“Imagina ela nua!”: Experiências de mulheres que se autodeclaram gordas

Abstract

Resumo: Buscamos compreender os significados que mulheres que se autodeclaram gordas atribuem às suas experiências corporais cotidianas. Foi realizada uma pesquisa qualitativa de base fenomenológica envolvendo cinco interlocutoras, com idades entre 18 a 46 anos. Utilizou-se a entrevista semiestruturada como técnica de coleta de dados. A análise do material se deu por uma perspectiva fenomenológica e apontou os preconceitos sofridos, mas também as estratégias elaboradas por essas mulheres em sua rotina. Destacamos, ao fim, a necessidade de se ampliar as reflexões sobre a temática dentro das produções teóricas feministas e dos estudos de gênero.

“Sou incapaz porque sou gorda”: relato de caso acerca da influência de práticas culturais gordofóbicas sobre sentimentos de inadequação e incapacidade

“…O "desânimo" e a "tristeza" relatados por Marina são produtos sociais, tanto 13 RBTCC 25 (2024) na interação com seu contexto, cujas contingências levaram a produção de tais estados corporais, quanto na nomeação desses estados corporais, conforme propõe Guilhardi (2007). Por exemplo, uma das possibilidades de "sentir-se" "desmotivada" e "triste", sentimentos geralmente relacionados à depressão, diagnóstico atribuído à cliente, como também são relatados pelas participantes das pesquisas com mulheres gordas apresentadas por Jimenez (2022) e Menezes et al (2020), pode estar relacionada com a ocorrência de eventos aversivos incontroláveis após a apresentação de ações por Marina, e a privação de acesso a reforçadores positivos. Conforme afirmam Nico et al (2015), são incontáveis as contingências sociais que favorecem padrões comportamentais característicos da "depressão".…”

“…Apesar de haver publicações sobre gordofobia em Psicologia ou áreas afins, a produção ainda é incipiente. Estudos apresentam relatos de mulheres gordas e examinam as implicações de práticas preconceituosas sobre seus corpos gordos e sofrimentos vivenciados (Jimenez, 2022;Menezes et al, 2020); exame de documentos normativos de práticas profissionais em relação à obesidade como reprodutores de estereótipos de corpos gordos (Paim & Kovaleski, 2020); exame de vídeos como possibilidade de divulgação de discursos contra-hegemônicos acerca dos corpos gordos (Penas & Germano, 2021); revisão integrativa sobre estigmas de profissionais de saúde na atenção a pessoas obesas, no qual foram identificadas apenas publicações internacionais (Rodrigues et al, 2016); gordofobia no ambiente escolar (Souza & Gonçalves, 2021); relações com a mídia na produção de preconceitos a corpos gordos (Oliveira-Cruz & Isaia, 2022), entre outros. Especificamente a partir de uma compreensão analítico-comportamental, não foram identificados estudos sobre gordofobia.…”

“…Historicamente, práticas culturais promovem padrões de corpo, nos quais estereótipos de "formatos de corpo" são culturalmente reforçados. Como apresentam Menezes et al (2020), mesmo em épocas de escassez, RBTCC 25 (2024) nas quais corpos mais arredondados eram tidos como sinônimo de beleza, riqueza e fartura, formas de censura já eram impostas aos excessos alimentares ainda na Idade Média. As autoras destacam que a "negativização" do corpo gordo se intensifica com o advento da urbanização e do capitalismo, a partir do século XVII, em decorrência da lógica produtiva, a partir da qual a "exigência de corpos ativos, leves e eficientes passa a pontuar a ineficácia da pessoa gorda" (Menezes et al, 2020, p. 4).…”

“…As definições de gordofobia abrangem elementos que a designam como preconceito, estigmatização e aversão a pessoas por seus corpos gordos (Jimenez, 2022;Menezes et al, 2020;Paim & Kovaleski, 2020), de forma estrutural na sociedade (Jimenez, 2022;Paim & Kovaleski, 2020), sem reconhecimento da opressão social vivenciada por pessoas gordas por ser considerado como problema de saúde (Paim & Kovaleski, 2020). Nesse contexto, uma tentativa de definição analítico-comportamental de gordofobia pode ser considerá-la como práticas culturais que consistem em, diante de pessoas (ou imagens de pessoas) com corpos gordos (segundo a percepção de membros da comunidade socioverbal), emitir avaliações e comentários depreciativos por membros da comunidade socioverbal; ações de exclusão de atividades ou de grupos sociais; sentimentos de aversão em decorrência do peso, tamanho e/ou forma do corpo de outro membro da comunidade, que é julgado como fora de um padrão estético ou de saúde fortalecido pelo grupo social.…”

“…Contingências aversivas a que pessoas gordas são expostas são, na maioria das vezes, incontroláveis e apresentadas muito precocemente (Jimenez, 2022;Menezes et al, 2020). Precocemente, pois as consequências aversivas são apresentadas cedo na vida de pessoas gordas (como em relatos apresentados por Menezes et al, 2020, p. 4).…”