Ao considerar como premissa a relação existente entre literatura e história, necessariamente enfatizamos o diálogo entre ambas, no qual elementos extraestéticos constituintes do meio ideológico que circunda o escritor em dado momento são transmutados no ato estético para o interior do plano narrativo, por meio das operações de reflexo e de refração, passando por uma avaliação axiológica e desempenhando uma determinada função estética e, em retorno, uma dialogicidade com o contexto material. É com esse entendimento que propomos uma análise do conto Feliz Ano Novo, de Rubem Fonseca, que foi censurado pela Ditadura Civil-Militar em 1975. O objetivo consiste em construir, com o recurso de conceitos do Círculo de Bakhtin e das leis sobre censura da época, uma explicação dos motivos que podem ter levado ao corte da narrativa, salientando-se o matiz explicativo, mas não justificativo. Entendemos que esse estudo contribui para a compreensão da ideologia da Ditadura Civil-Militar e do contraponto simbólico efetuado no fazer artístico de Rubem Fonseca. Além disso, ao estudarmos a especificidade do literário em consonância com outros ramos do saber, como a história, a ciência política e a jurídica, inscrevemos nosso trabalho no âmbito maior dos estudos comparados em literatura, sempre tendo no horizonte como paradigma o diálogo nas relações do fazer humano.
Ao reconhecer a dialética e o humanismo como princípios de construção estética em José Saramago, propomos um estudo da categoria narrativa da personagem na obra do autor, com o objetivo de explicitar seu funcionamento e seu acabamento axiológico. Partiremos do paradigma de que a explicação do literário – aqui em relação à personagem – necessita partir do interior do universo ficcional, isto é, a função que exerce na estrutura da obra. Com esse paradigma de investigação, advogaremos em defesa do funcionamento dialético da personagem; da sua constituição dialógica, intimamente relacionada a sua dialeticidade; e da articulação da vida da personagem quanto ao eixo semântico humanista-democrático, todos esses três elementos inter-relacionados de modo a construir uma certa cosmovisão de vida, de Homem. Para tornar o argumento mais sólido, recorreremos a alguns pressupostos de análise da personagem já tradicionais, como as propostas de Hamon, de Forster e de Bakhtin. *** The character in José Saramago: dialectic and humanism ***In recognizing the dialectic and humanism as principles of aesthetic construction of José Saramago, we propose a study of the narrative category of the character in the author’s work, with the purpose of explaining its functioning and its axiological finishing. We will start from the paradigm that the explanation of the literary – here in relation to the character – needs to start from the interior of the fictional universe, that is, the function that it exerts in the structure of the work. With this paradigm of investigation, we will advocate in defense of the dialectical functioning of the character; of its dialogical constitution, closely related to its dialectic; And of the articulation of the life of the person in relation to the humanist-democratic semantic axis, all three interrelated elements in order to construct a certain worldview of life, of Man. To make the argument more solid, we will resort to some of the traditional assumptions of character analysis, such as the proposals of Hamon, Forster and Bakhtin.Keywords: Character; Dialectic; Humanism.
. Pesquisadora 1D do CNPq e professora titular da UFSM.RESUMO: Os estudos acerca da obra de José Saramago caracterizam--se pela predominância de temas ligados ao humanismo, à democracia, à solidariedade, à exploração socioeconômica, entre outros. Igualmente, a posição do autor enquanto cidadão, que reiteradamente critica a imposição de interesses mercantis sobre a política, deturpando a democracia vigente na maior parte dos países da atualidade, também figura em diversas análises. Tomando tais características como base, pontuamos a necessidade de se reconhecer a democracia em José Saramago em um nível formal, mais precisamente na estrutura romanesca (aqui delimitada ao plano das ações). Argumentaremos que a estrutura do romance saramaguiano é dialética, viabilizando a realização plena do conteúdo democrático sem recair no ufanismo absoluto. Com uma análise de Ensaio sobre a lucidez, pretendemos objetivar a abstrata estrutura dialética para, então, sugerir uma qualificação para a estética saramaguiana: uma estética democrática. PALAVRAS-CHAVE: Romance; José Saramago; democracia; dialéti-ca; estética.ABSTRACT: The studies about José Saramago's oeuvre are characterized by the predominance of themes related to humanism, democracy, solidarity, economic exploitation, among others. Equally, the position of the author as a citizen, which presents reiterated criticism of the imposition of mercantile interests over politics, harming current democracy in the majority of the countries, also appears in several analyses. Having such characteristics as a basis, we point out the need for recognizing democracy in José Saramago in a formal level, more precisely in the romanesque structure (here delimited to the actions plan). We argue that the novel structure of Saramago is dialectical, enabling the complete realization of the democratic content without reflecting in absolute boastfulness. By means of an analysis of Seeing, we intend to objectify the abstract dialectical structure in order to, then, suggest a qualification for Saramago's aesthetics: democratic aesthetics.
