Ao que parece, o ensaísta francês Roland Barthes está de volta. De fato, é difícil dizer se, desde meados da década de 1950, houve algum momento em que Barthes esteve ausente, especialmente para os estudos literários. De qualquer modo, é notável que, a partir de 2002, circunstâncias, a princípio, editoriais o tenham trazido de volta. Na França, há, de um lado, a reedição, corrigida e aumentada, de suas obras completas; de outro, a publicação das inéditas anotações dos cursos que Barthes ministrou, entre 1977 e 1980, no Collège de France. Acrescente-se ainda, sobretudo na França e nos Estados Unidos, a reedição de alguns estudos críticos dedicados à sua obra ou à publicação de inéditos afins. No Brasil, a partir dessa mesma época, têm surgido colóquios dedicados a Barthes, reedições de seus livros em novas traduções ou publicações inéditas, além de alguns estudos críticos. Tudo isso ou incita à retomada do trabalho de Barthes, ou este é por tal retomada incitado.E quem está em voga em tal retomada é "um sujeito incerto, do qual cada atributo é, de algum modo, combatido por seu contrário" *1 . Não por acaso, alguns dos adjetivos que costumam caracterizar sua trajetória intelectual são: antagônico, infiel, contraditório, paradoxal. Ainda que muitos sejam os desvios aí traçados, um deles, particularmente, sobressai-se, seja por sua evidência e difusão, seja porque, a partir dele, os demais podem ganhar contornos mais nítidos. Trata-se da relação de Barthes com a semiologia, isto é, com a ciência que, baseada na lingüística estrutural, pretende sistematizar con-* "un sujet incertain, dans lequel chaque attribut est en qualque sorte combattu par son contraire" (Barthes, Roland. "Leçon". Em: OEuvres complètes, t. V. 2ª. ed. Paris: Seuil, 2002: 429.) 1 Todas as citações de Barthes utilizadas neste artigo pertencem a essa segunda edição de suas obras completas. Daqui por diante, as referências serão fornecidas por meio de algarismos romanos, indicativos do tomo (de I até V), e de algarismos arábicos, indicativos das páginas, ambos antecedidos pelo título, entre aspas, da publicação a que se referem. As traduções para a língua portuguesa, fornecidas no corpo do texto, são de minha autoria.
Um dos traços mais característicos do trabalho do ensaísta francês Roland Barthes (1915Barthes ( -1980 é, certamente, a diversidade, seja dos objetos de leitura aos quais se atém, seja dos discursos crítico-teóricos dos quais se apropria. No primeiro caso, a despeito da notável preferência por questões relativas à literatura, Barthes se dedica, também, à cultura de massa e ao cotidiano contemporâneos (publicidade, imprensa marrom, moda, gastronomia etc.), à música, ao cinema, ao teatro, à fotografia etc. Quanto aos discursos crítico-teóricos, Barthes pratica uma conjunção, bastante particular e variável, entre Linguística Estrutural, Psicanálise e Ciências Sociais. Particular e variável porque o ensaísta se apropria de conceitos oriundos destes campos na medida mesma em que os desvia de seus fins primeiros, em que refrata seu caráter instrumental. Com efeito, estes conceitos deixam de corresponder a um saber institucionalizado, que se prestaria ao embasamento e à legitimação da reflexão, tornando-se, antes, elementos de uma articulação norteada menos pela interdisciplinaridade e mais pela indisciplina, condizentes com uma lógica centrada menos na causalidade ou teleologia e mais na contiguidade metonímica e na permutação metafórica. E essas idiossincrasias mais e mais se adensam
