Nosso objetivo é traçar a história da circulação da literatura italiana traduzida no Brasil no século XX e na primeira década do século XXI, apontando para obras, autores, momentos, episódios em seu contexto de partida, mas sobretudo de chegada: ou seja, em suas relações com o ambiente em que surgiram, mas sobretudo com o ambiente que os acolhe. Nosso ponto de partida é a ideia de que o meio privilegiado com que um país dá as boas-vindas a uma obra é a tradução. Refletir sobre as traduções em seu contexto de chegada significa também refletir sobre este mesmo contexto, isto é, sobre o sistema literário nacional. Entendemos que as literaturas traduzidas, concebidas como sistemas literários especiais dentro dos polissistemas constituídos pelas literaturas nacionais (conforme a definição de Even-Zohar), sofrem condicionamentos peculiares, de acordo com os diversos momentos atravessados pelos países que as recebem. Para a otimização do levantamento de dados, será dada continuidade ao Dicionário Bibliográfico da Literatura Italiana Traduzida, que já se encontra on-line: www.dlit.ufsc.br e www. usp.br/dlit. Nesta fase o projeto conta com a colaboração da equipe da área de Biblioteconomia ECA-USP, responsável pela revisão dos verbetes já publicados e pela formulação de novos critérios de catalogação dos títulos do dicionário. Nosso objetivo, após o levantamento dos títulos traduzidos e tendo formado um quadro da presença e da importância das várias editoras ativas no mercado da literatura italiana traduzida, será observar, na área da recepção brasileira da literatura italiana a partir de 1900, os movimentos das ideias e as transformações no ambiente de chegada.
Já foi muito comentada no Brasil a presença do poeta italiano Giuseppe Ungaretti, que viveu no país de 1937 a 1942, como professor da recém-fundada Universidade de São Paulo. Suas relações com os poetas da vanguarda brasileira que ele conheceu em São Paulo no final dos anos 1930 e com os artistas das vanguardas francesas, que encontrara em Paris nos anos 1920, constituem um intrincado e rico campo de associações, assonâncias e dissonâncias. A poesia de Ungaretti nasce entre as influências parisienses e as do contemporâneo futurismo italiano; analogamente, há sólidos vínculos entre a arte e a cultura brasileiras e esses mesmos movimentos. Na França e no Brasil se encontram, em momentos diferentes, Ungaretti e Blaise Cendrars; Oswald de Andrade, Tarsila do Amaral e Cendrars; Ungaretti, Oswald e Haroldo de Campos. O próprio Haroldo de Campos escreve estudos fundamentais para a interpretação da obra de Oswald de Andrade e traduz e comenta a poesia de Ungaretti. Destaco, nesse campo de relações ítalo-franco-brasileiras, alguns temas comuns, enriquecidos pelas frequentações recíprocas desses poetas e artistas: as relações vanguardas e primitivismo, o contraste velho/novo, a ideia do Brasil.
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