Resumen Este artigo tem como objetivo discutir a complexificação do debate sobre ética na pesquisa no Brasil, principalmente a partir dos anos 1990. Para tanto, inicia fazendo uma breve contextualização sobre a bioética contemporânea e como seus códigos e princípios deram conteúdo e forma à metodologia do sistema CEP/CONEP. Na sequência, refletindo sobre a institucionalização nacional da regulamentação da ética em pesquisa, o artigo sugere que instrumentos, comitês e procedimentos de regulação não apenas avaliam eticamente pesquisas realizadas no Brasil, como configuram o sentido da "ética" a ser constituída e avaliada. Nesse sentido, o artigo recupera aspectos do debate desenvolvidos em publicações da área de antropologia social que colocam em evidência a necessidade de expandir os termos da configuração da "ética" e um trabalho para sua (re)politização.
Os conteúdos deste periódico de acesso aberto estão licenciados sob os termos da Licença Creative Commons Atribuição-UsoNãoComercial-ObrasDerivadasProibidas 3.0 Unported. Civitas Porto Alegre v. 13 n. 2 p. 309-325 maio-ago. 2013 Como a família funciona em políticas de intervenção social? How the family works in social intervention policy? Patrice Schuch* Resumo: Neste trabalho, desejo revisitar alguns dados de campo sobre duas de minhas pesquisas-sobre a reconfiguração do campo de intervenção ao adolescente infrator no Rio Grande do Sul e sobre as políticas de abrigo no município de Porto Alegre, RS-, para refletir sobre os modos em que a família funciona em políticas de intervenção social dirigidas à infância e juventude no Brasil. Meu intuito é compreender certos processos pelos quais a família não só aparece como um domínio fundamental de formação para o indivíduo adulto, mas também é, no contexto brasileiro, inserida em políticas mais amplas de reconstrução democrática. Tais políticas priorizam a descentralização das formas de intervenção, corresponsabilização de indivíduos e comunidades na sua execução e a construção da autonomia e do protagonismo dos sujeitos, com vistas a sua transformação em "sujeitos de direitos". Neste contexto, meu objetivo é dialogar com a literatura sobre o assunto, que destaca tanto a "reprivatização das questões políticas", quanto a expansão de uma racionalidade neoliberal nas práticas de governo contemporâneas, que investem na formação de competências e capacidades individuais para o autogoverno. Como tentarei mostrar, a atenção para os processos acima descritos, embora extremamente importante, não pode ofuscar um movimento paralelo: a compreensão da complexidade de dinâmicas, valores, agentes e interesses que coproduzem tais práticas de mudança nos modos de governo de indivíduos e populações.
No Brasil, os avanços da democracia pós-anos 1980 têm sido consideráveis no que diz respeito aos aparatos legais de proteção e promoção dos "direitos", o que acompanha o contexto global de difusão das reformas legais e da luta política através da linguagem dos "direitos". No campo da antropologia brasileira, a maior parte dos estudos vem discutindo as lutas por "direitos" que são realizadas por diversos grupos sociais -comunidades quilombolas, sociedades indígenas etc. -assim como os efeitos particulares e os resultados desse processo de mobilização 1 . O modo de engajamento e revitalização da memória e identidade dos grupos, assim como os efeitos particulares e os resultados desse processo original vêm contribuindo para uma maior visibilidade da agência dos "representados", colocando em risco interpretações que privilegiam poderes homogêneos das forças estatais frente à população.Menor atenção tem sido dada, entretanto, para os próprios processos de reforma legal nos seus âmbitos mais institucionais, deixando uma lacuna no estudo das problemáticas referentes a como, efetivamente, as novas idéias sobre os "direitos" são institucionalizadas e se tornam práticas efetivas no trabalho cotidiano de órgãos e agentes judiciais, revestindo-se de sentidos singulares. É verdade que temos uma rica tradição de estudos no campo do que se poderia chamar de "antropologia do direito" no Brasil, cujo foco dos trabalhos está constituído em torno da análise da cultura legal e da tradição jurídica brasileira. Os estudos de Kant de Lima (1989Lima ( , 1995Lima ( e 2003 e Cardoso de Oliveira (2002 e 2004) são significativos nesse sentido: o primeiro apontando a existência de um paradoxo legal brasileiro expresso na convivência pouco tranqüila entre uma ideologia igualitária e uma ordem social hierarquizada, e o segundo percebendo a existência de um déficit de cidadania no Brasil, caracterizado pela dificuldade em respeitar os direitos do indivíduo (o legal), parcialmente compensada pelo valor da manifestação da consideração à pessoa do interlocutor (o moral). A procura de uma particularidade brasileira, associada às singulares relações entre indivíduo e pessoa, tem marcado essas análises que desconstituem, ao seu modo, a idéia de um universo jurídico pautado unicamente em lógicas racionais formais.
