<p><span> O artigo apresenta as primeiras elaborações de nossas observações e reflexões a partir das experiências provenientes do início da pesquisa “Etnografando Cuidados e Pensando Políticas de Saúde e Gestão de Serviços para Mulheres e Seus Filhos com Distúrbios Neurológicos Relacionados com Zika em Pernambuco, Brasil", que visa delinear diálogos que ocorrem entre pessoas inseridas, de um lado, em contextos de vida cotidiana dos/das cuidadores e cuidadoras de crianças com transtornos decorrentes do ZIKA e, de outro, em contextos de projetos e programas elaborados e executados por agentes do Estado e as políticas públicas que regem e articulam sistemas de atendimento, onde haja ações dirigidas a estes bebes e cuidadores. O que focamos no texto são as linhas tensoras que aparecem na mediação entre estes dois contextos a partir de duas associações de mães, nas quais estes temas subjazem o diálogo e se tornam visíveis em certos pontos de contato entre eles. Independente do grau de conflito ou de convergência entre os contextos dos programas e das famílias cuidadoras, as linhas tensoras não se desfazem, perdurando na convivência entre a vida cotidiana e a vida nas malhas de sistemas de atendimento.</span></p>
Com pesquisa de campo etnográfico, seguimos itinerários terapêuticos de cuidadoras de filhos com Síndrome Congênita do Zika para compreender como diferentes contextos (descoberta, casa, unidades de saúde, assistência social, associações) contribuem para formar noções sobre maternidade e infância. O conceito de “conjunturas vitais” em ritos de passagem geracionais singulariza experiências que levam a estabilizações e/ou caminhos invertidos na passagem entre etapas. A construção prática e simbólica de maternidade e infância oscila entre uma multiplicidade de significados marcados pela obrigatoriedade de mulheres se empenharem na tarefa de cuidar, vivendo sofrimento e sacralização do cuidado, numa realidade cotidiana que amarra suas vidas a buscas de explicações causais e respostas terapêuticas diversas sem mudanças geracionais marcadas. Quem trilha esses itinerários terapêuticos constrói uma imagem multifacetada de si mesma em relação, direta ou indiretamente, à maternidade, à infância e à filiação biológica e social.
Neste artigo discutimos as relações entre ciência/pesquisa e associativismo na Síndrome Congênita do Zika Vírus (SCZV). De início focamos no surgimento das principais associações de SCZV do Brasil e da Frente Nacional por Direitos da Pessoa com a Síndrome Congênita do Zika Vírus (FNDPSCZV). Em seguida debatemos sobre duas demandas da Frente: (1) as discussões sobre ética em pesquisa com seres humanos e a (2) pensão vitalícia para as crianças com SCZV e como este tema se relaciona com a pesquisa científica. Concluímos que as associações tem buscado relação mais horizontal com a ciência, ora denunciando sua falta de empatia e ética, ora fazendo uso dela. Para tanto, as associações têm buscado junto a comunidade científica espaços de diálogo no qual possam ser ouvidas e respeitadas quanto aos usos e resultados das pesquisas científicas em seus filhos através do lema “nada sobre nós sem nós”.
Este artigo analisa os impactos da COVID-19 na vida das mulheres e crianças atingidas pelo Zika. Embora a emergência em Zika tenha finalizado, estas mulheres precisam lidar com uma “eterna emergência” para garantir sua sobrevivência e dos filhos. A partir de relatos enviados pelas mulheres construímos um panorama sobre a situação destas e das crianças em tempos de COVID-19, aprofundando questões como a dificuldade em fazer isolamento; efeitos da suspensão das terapias de reabilitação nas crianças; e a morte de crianças. Destacamos ainda que a Antropologia contribui para entendermos que epidemias globais são vivenciadas distintamente por grupos específicos, como nas mulheres e seus filhos com Síndrome Congênita do Zika Vírus que foram expostos à ansiedade, angústia, incerteza, medo, empobrecimento, adoecimento e morte em duas epidemias em menos de cinco anos.
O nascimento de crianças com Síndrome Congênita do Zika vírus (SCZ), especialmente na região Nordeste, fez com que Pernambuco, o Brasil e a OMS decretassem emergência em saúde pública. Este artigo aborda sobre algumas das continuidades e descontinuidades percebidas em relação à assistência durante o estado de emergência em saúde pública e após a sua finalização, apreciando como a Secretaria Estadual de Saúde (SES) respondeu ao fim da epidemia e o peso social da doença para as mães, no processo de descoberta e tratamento da SCZ das crianças, comparando depoimentos e observações de profissionais e mães de crianças com SCZ, em Pernambuco, epicentro da epidemia. Integra a pesquisa antropológica ‘Etnografando cuidados’, iniciada em 2016. O primeiro e segundo itens refletem sobre as ações institucionais, principalmente da SES. O terceiro item enfatiza como as mães das crianças com SCZ percebem o que lhes chega pelos serviços públicos de assistência.
Germana Soares é mãe da Geovana e do Guilherme. Ele, o mais velho, tem a Síndrome Congênita do Zika Vírus, que muitos chamam de microcefalia, ou como algumas mães chamam, apenas “micro”. Em 2015, diante da Emergência em Saúde Pública decorrente da epidemia de Zika, Germana Soares se juntou com a mãe da Maria Giovanna, Gleyse Kelly, e fundaram a União Mãe de Anjos (UMA), uma associação que acolhe atualmente 409 famílias afetadas pela Síndrome Congênita do Zika em Pernambuco. Nesta edição, Germana Soares foi convidada pela Revista AntHropológicas para refletir sobre as temáticas do dossiê: gênero, cuidado e deficiência. Ela compartilha um pouco de sua experiência como mãe, como ativista e como cidadã.
A epidemia do Zika e sua relação com o nascimento de crianças com microcefalia trouxeram grandes desafios para a saúde pública mundial. No Brasil vários esforços foram feitos para minimizar suas consequências mobilizando setores importantes da saúde, da ciência, da indústria farmacêutica e da economia familiar. Este artigo pretende discutir a economia política do Zika focando nas relações estabelecidas entre Estado e cidadão no que se refere aos cuidados e atendimentos. Enfoca o contexto de vulnerabilidade das famílias afetadas num processo de sobreposição de desigualdades sociais e econômicas, em que as mulheres, mães e cuidadoras, carregam o maior peso social da epidemia.
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