“…Ainda no início de nossa formação enquanto antropólogos, quando somos provocados a refletir sobre os temas "clássicos" da disciplina e a estudar e compreender o processo de consolidação da Antropologia enquanto uma ciência autônoma, comumente, somos conduzidos a uma lista de referências "incontornáveis" que transformam os primeiros anos de contato com a teoria antropológica em um longo período de leituras de trabalhos produzidos por antropólogos brancos -homens, em sua imensa maioria. Indo de encontro a iniciativas que têm buscado tencionar os processos excludentes que permeiam a solidez irrepreensível dos cânones antropológicos (Böschemeier et al, 2020), colocando em evidência a "necessidade de uma revisão profunda dos currículos e dos clássicos da antropologia" (Hurston, 2019;Basques, 2019) abordados no Brasil, proponho nesse ensaio um caminho alternativo ao quadro de leituras embranquecido e masculino acerca de um dos períodos formativos da disciplina, apresentando uma reflexão sobre alguns elementos da obra de Zora Hurston, escritora e intelectual negra estadunidense, a quem, durante muito tempo, foi negado o reconhecimento devido por seus trabalhos realizados enquanto antropóloga. Apesar de ter se tornado mais conhecida por seus escritos como romancista, em um certo período de sua trajetória, a autora teve Franz Boas como orientador e professor, antropólogo considerado por muitos o pai da Antropologia Cultural norte-americana.…”