A vida longa das linhas retas: cinco mitos sobre as fronteiras na África Negra 1 WOLFGANG DÖPCKE* IntroduçãoAs fronteiras dos Estados africanos modernos são um polêmico objeto de estudo. São apontadas, tanto no discurso acadêmico quanto na opinião pública 2 , como um dos principais culpados pela instabilidade política e pelos conflitos no continente. A maneira arbitrária pela qual as fronteiras foram impostas às sociedades africanas pelos colonizadores europeus, ignorando as realidades étnicas, geográficas, ecológicas e políticas existentes 3 , teria criado as raízes de "one of Africa's greatest problems that developed with the European conquest." 4 O dito famoso de Lord Curzon de que "frontiers are indeed the razor's edge on which had suspended the modern issues of war and peace" parece ser verdadeiro também para a África. 5 O termo fronteira é aqui referido como a divisa internacional que delimita o território sobre o qual um Estado com status e papel internacional exerce soberania e jurisdição. Esta noção de fronteira, ao contrário da frontier entendida na língua inglesa como uma zona 6 , refere-se a uma linha "described in words in a treaty, and/or shown on a map or chart, and/or marked on the ground by physical indicators [...]. A boundary has no breadth and a meeting of boundaries [...] involves a point and not a zone of joint sovereignty." 7 A criação de fronteiras na época moderna envolve um processo histórico com três fases distintas: a) a alocação, sendo uma divisão "bruta" e inexata de território; b) a delimitação, sendo a descrição do percurso da linha fronteiriça em um tratado, um mapa ou outro documento; c) a demarcação física da fronteira na paisagem.Os atuais 54 Estados africanos 8 estão divididos por 109 fronteiras internacionais que medem no conjunto cerca de 50.000 milhas e, dentro desta perspectiva, a África é o continente mais dividido. As fronteiras modernas na Rev. Bras. Polít. Int. 42 (1): 77-109 [1999] * Professor Adjunto em História Contemporânea do Departamento de História da Universidade de Brasília. WOLFGANG DÖPCKEÁfrica são, em elevada proporção, consideradas "artificiais". Somente 26% delas segue linhas dadas pelo relevo natural (como montanhas, rios, linhas divisórias de águas). Quase a metade das fronteiras corresponde a linhas astronômicas e 30% a linhas matemáticas. 9 As fronteiras também dividem o que antigamente foi denominado áreas tribais e o que hoje aparece mais como "áreas culturais". Ainda que tenhamos em mente a complexidade e a impossibilidade de se atribuir limites exatos a fenômenos tão flexíveis e fluidos como culture area ou denominação étnica, podemos afirmar que, na África contemporânea, muito poucas fronteiras coincidem com as culture areas e que entre 131 e 187 destas culture areas, respectivamente "áreas tribais", estão divididas entre um ou mais Estados. 10 No debate sobre os conflitos políticos na África contemporânea, comumente destaca-se o papel das fronteiras e suas origens coloniais como uma das principais vertentes. Entretanto, este discurso, domina...
O NEPAD - New Partnership for African Development - tem seus primórdios em 1996, proposto pelo atual presidente da África do Sul, Thabo Mbeki e outros líderes africanos, para erradicar a marginalização e o subdesenvolvimento africanos e promover o crescimento econômico, através da integração continental. Seus objetivos, inseridos no contexto da globalização e do African Renaissance, incorpora valores da luta antiapartheid sul-africana, restauração da auto-estima e resgate de valores pré-coloniais. O que o difere de outros planos que não deram certo na África é o vínculo inseparável entre democracia, direitos humanos, paz, governabilidade e o desenvolvimento econômico, as responsabilidades assumidas pelos participantes e a propriedade africana do plano.
