Os usuários de álcool, Atenção Primária à Saúde e o que é "perdido na tradução"

Abstract

Discute-se o paradoxo presente na Atenção Primária à Saúde (APS) de, por um lado, haver tecnologias clínicas e oportunidades para se abordarem pacientes que fazem uso problemático do álcool e, por outro, verificar-se que este tipo de atenção não se efetiva para parcela considerável desses usuários. Fez-se uma revisão bibliográfica crítica de cunho narrativo, cujos resultados abordam: a delimitação do paradoxo; as dificuldades pelas quais passariam os profissionais de saúde e seus pacientes para, respectivamente, disponibilizarem e solicitarem intervenções sobre padrões considerados problemáticos de consumo de álcool; as aplicações e limitações das técnicas motivacionais, como as intervenções breves, na APS, e, por fim, discutem-se algumas questões relativas à formação profissional em saúde. Conclui-se que esta problemática envolve a necessidade de se promover uma agenda de investigações que aprofunde a compreensão sobre seus complexos significados psicoculturais, particularmente no Brasil.

O álcool na atenção primária à saúde: atitude dos profissionais de saúde quanto ao consumo e uso prejudicial de álcool e o alcoolismo

“…Este conceito, que ainda perdura e traz percepções estigmatizantes e estereotipadas, favorece a desmotivação dos profissionais a lidarem com esses sujeitos (Oliveira et al, 2019;Vargas;Luis, 2008). De tal forma, todo esse estigma e falta de conhecimento, que gera desconforto dos profissionais em abordar o consumo de álcool (Pinho et al, 2018;Vargas;Bittencourt, 2013), também pode ser observado em relação aos usuários dos serviços, conforme sinalizado na percepção desses profissionais e relatado na literatura, de que o próprio alcoolista não se reconhece como alguém que precisa ser cuidado ou, ainda, não se sente à vontade no serviço de saúde para revelar essa necessidade (Brasil, 2003;Fontanella et al, 2011;Vargas;Oliveira, 2011).…”

“…Entretanto, apesar dessa capacidade, a identificação precoce do consumidor de risco ainda tem passado despercebida aos profissionais de saúde, principalmente em relação aos padrões de consumo que não caracterizam dependência (Brasil, 2003;Fontanella et al, 2011).…”

Effectiveness of brief group intervention in the harmful alcohol use in primary health care

“…Currently these services aim at preventing and reducing the damages of health risk behaviors. However, when it comes to the health care for alcohol users, there is a shortage of practices related to early interventions for the development of alcohol dependence in these health services 28 .…”

Efetividade da intervenção breve grupal realizada por enfermeiros no uso de risco e nocivo de álcool

“…Os dados também evidenciaram uma taxa de participação da intervenção reduzida. Esse fato pode ser explicado pela falta de conhecimento da população a respeito do uso nocivo de álcool, uma vez que, nos serviços de atenção primária brasileiros não é comum a dispensação de informações com relação ao padrão de uso de álcool e orientações de redução de danos sobre esses padrões, mas quando existem orientações nesses serviços para esse tipo de problema, geralmente são realizadas baseadas no encaminhamento de pessoas com sinais e sintomas de alcoolismo, ou seja, as pessoas que recebem orientações sobre problemas relacionados ao consumo de álcool geralmente já adoeceram ou desenvolveram dependência dessa substância (Souza, Ronzani, 2012;Fontanella et al, 2011).…”

“…Assim, considerando que falar sobre o uso problemático de álcool com a população não é uma prática comum, somado ao estigma e ao peso moral das questões relacionadas ao consumo de álcool (Ronzani, Furtado, 2010), o primeiro contato com essas informações, podem gerar resistência na população em aceitar participar de intervenções relacionadas ao consumo de álcool, uma vez que, para o senso comum, apenas pessoas com dependência alcoólica devem cuidar desse problema (Fontanella et al, 2011) Portanto, devido à falta de informação, as pessoas atendidas nos serviços de (Brasil, 2013).…”