Revista Brasileira de Ciência Política, nº7. Brasília, janeiro -abril de 2012, pp. 285-318.Brasil e Uruguai são países muito diferentes entre si. Enquanto um fala português e possui população estimada de quase 200 milhões de habitantes, o outro apresenta colonização espanhola e não chega a 3,5 milhões, dos quais aproximadamente 50% concentrados na capital, Montevidéu. O território brasileiro é cerca de 50 vezes maior do que o uruguaio, o segundo menor da América do Sul, com extensão equivalente a do estado do Paraná. Do ponto de vista de organização política, embora os dois adotem sistema presidencialista e representação proporcional, tem-se uma federação e um Estado unitário. Além disso, o Uruguai é detentor de um sistema partidá-rio classificado como institucionalizado, estável, consolidado e altamente nacionalizado, cujas mais tradicionais legendas são centenárias (partidos Colorado e Nacional), enquanto o Brasil não goza dos mesmos atributos. Enfim, em uma primeira análise, a magnitude dos contrastes não estimula a comparação, ainda mais no campo da política.1 No entanto, a contra-senso, o trabalho se propõe a empreender tal tarefa.O mote é o fato de ambos terem vivenciado alterações em seus sistemas políticos, no final dos anos 1990, que reduziram as diferenças institucionais O advento da reeleição dos chefes do executivo no Brasil modificou as estruturas de oportunidades de carreira dos políticos e as estratégias dos partidos, refletindo-se também nos índices de permanência e de renovação do legislativo. Igualmente, alterou os cenários institucionais e a dinâmica em que se processam os pleitos, ao incluir mecanismos de accountability e ao dar origem a aqueles em que o titular do executivo concorre à reeleição (incumbent) e a aqueles em que necessariamente há mudança, pois este não pode ou não quer se reapresentar. (Mainwaring e Shugart, 1997;Serrafero, 1997;Samuels, 1998;Jones, 1999; Meneguin e Bugarin, 2001;Ames, 2003; Anastasia, Melo e Santos, 2004; Mendes e Rocha, 2004; Meneguin, Bugarin e Carvalho, 2005; Nakaguma e Bender, 2006; Pereira e Rennó, 2007; Sakurai e Menezes Filho, 2008). No Uruguai, antes da reforma, a disputa departamental estava condicionada à nacional e praticamente não havia variação na votação dos partidos entre os dois níveis. Com a adoção de um calendário próprio, ampliou-se a possibilidade de a eleição municipal tornar-se uma competição autônoma, na qual o fator local ganha força.Este texto é o esforço inicial de uma pesquisa mais ampla cujo propósito é analisar comparativamente o impacto que essas mudanças têm causado nos sistemas políticos dos dois países, tendo como foco as disputas para prefeito no Brasil e intendente no Uruguai. Busca-se saber como, a partir da possibilidade de reeleição e com disputas em calendário próprio, a eleição do chefe do executivo nas instâncias locais tem se apresentado nos dois países, no que tange a candidatos e partidos postulantes, resultados, bem como as consequências que produz nos sistemas partidários. 2 Ele se estrutura em duas seções. A pr...