A partir de uma oficina de teatro desenvolvida no Presídio Feminino de Florianópolis, com mulheres em situação de privação de liberdade, nasceu a peça Estendemos nossas memórias ao sol. Num dia de chuva, uma criança se depara com o desaparecimento dos avós. Somos convidadas a traçar junto a ela um caminho de busca de (re)encontros. A fábula é entremeada com memórias das atrizes. Uma memória feita de água pode ser transformada numa carta, em um convite para lançar ao sol, para estender no pátio, no solo público que é (ou deveria ser) mundo.
No presente artigo analisa-se um processo artístico-pedagógico com mulheres em situação de cárcere em 2019 no Presídio Feminino de Florianópolis, em Santa Catarina. Compreende-se que uma das estratégias da prisão é a invisibilização das pessoas a ela submetidas, sendo que suas histórias são construídas por outros e, mesmo alicerçadas em estigmas, procurou-se ir na contramão desses processos. Assim, as proposições da oficina tiveram como foco o desenvolvimento de práticas que convocassem uma reapropriação e ressignificação das histórias de vida, a partir do terreno do teatro. Buscou-se, a partir da escuta dos materiais gerados e do próprio processo, a construção de uma escrita que não omitisse as vozes das mulheres que fizeram a oficina, mas que, pelo contrário, colocasse-as em foco.
Nas últimas décadas, o teatro contemporâneo tem trazido para o foco da construção dramatúrgica o tensionamento entre o campo da ficção e do real. Muitos espetáculos buscam trabalhar com procedimentos criativos que façam emergir o real em cena, gerando uma potente desestabilização na recepção de tais obras. Com base na noção de real traumático em Lacan (1988, 2005), este artigo aborda a irrupção do real na malha simbólica da escritura dramatúrgica, a partir da análise das obras autobiográficas Conversas com meu pai (2014) e Stabat Mater (2019) de Janaina Leite.
No presente artigo, compartilha-se o trabalho desenvolvido com jovens em situação de cárcere, que cumpriam medida socioeducativa no Centro de Atendimento Socioeducativo Feminino (CASEF), da Fundação de Atendimento Socioeducativo do Rio Grande do Sul. Ao buscar trabalhar com o passado das jovens, através da prática, compreendeu-se a potência do trabalho com as noções de presente e futuro, somando-se à de passado, na construção de espaços necessários de escuta.
Neste ensaio irei me debruçar na interlocução da proposta de um caderno de exercícios de escrita criativa, intitulado Das saídas que moram nas palavras, destinado às mulheres que cumprem pena no Presídio Feminino de Florianópolis, com escritos que tratam da literatura (ANDRUETTO, 2012; CANDIDO, 2011) e da escrita como ato de “tornar-se” (KILOMBA, 2020). A proposição objetiva o diálogo artístico e poético com as mulheres que estão privadas de liberdade, tendo como hipótese principal a geração de procedimentos de escuta, nos quais as suas vozes possam ecoar. Ainda, ansiamos que as palavras gerem encontros (delas consigo mesmas, com suas companheiras, com o mundo). No momento como ainda não temos acesso as produções instigadas a partir do caderno, julgo pertinente a análise da proposta, seus atravessamentos teóricos, visando o compartilhamento de seu processo de feitura que pode, inclusive, inspirar outras proposições e projetos, ainda como metodologia Muitas são as perguntas, as dúvidas e iniciar com uma, como convoca justamente a força das palavras na abertura de mundos – questão que está no horizonte deste ensaio.
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