Tecnologias de governo: apreciação e releituras em antropologia[Damiens fora condenado, a 2 de março de 1757], a pedir perdão publicamente diante da porta principal da Igreja de Paris, aonde devia ser levado e acompanhado numa carroça, nu, de camisola, carregando uma tocha de cera acesa de duas libras; em seguida, na dita carroça, na praça de Grè ve, e sobre um patíbulo que aí será́ erguido, atenazado nos mamilos, braços, coxas e barrigas das pernas, sua mão direita segurando a faca com que cometeu o dito parricí dio, queimada com fogo de enxofre, e às partes em que será́ atenazado se aplicarão chumbo derretido, óleo fervente, piche em fogo, cera e enxofre derretidos conjuntamente, e a seguir seu corpo será́ puxado e desmembrado por quatro cavalos e seus membros e corpo consumidos ao fogo, reduzidos a cinzas, e suas cinzas lançadas ao vento. Finalmente foi esquartejado [relata a Gazette d'Amsterdam]. Essa ultima operação foi muito longa, porque os cavalos utilizados não estavam afeitos à tração; de modo que, em vez de quatro, foi preciso colocar seis; e como isso não bastasse, foi necessário, para desmembrar as coxas do infeliz, cortar-lhe os nervos e retalhar-lhe as juntas. (Foucault, 1987, p. 9
Saberes, tecnologias e práticasChildhoods and children Knowledge, technologies and practices E ste dossiê procura dinamizar uma série de debates que reúne fundamentalmente dois campos de estudo interligados: a antropologia da criança e a antropologia da infância. Tais distinções entre estes espaços de elaboração reflexiva surgiram de forma a problematizar, de um lado, as experiências e a produção de sujeitos classificados como "crianças" e seus universos relacionais e, de outro lado, a constituição de um espaço múltiplo de autoridades e modos de gestão das "infâncias". Ao mesmo tempo em que a existência conceitual destas antropologias tem mobilizado renovados debates, as controvertidas especificações "das crianças" e/ou "das infâncias", provocam reflexividade sobre a contribuição da antropologia ao vasto campo de estudos da infância, e o lugar das crianças e das infâncias na tradição e práticas etnográficas contemporâneas. Nesta perspectiva, longe de querer reforçar a grande divisão etária adultos/crianças, os trabalhos aqui reunidos, interrogam sua relativa arbitrariedade e caráter político, indicando a relevância de abordagens relacionais "das infâncias" e das práticas coletivas das quais "as crianças" participam.A constituição da Modernidade conformou a hegemonia da associação entre a noção de "criança" e de "infância", tomada como uma fase da vida socialmente distinta e fundamentalmente associada à noção de desenvolvimento e incompletude. No entanto, estudos etnográficos -atentos à variabilidade de cenários e a diversidade das configurações e sentidos dados para a "criança" e para a "infância" -têm mostrado o quanto é possível haver diferentes dinâmicas de produção das crianças e de seu protagonismo, as quais não se circunscrevem à percepção da "infância" como incompletude e desenvolvimento. Pesquisas antropológicas em diferentes espaços de
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