P ara Lili Elbe, 1 nascida Einar Wegener e personagem principal do longa A garota dinamarquesa (The Danish Girl, 2015), dirigido por Tom Hooper, sentir-se mulher foi o essencial para iniciar o incômodo que ela categorizava como discordância entre sua mente e seu corpo. O filme, por meio de uma cadência suave, desenrola o processo de transição entre o promissor talento das artes, Einer, e a tímida Lili Elbe.Baseada no diário de Lili -originalmente publicado em 1933 com o título Man into woman -, a produção cinematográfica revela que processos patologizantes foram a resposta de diferentes campos da medicina para sua identidade de gênero. A crença na medicina como um campo que possibilitaria alívio para seus sofrimentos levou Lili e sua companheira, a artista plástica Gerda Wegener, a procurar seus recursos terapêuticos.O filme narra que as visitas de Lili a especialistas em Copenhagen resultaram, a princípio, na prescrição do uso de radiação em sua região genital, com o fim de readequá-la a sua condição biológica. O médico que trata Lili reforça sua confiabilidade ao afirmar: "Sou um especialista." Sua explicação para as dores, o "estado confuso de masculinidade" e a "infertilidade" de Lili -pressuposta por ela e Gerda não terem tido filhos -era a de que seriam provocados por um desequilíbrio químico. O tratamento por radiologia rende ao filme a primeira de muitas cenas que ainda se seguirão ambientadas em consultórios médicos: debilitada ao fim do procedimento, a personagem diz a seu médico: "Você machucou Lili."
De autoria da professora doutora Cassia Roth, vinculada à Universidade da Georgia, nos Estados Unidos, a obra A miscarriage of justice: women's reproductive lives and the law in early twentieth-century Brazil, publicada em 2020, aborda a tutela reprodutiva de mulheres pelo Estado, na primeira metade do século XX, na então capital federal, Rio de Janeiro. Ao longo de sete capítulos, Roth contribui para os estudos da história da saúde reprodutiva no Brasil e, a partir de uma produção multifacetada, oferece um diálogo interdisciplinar entre medicina, justiça, polícia e sociedade na prescrição de um modelo do exercício maternal.Sustentada por uma análise criteriosa dos Códigos Penais e Civil, a obra inicia o argumento de que, durante a Primeira República e o período Vargas, a cidadania feminina só poderia ser exercida pela maternidade. A utilidade da mulher das classes pobres e urbanas seria a de reproduzir a mão de obra para o futuro da pátria. O funcionamento desse modelo se pautava em médicos, formados no bojo de instituições organizadas, que concediam explicações técnicas para o reforço do papel maternal, e juristas, que por meio das leis afirmavam a criminalização de práticas de controle de fertilidade e deram base para ações policiais atentas aos usos da sexualidade.O que Roth (2020) propõe, entretanto, não é exatamente um livro apenas sobre o poder dessas instâncias. A autora apresenta o funcionamento de uma complexa engrenagem de vigilância sobre a reprodução nas classes populares e proporciona uma valiosa contribuição à historiografia da área, por realizar uma análise que leva em conta os aspectos cotidianos das práticas de aborto e infanticídio, como também analisa as gravidezes e os partos, eventos justapostos da realidade de mulheres do passado. Ao buscar uma análise mais abrangente das vivências reprodutivas A miscarriage of justice oferece à história da reprodução
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