RESUMO. A partir de alguns trabalhos de Julia Kristeva (Introdução à Semanálise e A Revolução da Linguagem Poética) e, principalmente, de Roland Barthes (O Rumor da Língua, Teoria do Texto e O Prazer do Texto), este artigo desenvolve uma reflexão sobre as noções de texto e de intertextualidade. Ao enfatizar a problemática da leitura engendrada por essas noções, esta reflexão leva ao redimensionamento da atividade crítico-teórica (em vez de sondagem do texto, ela se revela, igualmente, um texto). Uma das facetas desse redimensionamento desenvolvidas neste artigo é a diferenciação entre duas noções de interação textual que, apesar de distintas, são, não raro, tratadas como se fossem similares: intertextualidade e paródia. . Emphasizing the role of reading according to these notions, this reflection allows the reconsideration of criticism and theorization (instead of investigation of text, they are, also, texts). One possibility engendered by this reconsideration and which is developed in this paper is the distinction between two ways of textual interaction, which, in spite of many differences, are commonly considered similar: intertextuality and parody.Key words: intertextuality, Julia Kristeva, parody, reading, Roland Barthes, text. Introdução à noção de textoO que é um texto? Onde ele começa e onde termina? Milhares de páginas foram escritas na tentativa de responder a essas questões, e, provavelmente, tantas outras o serão. Em que pese tal dimensão do problema, é notável que, atualmente, nas mais diversas áreas, há uma forte tendência a conceber o texto não mais como sendo restrito a um, por assim dizer, sistema semiótico particular, mas como algo comum a todo e qualquer sistema, bem como às diversas práticas que promovem o entrecruzamento entre diferentes sistemas. Por esse viés, uma poesia, um filme, um quarteto de cordas, uma partida de futebol: tudo é texto.Essa expansão da noção de texto se deve, principalmente, à utilização do conceito de signo, tal como foi (re)pensado, no século XX, pela Lingüística, pela Semiologia e pela Semiótica. É por isso que Umberto Eco, por exemplo, diz que "em um sistema semiótico bem organizado [isto é, um sistema dotado de sólidas convenções de ordem sintática, semântica e pragmática], um signo já é um texto virtual" (Eco, 1984:04, colchetes nossos), deixando claro o vínculo entre texto e signo: aquele deve ser visto com base neste.Aquilo que, aqui, compreendemos por texto está bastante próximo disso, excetuando dois aspectos: a organização do sistema semiótico e o conceito de signo.O primeiro é de simples revisão: para que algo possa ser um texto, não é necessário que seja considerado integrante de um sistema semiótico bem organizado. É possível rebater essa observação dizendo que, se algo é um texto, é porque integra um sistema organizado. Embora isso até possa ser pertinente, na maioria dos casos, um texto que, por ventura, não integre um sistema organizado tem essa sua condição obliterada à medida que é submetido a outro sistema, já organizado. Bastam, aqui, duas pergunta...
Marcio Renato Pinheiro da SILVA CAPES/ UNESP de São José do Rio PretoPalavras-chave: conto brasileiro contemporâneo; Dalton Trevisan; relato jurídico-policial; intertextualidade; semiótica.Resumo: Com base na teoria semiótica, pretende-se analisar a intertextualidade entre o conto Debaixo da Ponte Preta, de Dalton Trevisan, e o relato jurídico-policial, especialmente, a maneira como o conto de Trevisan desloca a vontade de verdade inerente ao relato e os interesses de cada depoente, ressaltando, dentre outras coisas, o papel do texto policial como cúmplice da opressão.Abstract: Based on semiotic theory, this paper intends to analyze the intertextuality between the short story Debaixo da Ponte Preta (Down the Black Bridge), by Dalton Trevisan, and the policial report, mainly, the way how Trevisan's short story displaces the will of truth inherent in the policial report and each deponents' interest, emphasizing, among other things, the role of the policial text as accomplice of oppression.Resumen: Con base en la teoría semiótica, intentase analizar la intertextualidad entre el cuento Debaixo da Ponte Preta (Debajo de la Puente Negra), de Dalton Trevisan, y el relato policial, especialmente, la manera como el cuento de Trevisan disloca la voluntad de verdad inherente al relato e los intereses de cada deponente, resaltando, entre otras cosas, el papel del texto policial como cómplice de la opresión. SIGNUM: Estud. Ling., Londrina, n. 5, p. 275-285, dez. 2002
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