: Este texto é uma reflexão sobre as semelhanças entre uptake e trace e a tradução considerada como acontecimento, ao mesmo tempo possível e impossível, que deflagra e constitui o significado através do jogo da linguagem que se estabelece entre os interlocutores sujeitos: texto-tradutor. Austin e Derrida põem em cena, cada um a seu modo, o significado enquanto um acontecimento da linguagem humana. O uptake, nas reflexões de Austin, garante que a linguagem humana aconteça, assegurada pelo reconhecimento entre os interlocutores e que assim, através da produção de significado, se realize. Para Derrida, através do jogo na linguagem humana, o trace deflagra o arrombamento do significado, destruindo a possibilidade de se atingir a sua origem. Discuto, inicialmente, as reflexões de Derrida que estão centralizadas diretamente na questão da performatividade para, em seguida, aproximar o uptake do trace e vice-versa; a partir dessa aproximação procurarei desvendar um pouco mais a tradução enquanto um acontecimento que contamina as línguas e é contaminado por elas.
1. Não falei de intraduzibilidade ou de idiomaticidade absolutas, mas de uma maior economia (tratava-se para mim de dizer em poucas palavras francesas, neste caso, nessa ocorrência, o que se pode traduzir, de todo jeito, em toda língua, com menos gastos); o que basta para mudar o sentido político [itálico de Derrida] deste gesto.2. Acredito que a afirmação irredutível e necessária de uma certa idiomaticidade, e de uma certa unicidade, como de uma certa unidade diferante [différante], isto é, impura -e eu queria demonstrá-lo na prática. O que fazemos em seguida, com esta afirmação e com esta impureza, é a própria política [itálico meu].3. digamos, enfim, que quis usar, outro gesto político [itálico meu], de meu próprio direito à ironia e, expondo-me assim na minha língua, dar um exemplo desta necessidade fatal, assim como de seus riscos.
Para prestar nossa homenagem ao colega John Schmitz, recentemente aposentado, nós, seus colegas de Departamento, escolhemos tratar das suas múltiplas entradas nos espaços da Lingüística Aplicada, tal qual ele as deixou registradas no seu Memorial, elaborado por ocasião de seu concurso para professor titular na Unicamp, realizado nos dias 18 e 19 de maio de 1998. Nascido em Nova York, "local onde várias culturas co-existem", cedo em sua vida acadêmica, já manifestou preferência pela diversidade e abertura a múltiplas perspectivas e interesses. Sua primeira escolha acadêmica, o estudo de espanhol, é por ele considerada, segundo relata no memorial, "como uma abertura para o mundo externo que realmente possibilitou confrontos e comparações" que atendiam a uma vontade própria de lidar com a diversidade: "Em nosso caso, essa mudança na leitura de mundos diferentes e a aceitação de outras "ideologias" ocorreram espontaneamente e plenamente de acordo com a nossa vontade".A atuação profissional de John Schmitz na área de línguas estrangeiras teve suas origens na sua aprendizagem de uma outra língua, nos seus questionamentos sobre o papel da linguagem na formação identitária. Como ele diz em seu Memorial 1 : O estudo de espanhol em nível de graduação nos marcou profundamente. Na realidade trocamos, no nível intelectual, Dickens por Galdós e Shakespeare por Calderón e num nível popular, Elvis Presley e os Beatles por pasodobles e boleros. Na verdade o estudo sério de uma língua estrangeira, 1 Todas as citações sem indicação de autor foram retiradas do Memorial.
A desconstrução proposta por Derrida nos permite ver a tradução como um acontecimento lingüistico singular. Esta dimensão enseja a reflexão sobre a diferença entre a chamada língua materna e a língua estrangeira. O pressuposto é que, com base nessa diferença, a língua do tradutor adquire um novo papel, como meio de transformação e produção de significado na língua para a qual se traduz. Esse acontecimento lingüístico cria um certo tipo de manifestação da tradução. Meu objetivo principal neste artigo é refletir sobre a relação existente entre as línguas envolvidas no processo de tradução através do <em>double bind</em>. O artigo analisa os prefácios, posfácios e notas de tradução de versões inglesas de alguns textos de Derrida a fim de verificar como os tradutores utilizam a desconstrução para explicar e justificar suas traduções. A hipótese desta reflexão é que entre a língua de Jacques Derrida — o francês — e a língua do tradutor — o inglês — há tradução recíproca.
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