorar também as vítimas alemães: para fazer jus à verdade, ao equilíbrio emocional e para encontrar uma saída do circuito da violência, perpetuada através das gerações. A novela de Grass encontra-se, por conseguinte, na tradição da representação de eventos históricos, a serviço de uma memória colectiva humanista e iluminada que, na Alemanha, remete à obra dramática de Schiller.
O artigo analisa textos autobiográficos que Josef Mengele escreveu durante os anos em que passou escondido em vários lugares no Estado de São Paulo. O material de cerca de 500 páginas datilografadas é inédito e trata dos primeiros anos da infância, o estudo de medicina nos anos 1930, a fase em que trabalhou sob nome falso como camponês na Bavária durante os primeiros anos do pós-guerra, assim como o início da fuga da Alemanha, mas não há referências aos anos nos quais Mengele realizou seus experimentos brutais com seres humanos no campo de concentração Auschwitz. Contudo, os textos, ligeiramente ficcionalizados, transmitem uma impressão dessa pessoa vaidosa que manteve suas posições políticas sem remorsos e que, ao que parece, até quis convencer seu filho - para o qual provavelmente os textos foram escritos -, por meio de sua narrativa impregnada de ideologia. Em certos trechos, porém, surge, de forma velada e perversa, a consciência dos seus atos desumanos, apresentando o próprio perpetrador no papel da vítima.
This article analizes autobiographical texts written by Josef Mengele during the years which he spent hidden in different places in the state of São Paulo. The material of about 500 pages in typoscript remains unpublished and deals with the first childhood years, the study of medicine in the Thirties, the imediate post-war period, when he worked under false name as a peasant in Bavaria and the beginning of his escape from Germany, but there is no reference to his brutal experiments with human beings in Auschwitz. Nevertheless, the slightly fictionalized texts provide some insight to this self-opionated person who kept the political positions without any sense of guilt and apparently even tried to convince his son - for whom the texts probably were written - by his ideologically saturated narrative. In certain passages, however, appears a kind of conscience of his inhuman acts, in disguised and perverse form, representing the very perpetrator in the roll of the victim
O artigo analisa a tradução do Fausto de Goethe, realizada por Jenny Klabin Segall em relação aos versos usados no texto de partida e no texto de chegada. Considerando a estrutura plurimétrica do Fausto e as diferenças entre as prosódias alemã e portuguesa, analisa-se a estrutura métrica em exemplos de vários trechos do drama, comparando cada vez as decisões de Goethe e as opções da tradutora. Nota-se que os versos portugueses se orientam rigorosamente na extensão dos versos alemães, buscando ‘equivalentes’ métricos onde isso era possível (no caso da estância / terça rima e do alexandrino). O trabalho chega à conclusão de, embora que não haja metros portugueses que ‘imitam’ iambos e troqueus, a escolha sistemática de versos com número par de sílabas para iambos alemães e ímpar para troqueus alemães produz um efeito rítmico diferenciado. Para os metros mais alheios da versificação brasileira (Knittelvers, Freie Rhythmen) a tradutora encontrou soluções originais que se aproximam ao efeito estético do original sem ultrapassar os limites da prosódia do português do Brasil.
No contexto dos Estados-nação europeus modernos, o Império Habsburgo era um anacronismo. Entretanto, sua constituição multiétnica e multicultural garantiu uma coexistência pacífica e igualitária que foi apreciada por várias minorias, em particular os judeus. Após o fim da Primeira Guerra Mundial, estes permaneceram no novo Estado-nação da Áustria alemã ou na República da Áustria como uma espécie de minoria sem status de minoria. Na idéia da „Europa Central“ sobreviveu uma parte substancial da ideologia que tinha mantido o império unido no final do século XIX. Ela se encontrou seu caminho para os elementos nostálgicos de uma nova identidade dos austríacos resistentes às tendências pan-germânicas, mas também foi defendida por intelectuais católicos conservadores de ascendência judaica que buscavam um bastião contra as tendências anti-semitas e ultra-nacionalistas. Entre as guerras, Hugo von Hofmannsthal, Leopold von Andrian e Otto Maria Karpfen (Carpeaux) desenvolveram idéias políticas que, da perspectiva atual, parecem extremamente conservadoras e até anacrônicas. Se olharmos mais de perto para eles, no entanto, torna-se claro que a idéia Mitteleuropa forma um núcleo humanista dentro do gesto antimoderno, uma específica forma de resistência à onda totalitária dos anos 1930. O presente artigo tenta delinear as diferenças das três concepções e também seus traços unificadores.
Durante seus quatro anos na Primeira Guerra Mundial, Ernst Jünger anotou, quase diariamente, suas observações em pequenos cadernos, que depois serviram como base para seu livro Tempestade de aço (In Stahlgewittern), de 1920, e suas seis revisões, realizadas até 1978. Esse livro sempre foi visto como manifestação ideológica no contexto do entreguerras, mas também atraiu o interesse por suas descrições sóbrias da violência e sua linguagem imagética. Em 2010, a transcrição comentada dos cadernos – incluindo os registros coleopterológicos do pesquisador amador – foi editada por Helmuth Kiesel, dando acesso público às anotações originais do autor. Uma vez que a crítica geralmente considerou o livro uma espécie de diário redigido ou “ficcionalizado”, o presente artigo tem por objetivo comparar essas anotações com a primeira versão de Tempestades de aço. Aqui, será analisado, além da questão da ficcionalidade, em que medida os textos divergem em extensão, assuntos, estilo, voz narrativa e cor ideológica.
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