RESUMOEste artigo aborda, sob a perspectiva da Linguística Funcional Centrada no Uso, as construções causais do tipo p porque q e porque q, p. Descrevem-se, diacronicamente, os usos semântico-pragmáticos e o estatuto sintático dessas construções, tendo em vista o pareamento de forma e função.PALAVRAS-CHAVE: orações; porque; diacronia.Recebido em: 11 jun. 2017 Aprovado em: 20 set. 2017 E ste artigo analisa, diacronicamente, as construções oracionais do tipo p porque q e porque q, p, tendo em vista os seguintes objetivos: i) discutir a trajetória de gramaticalização do conector porque; ii) mapear as nuanças de causalidade mobilizadas pelas orações introduzidas por esse conector e iii) descrever o estatuto sintático dessas orações em correlação com os seus usos semântico-pragmáticos.Nesta investigação, seguem-se os pressupostos teórico-metodológicos da Linguística Funcional Centrada no Uso (LFCU), uma vez que as análises em-1 Este artigo apresenta parte dos resultados da pesquisa de doutorado intitulada "Gramaticalização de conectores causais na história do português", que, desenvolvida no (BYBEE, 2010, p. 32; MARTELOTTA, 2011, p. 54-5). Estudos da conexão causal, no português e em outras línguas, ora focam a expressão da causalidade, apresentando classificações dicotômicas (causa/ explicação) ou escalares para as relações causais (relações que se dão em diferentes domínios cognitivos), ora tratam do estatuto sintático das orações de causa, também a partir de uma dicotomia (coordenação/subordinação) ou de uma perspectiva de continuum (parataxe/hipotaxe/subordinação).No presente artigo, abordam-se tanto a forma, representada pela dimensão sintática, quanto a função, definida pelos usos semântico-pragmáticos, das orações causais com porque. Conforme se evidenciará adiante, o pareamento de forma e função revela-se fundamental para compreender fenômenos de mudança no domínio da junção causal.
A análise linguística centrada no usoO funcionalismo, considerado genericamente, tem como principal objetivo o estudo da língua em uso, isto é, o desenvolvimento de investigações que, ultrapassando os limites da forma linguística, recrutam elementos e fatores do contexto da interação verbal. Nessa perspectiva, a função do sistema deve ter prioridade sobre a sua forma, de modo que o componente pragmático da linguagem assuma um papel central no estudo da língua, premissa baseada no reconhecimento de que, no discurso, estão as principais motivações capazes de interferir nos demais componentes (o semântico, o sintático e o fonológico).Embora a primazia da função represente o princípio fundamental do funcionalismo, não se deve compreendê-lo como uma abordagem que goza de homogeneidade teórico-metodológica; daí haver, na realidade, funcionalismos. Desse modo, as análises e interpretações aqui apresentadas filiam-se à chamada Linguística Funcional Centrada no Uso (doravante LFCU), um tipo de funcionalismo que investiga a dinâmica dos fenômenos de variação e mudança linguística como efeito de processos pragmáticos e cognitivos (BYBEE, 2...