Este texto procura abrir a possibilidade de se discutir, em conjunto, os processos próprios da escrita, vividos individualmente, mas partilhados na condição comum de alunos de doutoramento. Trata-se de promover uma discussão intensiva em torno dos bloqueios históricos que atingem a produção e a circulação dos textos acadêmicos, a partir de conceitos emanados de duas teses em história da educação. Nomeadamente, identificou-se em cada uma delas instrumentos singulares que realizam essa ligação entre o passado e o presente da ontologia da aprendizagem, a saber, os conceitos de polícia e de gênio. Apresenta-se a desnaturalização dessas noções do presente como solução local, artesanal e inteiramente irrepetível destinada a suspender a permanência histórica de figuras incapacitadas pela posição de autoridade e de ingenuidade em que se instalaram no processo de escrita inventiva. Em primeiro lugar, procurou-se pensar um conceito de polícia que permitisse analisar o problema da autoridade no sábio. Em segundo lugar, pretendeu-se identificar no gênio um aprendiz ingênuo. A partir desse duplo deslocamento, extraímos generalizações imputáveis à nossa escrita, contornando a segurança de quem fala (sábio) e o medo de quem escreve (aprendiz) com a personagem ambivalente do sábio-aprendiz, imagem do estatuto efêmero do pesquisador e do escritor recém-legitimado ainda por consagrar. O debate apoia-se no convite lançado pela literatura pós-estruturalista ao equacionar a vida enquanto obra de arte, traduzido aqui na possibilidade de refletir criticamente a respeito da virtualidade de se ser, simultaneamente, o sujeito e o objeto do seu próprio texto.
Os textos em que Roland Barthes mais se interrogou sobre o lugar que ocupava no interior das instituições académicas abrem, no campo pedagógico, a possibilidade fantasmática de imaginarmos um tempo em que não vivemos, aquele em que professores e alunos constituiriam, em conjunto e na pluralidade das suas respetivas vozes, uma comunidade de investigadores por vir. Este artigo procura capturar e problematizar a sua reiterada convicção de que a operação fundamental do trabalho académico consiste em experimentar o que ele mesmo apelidou de método de desapossamento, tanto no domínio da investigação como no da docência. Propomo-nos, assim, atravessar sistematicamente os escritos em que Barthes postulou a hipótese de entendermos o ensino como ato eminentemente poético, submetendo a nossa pesquisa a quatro grandes categorias: 1) a Fala, 2) a Escrita, 3), a Leitura e 4) o Viver Junto.
RESUMO O artigo versa sobre a gênese e difusão de um dispositivo escolar caracterizado pelos princípios da ordem, da uniformidade e da totalização sistemática que foi conferindo particular ênfase ao governo da palavra escrita. Analisamos a instituição onde esse modelo foi aplicado, a Universidade de Paris de inícios do século XVI, para em seguida nos determos na ação pedagógica dos jesuítas. Incutindo-lhe a sua marca própria, a Companhia de Jesus acabaria por disseminar a experiência parisiense pelo mundo inteiro. O estudo da apropriação inaciana do modus parisiensis, tomando como fontes os textos fundadores da congregação (Constituições da Companhia de Jesus, Ratio Studiorum e Exercícios espirituais), permite-nos revisitar uma das mais decisivas proveniências da ordem do discurso que ainda hoje imperam nas nossas instituições de ensino. Procura-se dar sustento empírico à hipótese de que a cultura escolar se funda num imenso temor do nomadismo, da miscigenação, da fuga e da errância do pensamento.
Este artigo propõe uma excursão pela obra de Walter Benjamin na perspectiva do fragmentarismo construtivo que a caracteriza. Procura-se capturar os princípios metodológicos e epistemológicos que subjazem à prática historiográfica em Benjamin, no que ela contém de radicalmente experimental, articulando-os quer com a sua condição de existência como investigador-arquivista ou “escritor operante”, quer com o seu fatídico destino pessoal. Examina-se um método focado no particular, na descontinuidade e na concretude dos teores coisais; a criação de um saber histórico monadológico, reticular e constelacional, que arranca imagens do passado à sequência contínua da história universal; o confronto do artesanato benjaminiano com as exigências teóricas do materialismo dialéctico perfilhado pelos seus amigos e contemporâneos; a montagem de um inesgotável dispositivo intertextual e, por fim, a defesa da figura do autor-produtor, arauto de um tempo por vir onde o texto se tornaria um “bem comum”.
RESUMO O artigo identifica a emergência de diagnósticos e soluções em torno dos fins e dos meios do ensino da dança em Portugal, e que derivaram na defesa continuada de um Conservatório por vir. Concentra-se em dois momentos - o século XIX e a Primeira República - durante os quais se impôs um discurso em torno da antinomia aptidão natural vs. aprendizagem universal. Com os programas de dança teatral estatuídos em 1911, procura-se suspender esta dicotomia. Porém, estas formações discursivas continuaram a reconduzir os princípios da graça estética e do individualismo do génio, exponenciados pela perceção que então se cultivava da vanguarda estrangeira (Isadora Duncan e Ballets Russes).
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