Rev. Bras. Polít. Int. 41 (1): 133-161 [1998] * Professor Adjunto de História Contemporânea da Universidade de Brasília. WOLFGANG DÖPCKEOs eventos em Angola destoam desta imagem geral de pacificação. No conflito angolano, mediações levaram à conclusão do Acordo de Paz de Bicesse, em 1991, entre o Governo angolano e a UNITA e às eleições multipartidárias em setembro de 1992. Mas, a recusa, por parte da UNITA, em aceitar a derrota eleitoral, bem como a sua decisão de reiniciar a guerra, reabriram este conflito, agora em uma escala muito superior. A UNITA chegou a controlar uma grande parte do território angolano, mas perdeu a iniciativa militar ao final de 1994. Com a perda da maior parte do seu apoio externo, o movimento iniciou então uma dramática retirada. O último golpe contra a capacidade militar deste movimento se deu em maio de 1997, com a queda do regime de Mobuto no Zaire, o último aliado da UNITA na África Austral. A UNITA sofreu uma série de derrotas militares e, desde o final de 1994, as hostilidades se reduziram a uma pequena escala. Ao mesmo tempo, negociações sobre uma solução pacífica do conflito foram reiniciadas e perduram até hoje em dia.Existem duas razões interligadas que explicam esta pacificação das relações regionais na África Austral durante os últimos 10 anos: a) o fim da Guerra Fria e, subseqüentemente, do engajamento conflituoso da duas super-potências no sub-continente sul-africano e b) o fim da política de desestabilização da África do Sul. Este artigo pretende analisar a transformação das relações regionais através da perspectiva de um dos atores principais, isto é, da África do Sul e sua política regional. Pretende demonstrar que as mudanças principais no processo de inserção regional da África do Sul aconteceram entre 1989 e 1992-3 e, assim, antes da posse, em 1994, do novo Governo de National Union, liderado pelo Congresso Nacional Africano (CNA). Em segundo lugar, será demonstrada a maneira pela qual os dois fios condutores da política exterior da África do Sul, a política oficial do Estado do apartheid e a "contra-política" do CNA se fundiram entre 1991 e 1994. Durante esta fusão, conceitos e princípios importantes do CNA foram abandonados. Apesar da garantia enfática dada por parte do CNA de que a África do Sul abandonaria todas as ambições hegemônicas sub-regionais, a política de "geo-economia" continuou a influenciar profundamente a política regional do país depois de 1994. Nesta perspectiva "geo-econômica", o sub-continente representa principalmente um mercado para a África do Sul e, conseqüentemente, as relações entre os Estados chegam a ser influenciadas, cada vez mais, por interesses econômicos conflituosos que, às vezes, têm uma longa "pré-história"anterior à Segunda Guerra Mundial. II.As relações internacionais da África Austral não foram sempre tão conflituosas como na década de 80. Desde a ocupação colonial da região, a subjugação da população indígena e a repressão da resistência contra a dominação UMA NOVA POLÍTICA EXTERIOR DEPOIS DO APARTHEID? -REFLEXÕES SOBRE......
Em seus capítulos, o livro apresenta uma certa diversidade de abordagens de ordem teórico-metodológica. A parte do Cervo é um trabalho bem sucedido na tradição da história das relações internacionais de Duroselle, tentando analisar forças mais profundas e grupos estratégicos dentro das duas sociedades que influenciaram a inserção internacional dos dois países, além de demonstrar o cotidiano da diplomacia. Diferentemente, os capítulos que compõem a segunda parte do livro, elaborados por Cavet, restringem-se aos limites de uma história diplomática tradicional, descrevendo principalmente, com muita paciência e com muito amor aos detalhes, a atuação das chancelarias e o conteúdo de tratados. O capítulo sobre as relações culturais no século XIX, localiza-se dentro dos paradigmas da história das idéias e da história intelectual e da literatura e podemos dizer que, de fato, convence. Esta diversidade, embora inspiradora, dificulta a leitura e a compreensão da obra. Seria bem-vinda uma melhor explicitação das vertentes
IntroduçãoA recente 3 a Conferência Mundial da ONU contra o Racismo, que reuniu mais de seis mil representantes de governos e Organizações Não-Governamentais em Durban, na África do Sul, ameaçou fracassar por causa de profundas divergências de opinião sobre dois assuntos: a política israelense contra os palestinos e a terminologia da condenação da escravidão e do tráfico transatlântico de escravos. Para que não haja dúvidas, é importante lembrar que a parte polêmica da condenação do tráfico de escravos se refere ao comércio triangular do sistema atlântico entre 1450 e cerca de 1850 e à escravidão nas Américas durante esta época. Depois da retirada dos Estados Unidos e de Israel, a Conferência se radicalizou. Foi salvada em amargas e "frenéticas" negociações nos bastidores e por uma prorrogação de mais um dia. Confrontados com a intransigência dos Estados europeus, os delegados africanos mais radicais recuaram e aceitaram um documento final de compromisso. As afirmações deste documento final acerca do tráfico transatlântico de escravos já provocaram as mais diversas interpretações -de uma "vitória" decisiva dos europeus (uma vez que desculpas explícitas e indenizações não foram pedidas) até celebrações de ONGs, que vêem na condenação do tráfico como crime contra a humanidade, um fundamento jurídico para se abrir processo de indenização na justiça. Uma coisa parece certa: a questão de reparações pelo sofrimento e danos causados pelo tráfico transatlântico de escravos está longe de ser encerrada e manterá um grande peso no cenário da política internacional -influenciando as relações Norte-Sul -e nos discursos da política interna nos Estados Unidos. O problema se coloca também para a sociedade e política brasileiras, uma vez que o
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