Ganso é um termo informalmente adotado por membros da Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro (PMERJ) destinado a pessoas que apresentam alguma forma de envolvimento com drogas ilícitas. Neste artigo, analisaremos a adoção do termo para dois grupos distintos, o primeiro composto por indivíduos suspeitos de uso ou tráfico de drogas e o segundo por policiais usuários de drogas. Em ambos os grupos, o ganso representa um estigma, ou seja, um conjunto de comportamentos considerados deteriorados e reprováveis. Entretanto, há diferenças marcantes na gestão desse estigma a partir do grupo a que o termo se designa.
Este trabalho discute a hierarquia militar e a acadêmica a partir de experiências vivenciadas e observadas no âmbito do Curso de Tecnólogo em Segurança Pública e Social. A inserção de agentes de segurança pública na universidade, trouxe para o ambiente acadêmico, diversos conflitos decorrentes das socializações militar e universitária próprias da forma diferenciada de hierarquização dessas duas instituições.
Este trabalho apresenta um esforço no sentido de compreender as moralidades que estão envolvidas quando o policial militar aborda um usuário de drogas e não o conduz para a delegacia a fim de fazer o registro de ocorrência. Além disso, discute uma das técnicas de investigação, exercida pelos policiais militares, a utilização do “X-9”, visto como uma “relação de parceria” com os informantes. Após a implantação da lei 11.343/06 percebeu-se um maior número de registros nas delegacias em relação ao tráfico e uma redução no que tange aos registros de posse e uso, que caracterizam usuários. Contudo, a diminuição nos números de registros não significa dizer que as abordagens, aos usuários de drogas realizadas pelos policias militares tenham se reduzido, já que os procedimentos criminais continuam os mesmos. E a lei é a todo instante atualizada pelos operadores.
O presente trabalho busca compreender os critérios e moralidades presentes no exercício discricionário de policiais militares no que se refere à distinção de indivíduos enquanto usuários ou traficantes, quando do registro da ocorrência em sede policial. A investigação é construída a partir da observação direta (MALINOSKI, 1978) e participante (BECKER, 1993). Neste exercício são conjugadas a análise entre discursos e práticas dos agentes policiais, e da descrição densa (GEERTZ, 2008). Identifica-se a existência de uma interferência do policial militar condutor da ocorrência junto ao delegado. Tal artifício se faz presente tendo em vista a subjetividade da lei no que diz respeito aos critérios para o enquadramento entre posse e uso ou tráfico. É possível observar diferenças significativas nos critérios adotados por policiais militares na rotulação de determinado indivíduo enquanto traficante, quando contrastado aos critérios mobilizados por policiais civis e delegados de polícia. Nesse sentido, serão identificados e descritos os critérios presentes nos discursos dos interlocutores, no exercício da discricionariedade policial, a fim de melhor identificar nesses critérios quais moralidades são mobilizadas no momento do flagrante, bem como quais são os princípios formadores para condução ou não condução da ocorrência à delegacia.
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