este artigo tem como propósito situar alguns deslocamentos semânticos nos usos da noção de violência contra mulher, desde o início dos anos de 1980 no Brasil. Discussão intrincada pelas suas variadas vozes, vale enfrentá-la para a compreensão, de um lado, de alguns problemas envolvidos na distribuição de justiça e na consolidação dos direitos de cidadania na sociedade brasileira contemporânea. De outro lado, a partir do exame desses deslocamentos é possível empreender uma reflexão sobre os efeitos e os limites das articulações analíticas entre crime, violência e relações marcadas pelas diferenças de gênero.O ponto de partida dessa discussão é a aposta política que os movimentos sociais têm feito na revisão jurídica e nas instituições do sistema de justiça criminal como modo privilegiado de combate à violência. essa aposta dá um caráter específico ao que tem sido chamado de judicialização das relações sociais. tal expressão busca contemplar a crescente invasão do direito na organização da vida social. nas sociedades ocidentais contemporâneas, essa espécie de capilarização do direito não se limita à esfera propriamente política, mas tem alcançado a regulação da sociabilidade e das práticas sociais em esferas tidas, tradicionalmente,
Existe uma relação - a ser decifrada com cuidado e nuance - entre a violência de gênero e um conjunto de concepções e práticas relativas à sexualidade. Em particular, tal relação deve dizer respeito a algum aspecto que interconecta a prática sexual no interior de um campo simbólico particular - a uma "erótica" - no qual feminino e masculino, corpo jovem ou velho, asiático, branco, pardo, negro e o suporte de tais definições não estão colados necessária e exclusivamente a mulheres e homens, como sujeitos empíricos, supondo uma relação de força, de subjugo e de dor. O propósito deste artigo é analisar as conexões que foram sendo feitas entre essa configuração da violência e as teorias e práticas feministas relativas ao erotismo.
ResumoEste artigo examina as contribuições dos estudos antropológicos recentes feitos no Brasil sobre diferentes experiências envolvidas nos erotismos contemporâneos, sobretudo no que elas permitem decifrar articulações entre práticas sexuais, normas de gênero e limites da sexualidade (isto é, a zona fronteiriça onde habitam norma e transgressão, consentimento e abuso, prazer e dor). O balanço dessa bibliografia pretende lançar luz sobre as principais abordagens empregadas e, em particular, examinar como os prazeres e os perigos dos erotismos têm sido tratados a partir das problemáticas do consentimento, do contrato, da erotização dos corpos e, finalmente, dos riscos envolvidos nessas práticas.Palavras-chave: Erotismo, violência, gênero, sexualidade. * Recebido para publicação em 10 de fevereiro de 2014, aceito em 26 de maio de 2014.
As ideias deste artigo têm como propósito aprofundar a discussão sobre mercado erótico (produção, comercialização e consumo de bens eróticos) e pensar, de um lado, suas conexões mais gerais com o mercado, ou seja, com uma lógica cuja operação implica a produção de diferenças a partir da oferta de bens e serviços; de outro lado, analisar as articulações dessa oferta no registro dos produtos eróticos, partindo do suposto de que os objetos buscados e valorizados seriam os que justamente realçam a diferença e a transgressão. Ao lado da discussão teórica, o artigo traz uma etnografia dos sex shops na cidade de São Paulo. Na direção inversa das visões que tendem a tomar o mercado ora como mero reflexo de demandas sociais ora como força manipuladora diante da qual o consumidor é passivo, assiste-se a criação de nichos de sex shops que configuram um processo de constituição de novas posições diante da sexualidade, ampliando o escopo de escolhas e práticas sexuais, sobretudo, para as mulheres.
Maria Filomena Gregori recorre às suas memórias para nos contar sobre o efeito acadêmico e político dos coletivos feministas na Universidade e sobre a forma como mudanças teórico-epistemológicas e nas sensibilidades morais e políticas impactaram o campo de estudos sobre violência e gênero ao longo dos anos. Sendo assim, ela inicia pontuando como a temática da chamada violência contra a mulher reuniu e impulsionou o debate conceitual e político do feminismo no Brasil no último quarto do século passado para posteriormente nos apresentar suas mais recentes reflexões em torno do que ela chama “limites da sexualidade”, isto é, uma tensa zona entre prazer e perigo que marca o exercício da sexualidade e as práticas eróticas. Nessa profusão de memórias afetivas, intelectuais e políticas, ocupam lugar de destaque as pesquisas de Mariza Corrêa – especialmente sua dissertação de mestrado, que se tornaria o livro Morte em Família. Para ela, Mariza Corrêa não apenas demonstrou a importância de se prestar atenção às narrativas – às “fabulações” – que marcam os processos judiciais, como também forneceu elementos para discussões mais amplas a respeito das violências marcadas por gênero, a exemplo dos debates sobre vitimização. Nesse sentido, Gregori lembra os esforços de autoras como Mariza Corrêa e ela própria em demonstrar os riscos implicados em perspectivas que, ao vitimizarem a mulher reduzindo o fenômeno exclusivamente a uma assimetria ancorada em sexo/gênero, acabam por retirar-lhe a capacidade de agência e desconsideram os complexos arranjos formados por marcadores sociais variados e pela dimensão vivencial dos sujeitos em relação.
This article examines conceptualisations of violence against women developed in Brazilian feminism, and in legal and institutional measures against violence, from the 1980s to the present. Based on ethnographic studies carried out at the Women's Police Stations and Special Criminal Courts, and the controversies surrounding the 2006 Brazilian Law on domestic and familial violence, the authors map the meanings of expressions such as 'violence against women', 'marital violence', 'domestic violence', 'family violence' and 'gender violence'. The article reveals that the discourse that transforms violence into crime, in the Brazilian context, leads to semantic and institutional developments that replace an interest in politicising justice for the defence of women with the judicialisation of family relations.
O capítulo se refere a um artigo publicado na Vibrant em 2010. Maria Filomena Gregori analisa diferentes enfoques conceituais, no Brasil, em torno das violências em relações interpessoais. Assim, ela revisita sua trajetória de pesquisa e percorre tanto as transformações legislativas ao longo dos anos desde a criação das delegacias especializadas quanto as categorias formuladas para designar o fenômeno em questão. Violência contra a mulher, violência doméstica, violência conjugal, violência familiar, violência de gênero: cada termo se associa a um determinado conjunto de pressupostos conceituais e políticos, com rendimentos analíticos distintos, limitações específicas e dilemas próprios. Em outras palavras, Gregori pensa as reconfigurações e as implicações semânti-cas do fenômeno da violência de gênero com relação às suas aplicações, às práticas de intervenção e aos seus efeitos em um campo de permanentes disputas de sentido – da criminalização à reprivatização e de volta à atenção pública; da apreciação pessoal de agentes da polícia à tipificação penal; do foco na família ao foco nas assimetrias de gênero; da circunscrição ao espaço doméstico à ampliação a modalidades variadas de abuso e de violação. Como cenário para esses desafios e paradoxos, lembra, figura um Estado controverso, em que a desigualdade no acesso à justiça persiste e se reproduz a despeito de um conjunto sofisticado de normativas, de maneira que, mesmo assegurados pela lei, os direitos nem sempre são contemplados no exercício da cidadania. Consequentemente, nas palavras da autora, “a ideia de uma justiça igualitária baseada em princípios ou valores universais oculta, na verdade, as desigualdades que a Justiça produz, aquilo (e aqueles) que ela exclui ou ainda os que nem considera”.
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