IntroduçãoNas últimas décadas, o interesse em relação aos textos escritos pelos ameríndios levou uma geração de historiadores a repensar a experiência do contato cultural e evidenciar o protagonismo indígena na organização das sociedades hispano-americanas.1 Apesar dessa tendência, e da relevância apresentada pela escrita como parte das estratégias de catequese, não há estudos que analisem as apropriações efetuadas por parte dos indígenas da instrução alfabética promovida no Paraguai colonial. No caso das reduções controladas pelos missionários jesuítas, somente os lingüis-tas haviam sinalizado, pioneiramente, a existência de documentos escritos pelos guaranis.
2Ausência que se faz notar, principalmente, diante do fato de que as reduções jesuítico-guaranis configuravam-se, entre os séculos XVII e XVIII, como um espaço social de difusão da cultura escrita. O investimento na alfabetização indígena foi uma decorrência da evangelização pretendida, e cujo aprendizado permitiu aos guaranis atingir uma notável destreza na prática da escrita. Em algumas oportunidades, inclusive, elaboraram obras de caráter devocional -livros, na sua maioria com finalidade litúr-gica ou catequética -, participando diretamente na elaboração de vocabulários, catecismos e gramáticas. Com efeito, as modalidades de evangelização praticadas pelos jesuí-tas têm permitido compreender a rápida difusão e aceitação do escrito, frente à situação de oralidade primária da sociedade guarani. A partir do impacto da alfabetização na organização social das reduções, nem mais a oralidade, tampouco a "razão gráfica" -a expressão da domesticação do