Poucos temas são, ao mesmo tempo, tão clássicos e controversos quanto o dinheiro. Sua exegese analítica foi realizada por gerações de economistas, e sua problematização é concomitante ao próprio surgimento das primeiras grandes teorias sociológicas. Talvez, justamente, por conta dessa passagem -um tanto problemática para a primeira geração de cientistas sociais (ver Simmel, 1998;Weber, 1978) -da economia à sociologia, o dinheiro tornou--se um daqueles "temas" que, à maneira da linguagem, pela sua ambiguidade, viu-se, de um lado, como um objeto de investigação privilegiado e, de outro, como próprio meio pelo qual o objeto poderia ser explicado 1 (Hart, 2012).Em função de sua abstração -ou melhor, do princípio de que o dinheiro apenas se explica pela sua abstração como mecanismo de equivalência e intercambialidade -, a análise sociológica em torno de suas funções esteve muito próxima do signifi cado que adquiria em modelos econômicos hegemônicos: isto é, como meio de troca, unidade de conta e reserva de valor (Carruthers, 2005; Clarke, 1996, p. 209-211). Por sua vez, a antropologia engajou-se nesse debate a partir do estudo de formas variáveis de dinheiro em sociedades primitivas ou, em todo o caso, não ocidentais (Douglas, 1967;Polanyi, 1957; Zelizer, 2010, p. 97-98).Apenas na década de 1980, com o surgimento de uma literatura especializada sobre o tema, e a institucionalização da sociologia e antropologia da economia (Neiburg, 2010), o dinheiro volta a ser objeto de investigações * Doutorando em Antropologia Social. Contato: moiseskopper@gmail.com.