RESUMO -Apesar de encaminhar a superação do dualismo metafísico, o conceito de evento privado não se apresenta de forma consensual, nem é unânime na abordagem analítico-comportamental dos fenômenos subjetivos. O debate travado entre defensores e críticos do conceito, contudo, parece não enfrentar satisfatoriamente uma importante questão: a noção de privacidade como inacessibilidade a estímulos promove a vinculação dessa proposta a pressupostos filosóficos incompatíveis com o projeto comportamentalista radical. Este trabalho apresenta argumentos críticos para a superação da noção de privacidade e do conceito de evento privado, propondo caminhos alternativos de análise. Questiona-se a desvinculação entre observação e interpretação presente na raiz da distinção público-privado, propondo-se a substituição da noção de privacidade pela noção de complexidade.Palavras-chave: evento privado, fenômenos subjetivos, behaviorismo radical.
Beyond privacyABSTRACT -Although promoting overcoming metaphysical dualism, the concept of private event does not have a consensual and uncritical development in behavior-analytic approach of subjective phenomena. The debate among advocates and critics of this concept, however, has not satisfactorily touch an important issue: the notion of privacy as inaccessibility to stimuli promotes the link of this proposal with philosophical commitments incompatible with radical behaviorism. This paper presents critical arguments towards overcoming the notion of privacy and the concept of private event, presenting alternative analysis. One questions the connection between observation and interpretation present in the public-private distinction, suggesting the replacement of the concept of privacy by the notion of complexity.Keywords: private event, subjective phenomena, radical behaviorism.O conceito de evento privado, empregado por Skinner mais sistematicamente a partir da década de 1940, gradualmente tornou-se a forma de explicação dos fenômenos subjetivos predominante na tradição comportamentalista (Baum, 2005;Carrara, 2005;Catania, 2011;Moore, 2009). A centralidade desse conceito na apreciação do tema levou alguns autores a inclusive defendê-lo como uma das principais características do behaviorismo radical, uma vez que o afastaria dos demais "behaviorismos", sobretudo do behaviorismo metodológico (Carrara, 2005;Matos, 1995;Moore, 1995;Tourinho, 2004).A despeito disso, na última década, alguns autores têm voltado ao tema de modo mais crítico, questionando a aparente facilidade como o conceito de evento privado foi incorporado à literatura da área (Baum, 2011;Hayes & Fryling, 2009; Hoccut, 2009;Lopes, 2006;Rachlin, 2011;Tourinho, 2011). Tourinho (2006Tourinho ( , 2011, por exemplo, ressalta que um dos méritos da proposta de Skinner foi proporcionar a superação do dualismo metafísico, fortemente arraigado em concepções psicológicas mentalistas. Contudo, a rejeição skinneriana "da categoria de mental serve apenas para afastar o dualismo metafísico, mas não funciona para instituir uma perspectiva total...