Na Literatura, o uso do procedimento irônico coaduna-se a uma estratégia de compreensão e representação do mundo concreto, geralmente com efeitos humorísticos. No entanto, a ironia não é necessariamente restrita ao humor, reduzida ao riso descompromissado, ao contrário, pode constituir-se em importante expediente de crítica. Dessa forma, escapando ao índice reducionista, típico de determinadas posições estéticas do pós-modernismo, a ironia pode ocupar um locus de resistência e subversão dos valores monolíticos de dominação e exploração. Nesse sentido, a ironia na obra romanesca de José Saramago assume a marca de um procedimento literário que colabora para a efetivação de um conteúdo de crítica social, notadamente humanista e democrático, no interior do universo ficcional e em relação com a realidade concreta. Objetiva-se uma análise da forma da ironia saramaguiana, enquanto parte de um todo estruturado, e que funciona, pelo movimento dialógico e dialético, de maneira a desvelar as aparências, contribuindo decisivamente para efetivação do conteúdo axiológico das narrativas.
Svetlana Aleksiévitch tem se destacado, mundialmente, pela composição de obras que se distanciam dos paradigmas tradicionais de representação literária por meio do recurso expressivo de exposição de vozes que pleiteiam a condição de testemunhas de um evento traumático. De fato, é pela revelação de vários relatos pessoais, em uma oralidade intensa, que as testemunhas se convertem em personagens e narradoras de um mosaico polifônico, no qual cada fragmento representa uma voz que tenta não ser esquecida, conferindo o tom memorialista às narrativas. Diante disso, propomos uma análise de O fim do homem soviético em termos formais e de conteúdo, sobremodo a partir de teóricos como Bakhtin e Benjamin, de maneira a nos aproximarmos das posições axiológicas contidas na obra. A partir dos resultados obtidos, avaliamos que as estratégias literárias empreendidas pela autora potencializam a complexidade histórica relativa ao desmembramento da União Soviética, alargando, pelos caminhos do testemunho e da memória, os limites da própria literatura.
As temáticas deste dossiê estão ancoradas em uma perspectiva geral da pertinácia dos estudos literários de crítica social, porém com paradigmas de análise específicos. Assim, os dezenove artigos que compõem esse dossiê representam essa diversidade.
A novela O gato e a revolução, de Alcy Cheuiche, foi publicada em 1967 e, já no ano seguinte, depois de instituído o AI5, foi censurada e impedida de chegar aos leitores. Este trabalho pretende apresentar uma reflexão crítica sobre as funções sociais desempenhadas pelas diversas personagens na novela, destacando dois discursos notadamente perceptíveis no contexto de produção da obra e estetizados por meio dos enfrentamentos ideológicos apresentados nos diálogos da narrativa: a) o discurso comunista e b) o discurso reacionário. Para lograrmos êxito na nossa pesquisa, utilizamos uma abordagem metodológica que principiou pela fortuna crítica acerca do conceito de ideologia proposto por Eagleton em Marxismo e crítica literária e com o aporte teórico que considerou o modelo de análise literária proposta por Antonio Candido, na obra Literatura e Sociedade.
<p>Argumentaremos, neste trabalho, que uma forma narrativa de matiz realista ainda pode ser profícua na expressão de conteúdos traumáticos, a exemplo da violência. Nesse sentido, entendemos que uma forma de narrar desprovida de significativo experimentalismo, como os contos <em>Feliz ano novo</em> e <em>Passeio noturno</em> (Partes 1 e 2), de Rubem Fonseca, pode desvelar uma essência <em>de realibus ad realiora</em>, do real ao mais real. Sendo tal argumento legítimo, a violência na obra do escritor aponta para uma posição axiológica de crítica social.</p>
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