Como Os Juízes Decidem Os Casos De Estupro? Analisando Sentenças Sob a Perspectiva De Vieses E Estereótipos De Gênero

Abstract

Estereótipos sobre as mulheres estão presentes em abundância na sociedade e no Judiciário. Partindo desse diagnóstico, o objetivo deste artigo é identificar quais são os principais estereótipos que dificultam o acesso das mulheres à justiça em casos de estupro, além de compreender de que forma esses estereótipos atuam nos três níveis em que eles estão imbricados na sociedade: individual, coletivo e mais geral. Para tanto, são analisadas sentenças de 1º grau do Tribunal de Justiça do estado de São Paulo, do ano de 2016. Embora a amostra que embasou o estudo seja limitada a 63 sentenças, foi possível aferir que as mulheres têm seus depoimentos valorizados apenas se corresponderem ao ideal de mulher honesta e se parecerem ter sido vítimas; caso contrário, são retratadas como alguém de quem se deve desconfiar, passando rápida e frequentemente de vítimas a culpadas. Nesse contexto, o estereótipo da mulher honesta, assim como os estereótipos de vítima, no nível individual, atuam como atalhos cognitivos na tomada das decisões judiciais, levando a sentenças enviesadas, que desconsideram as peculiaridades dos casos concretos. De modo semelhante, esses estereótipos sustentam e são sustentados, nos níveis coletivo e mais geral, por uma estrutura social que subalterniza mulheres. Esperamos que a identificação desses estereótipos e a busca por explicações acerca da sua atuação nos três níveis em que estão imbricados na sociedade auxilie a formulação de políticas públicas que visem mitigar esses estereótipos e seus efeitos e, assim, garantir a efetividade do acesso das mulheres à justiça.

(In) Existência De Estereótipos De Gênero Na Jurisprudência Portuguesa

“…Fazendo referência à análise de(BELEZA, 2004) 19 Indica-se as leituras das seguintes obras se houver interesse no contexto brasileiro: (ALMEIDA, 2017);(ALMEIDA, 2018);(COULOURIS, 2010);(LORENTE, 2016);(SIQUEIRA, 2016);(PLACCA, 2018);(KONRAD, 2017). Dá-se destaque à obra de (SCARPATI, 2013), tendo em vista que ela analisa da perspectiva de uma psicóloga os alunos dos últimos períodos do curso de direito, o estudo consiste em perguntar quais as teses de defesa usariam para defender um agressor em caso de estupro, na pesquisa fica evidente que as teses de defesa circundam quase sempre nos estereótipos de gênero, na mulher mentirosa, desonesta, entre outros perfis.…”

A ação penal nos crimes contra a liberdade sexual: estudo sobre a (in)visibilidade das mulheres no processamento jurídico-penal da violência sexual

“…PIMENTEL, SCHRITZMEYER, PANDJIARJIAN, 1998;ALMEIDA;NOJIRI, 2018;ANDRADE, 2018b). Esse escrutínio por parte dos agentes do sistema de justiça criminal, no sentido de submeter a mulher e sua experiência de violência à padrões de conduta construídos em relação ao que se configura como estupro e quem pode estar envolvido nele, resultam numa intensa revitimização de mulheres alvo de violência sexual.…”

Análise das decisões de segunda instância do Tribunal de Justiça de Minas Gerais sob a ótica dos estereótipos nos crimes de estupro de vulnerável pelo critério etário

“…Por conseguinte, é possível verificar nos discursos uma violência simbólica, que classifica e avalia os comportamentos das mulheres em função de uma adequação a determinados papéis sociais, atribuindo pesos distinto a condutas praticadas por mulheres e homens (Almeida;Pandjiarjian;Izumino, 2002).…”

“…Nesse sentido, Almeida e Nojiri (2018), reforçam que há uma grande distância entre o direito formal e o direito que se pratica, em relação aos crimes de estupro: "as alterações legais possuem um efeito positivo mitigado pela arraigada cultura sexista e discriminatória contra as mulheres que influência a interpretação das leis, tal qual o senso comum" (Almeida;Nojiri, 2018, p. 826).…”

“…Os pesquisadores realizaram análise de 63 decisões judiciais do Tribunal de Justiça de São Paulo do ano de 2016 e verificaram a presença de estereótipos de gênero nas decisões, ou uma postura de omissão do julgador diante das representações estereotipadas da vítima, tornando o processo judicial um lugar que se investiga a vida pregressa da vítima e a revitimiza. Aliás, os estereótipos nomeados nas decisões já tinham sido identificados há 20 anos e eles ainda estavam presentes nas decisões judiciais, de forma menos explícita, mas ainda reproduzidos em decisões judiciais (Almeida;Nojiri, 2018).…”