IntroduçãoNas últimas décadas, o interesse em relação aos textos escritos pelos ameríndios levou uma geração de historiadores a repensar a experiência do contato cultural e evidenciar o protagonismo indígena na organização das sociedades hispano-americanas.1 Apesar dessa tendência, e da relevância apresentada pela escrita como parte das estratégias de catequese, não há estudos que analisem as apropriações efetuadas por parte dos indígenas da instrução alfabética promovida no Paraguai colonial. No caso das reduções controladas pelos missionários jesuítas, somente os lingüis-tas haviam sinalizado, pioneiramente, a existência de documentos escritos pelos guaranis.
2Ausência que se faz notar, principalmente, diante do fato de que as reduções jesuítico-guaranis configuravam-se, entre os séculos XVII e XVIII, como um espaço social de difusão da cultura escrita. O investimento na alfabetização indígena foi uma decorrência da evangelização pretendida, e cujo aprendizado permitiu aos guaranis atingir uma notável destreza na prática da escrita. Em algumas oportunidades, inclusive, elaboraram obras de caráter devocional -livros, na sua maioria com finalidade litúr-gica ou catequética -, participando diretamente na elaboração de vocabulários, catecismos e gramáticas. Com efeito, as modalidades de evangelização praticadas pelos jesuí-tas têm permitido compreender a rápida difusão e aceitação do escrito, frente à situação de oralidade primária da sociedade guarani. A partir do impacto da alfabetização na organização social das reduções, nem mais a oralidade, tampouco a "razão gráfica" -a expressão da domesticação do
Em meados do século XVIII foi firmado o Tratado de Madri (1750) entre as duas monarquias ibéricas, procurando definir uma nova fronteira na América meridional. Esse tratado refletiu-se de maneira acentuada entre os índios Guarani aldeados sob a tutela da Companhia de Jesus, deflagrando uma rebelião colonial conhecida na historiografia como Guerra Guaranítica (1754-1756). Esse período foi marcado por uma intensa troca de correspondência entre jesuítas, autoridades peninsulares e os Guarani. A elite letrada das missões, através dos índios principais, externaram seu ponto de vista por escrito, procurando anular ou impedir a execução desse tratado. Os documentos produzidos pelos Guarani sublevados diante da presença das comissões demarcadoras na América meridional, seja na forma de bilhetes, cartas ou avisos, permitem repensar as relações estabelecidas entre esses índios e a escrita, e sinalizam uma discussão pouco referida pela historiografia, ou seja, a existência da defesa por escrito do ponto de vista nativo. In the middle XVIIIth century, the "Tratado de Madrid" (1750) took place between Portugal and Spain. Both countries were looking forward to define the new southern Latin America frontier. The Tratado de Madrid had a strongly impact over the indians communities under Jesuits influence, starting colonial rebellion named Guaranitc War (1754-1756). During this period an intense communication by mail between the Spanish authorities, priests and the Guarani was noticed. The "indios principais" - the Missions writing elite - expressed their opinion writing letters in the way to cancel the Tratado de Madrid. The different kinds of documents produced by the insurgent Guaranis letters, notes and messages- let us to rethink the relation between the indians and the writing culture. It also indicates the lack of attention in the historical debate to the native point of view expressed by writing
ResumoEm meados do século XVIII os Guarani das reduções escreveram com frequên-cia, documentos em que expressam um pensamento político próprio. Nesses textos é possível observar sua capacidade de agir, mas também sua percepção dos acontecimentos em curso por meio de um pensamento em guarani. Essa autonomia indígena, em um momento de contestação política, estava embasada nas teorias que pautaram a sua instrução e que paradoxalmente serviram para justificar ações em defesa dos seus interesses, devidamente amparados nos valores da monarquia católica. Palavras-chave: escrita indígena; Reduções Guaranis; pensamento político.
AbstractBy the middle of eighteen century, the Guarani from the reductions frequently wrote their own documents in which were expressed their very political thoughts. Through these texts it is possible to observe not only their action capacity but also their perception of the events in progress by a Guarani way of thinking. This indigenous autonomy, in a moment of political contestation, was based upon the theories which they were taught and which paradoxically served to justify their actions on defending their interests, properly supported on the catholic monarchy values.
ResumoEste artigo tem como objetivo repensar a história da Guerra dos Farrapos contemplando a presença e a participação indígena nessa rebelião. As populações ameríndias, ao contrário do que se pensava, participaram dos conflitos imperiais, mas seguem como os esquecidos dessa guerra deflagrada em plena fronteira do Império do Brasil.
Palavras-chavePopulações indígenas -Guerra dos Farrapos -Império do Brasil.
[pt] A Colônia do Sacramento, fundada em 1680 pelos portugueses, desde os seus primórdios atuou como um fator de alteração nas relações étnicas e sociais no Rio da Prata. Esta cidadela se apresenta como um cenário promissor e privilegiado para observar tanto as ações como as denominações atribuídas as sociedades indígenas na América meridional. Na correspondência dos jesuítas e na documentação dos governadores coloniais há informações a respeito das categorias de classificação atribuídas à essas populações. Estes dados, apesar dos seus limites, nos permitem interrogar a respeito das condições de produção da diferença, das maneiras pelas quais certas comunidades passam a ser percebidas como uma coletividade.
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