Uma das formulações mais atacadas, e mal compreendidas, da crítica da cultura brasileira é a das "idéias fora do lugar". Sucintamente, Roberto Schwarz, ao discutir o liberalismo no Brasil do século XIX, nota que o que era originalmente ideologia na Europa, converte-se, nos trópicos, quando muito, em ideologia de "segundo grau".À primeira vista, a observação do crítico sobre o liberalismo no Brasil oitocentista não é muito diferente da avaliação realizada pelos conservadores da época e autores posteriores, como Oliveira Vianna e Wanderley Guilherme dos Santos. Schwarz admite inclusive que sua interpretação parte de um "sentimento de despropósito" (Schwarz, 1999, p. 82) mais generalizado quanto à relação entre referên-cias intelectuais estrangeiras e o ambiente social brasileiro. Mas enquanto os conservadores Oliveira Vianna e Wanderley Guilherme dos Santos vêem o problema no liberalismo -pretensamente utópico ou até vítima de uma espécie de "fetichismo institucional" -ele identifi ca o nó da questão na sociedade escravista brasileira do século XIX.Ou melhor, o liberalismo na Europa corresponderia às aparências, num contexto onde prevalecia o trabalho Lua Nova, São Paulo, 73: 59-69, 2008
Como o Brasil se sul-americanizoudepressa, e com que fúria. (Joaquim Nabuco, 1893) J osé Veríssimo resenha Ariel já em 1900, ano da publicação do opús-culo 1 . Destaca como "é mais um sintoma do despertar do sentimento latino, ou antes do sentimento espanhol na porção ibérica da Améri-ca" (Veríssimo, 1902:395), o que teria sido estimulado principalmente pela guerra entre a Espanha e os EUA dois anos antes. Faz a ressalva, porém, que não existiria propriamente nesses países "opinião públi-ca", já que a maior parte das suas populações seria muito pobre e ignorante. Mesmo assim, defende que a mensagem de José Enrique Rodó seria democrática, resguardando, entretanto, assim como o escritor uruguaio, a necessidade de a multidão, identificada com Caliban, ser dirigida por aqueles da estirpe de Próspero. No que se refere ao Brasil, apesar de proclamar acreditar na fraternidade latino-americana, sugere que o livro não teria maior apelo no país. Indica que o motivo de tal acolhida se daria em razão do "que um vigoroso publicista nosso" (ibidem:397) chamou de "ilusão americana" ser especialmente forte no http://dx
Resumo O artigo avalia até que ponto a Antropofagia inova ao lidar com a importação de ideias no Brasil. Analisa, para tanto, como o projeto ideológico de Oswald de Andrade é elaborado entre 1924 e 1928 no Manifesto da Poesia Pau-Brasil e no Manifesto Antropófago. Confronta as formulações do escritor, a partir daí, com a crítica da época, que enfatizava a pretensa inspiração europeia de seu programa. Em termos mais específicos, busca, por meio da Revista de Antropofagia, entender os rumos e significados que o movimento assume até 1929. Em cada um desses momentos presta atenção especialmente na interlocução dos antropófagos com outros intelectuais da época. Ou seja, procura basicamente entender a Antropofagia em seu contexto, com o objetivo de verificar, em termos deliberadamente anacrônicos, até que ponto ela pode transcender seu ambiente, confrontando-a de modo especial com as recentes formulações pós-coloniais.
O ARTIGO procura indicar que Celso Furtado, em A economia colonial do Brasil nos séculos XVI e XVII, se reporta a algumas das interpretações mais influentes do Brasil. Se é verdade que em Formação econômica do Brasil e em escritos posteriores não há citações em profusão, o mesmo não ocorre com a tese de doutorado do economista. Uma das possibilidades oferecidas, a partir daí, é precisamente permitir iniciar o desvelamento do diálogo implícito de Furtado com o pensamento social brasileiro.
THE ARTICLE points out that Celso Furtado, in A economia colonial do Brasil nos séculos XVI e XVII, makes use of some of the most influential interpretations of Brazil. If citations are not common in Formação econômica do Brasil and his other books, the same does not happen with his PhD thesis. Hence, the possibility of exploring the implicit dialogue between Furtado and Brazilian social thought can be open
O trabalho de Roberto Schwarz a respeito de Machado de Assis tem algumas fontes principais. Além de desenvolver sua investigação a partir da interpretação de Antonio Candido sobre a literatura brasileira, nutre-se, como revela no Prefácio do seu segundo livro sobre o romancista oitocentista, Um mestre na periferia do capitalismo, de uma tradição contraditória identificada com Lukács, Benjamin, Brecht e Adorno e de uma "interpretação do Brasil" produzida por alguns trabalhos de ciências sociais realizados na Universidade de São Paulo (USP), especialmente por jovens professores e alunos que se reuniram, no final da década de 1950 e início da década de 1960, para estu-Significativamente, a análise do crítico mais jovem sobre Machado começa onde o crítico mais velho terminou seu estudo sobre a formação da literatura brasileira. Estabelecido finalmente um sistema literário no Brasil, com a presença de produtores (escritores), de linguagem e de público (leitores), tornava-se possível aparecer o escritor capaz de internalizar na sua obra as condições da sociedade que a produziu.Já no que se refere às duas outras grandes inf luências de nosso autor, apesar da inspiração marxista comum a ambas, sua principal realização é saber articulá-las. De certa crítica literária marxista deriva principalmente a sugestão de prestar atenção à relação entre "forma literária e processo social". 3O marxismo uspiano inspira, por sua vez, o projeto de entender a particulari-
Teriam os primeiros espectadores de A tempestade associado em 1611 a ilha deserta da peça à América? Embora fosse então relativamente recente o contato entre europeus e americanos, aquela que se considerou, durante muito tempo, a última peça de William Shakespeare foi indiscutivelmente marcada por eventos do Novo Mundo. Em particular, há fortes indícios de que o dramaturgo se inspirou no naufrágio em Bermudas, ocorrido pouco antes, de um navio que trazia para a América, entre outros, o governador da Virgínia. O autor de A tempestade era, além do mais, próximo de investidores da Companhia da Virgínia. Num sentido mais direto, a utopia que o conselheiro do rei de Nápoles, Gonzalo, imagina, ao naufragar na ilha da peça, é diretamente inspirada no ensaio "Dos canibais", de Michel Montaigne. Talvez ainda mais sugestivamente, é possível identificar um dos habitantes da ilha, Caliban, com um índio americano 1 .1 Em termos textuais, Ariel fala em "to fetch dew from the still-vexed Bermudas" (1. 2. 229). Em tradução livre: "buscar orvalho das Bermudas tempestuosas"; Caliban afirma que a magia de Próspero é suficientemente forte para controlar o deus ve-
Essays that became known as "interpretations of Brazil" appeared mostly between the proclamation of the Republic in 1889 and the spurt in academic life in the 1930s and later. These essays sought an overall analysis of Brazil. However, as universities developed, works of this kind began to lose ground to monographs with more circumscribed aims. The sociologist Florestan Fernandes greatly influenced this development, but his last important work, A revolução burguesa no Brasil (The Bourgeois Revolution in Brazil), written after the military coup of 1964, differs from his other works, as is indicated by its subtitle, "an essay of sociological interpretation." On the one hand lies the "essay," on the other the "sociological interpretation." The former allows him to "interpret Brazil," but he does so with the eyes of a sociologist. Establishing a dialogue between A revolução burguesa no Brasil and other interpretations of Brazil such as those of Prado Júnior, Vianna, Buarque, and Freyre reveals the significance of this distinction.
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