O que não aparece nunca, ausência como um padrão no pensamento desses filósofos primeiros, é o modo de adoecimento da alma, com eles partindo sempre da situação dada, do doente. E o mesmo se passa com Epicuro.Ainda que Epicuro não faça uso do termo pathos, ele fala sempre em mal ou bem, de modo genérico, ou se refere à alma já sã ou equilibrada, o que pede outros termos, psiqué igiainon 47 e psiqué ataraxian 48 ; a mecânica de adoecimento das almas não é narrada, não se diz como uma alma fica doente, o que seria um modo eficiente de prever e evitar a contaminação de outras almas.Em sua defesa, os filósofos diriam que basta praticar os seus preceitos para que as doenças anímicas sejam evitadas. Contudo, conhecer o modo de atuação dos agentes patológicos tornaria o problema mais claro. Então eles contra-argumentariam que estão implícitos em seus princípios de cura os princípios de ação da doença. Sendo assim, examinemos esses princípios, os de Epicuro, especificamente para o caso. O tetraphármakos prescreve ter sobre os deuses opiniões piedosas, aprender que não se deve temer a morte, saber que o bem é fácil de alcançar e possuir a ciência de que as coisas ruins são breves no tempo ou toleráveis na intensidade. Tais formulações carregam em seu seio o próprio elemento original? De acordo com essa hipótese, os homens do tempo de Epicuro tinham opiniões cruéis sobre os deuses, temiam a morte, desconheciam que o bem estava ao alcance das mãos e o procuravam longe de si mesmos e ignoravam que o mal tem duração breve ou tolerável. De fato, temos aí uma boa pista para saber de que forma Epicuro representava o pensamento comum ao seu tempo. E ao nos aprofundarmos na leitura da Carta, informações complementares a essas aparecem, mas nada que as negue. Por exemplo, Epicuro nos deixa saber que havia determinadas pessoas, filósofos, chamados de físicos ou filósofos da natureza, que pensavam uma necessidade inflexível para ela, ou seja, tudo seria determinado, coisa com a qual ele não concorda 49 . E aqui certamente temos uma crítica velada a Demócrito e seus seguidores, cujo atomismo preconizava que a disposição das partículas no universo seria regrada absolutamente pela natureza. Isto é, não haveria como escapar ao destino que Deus teria traçado aos homens. Embora os deuses de Epicuro sejam realmente surdos aos apelos humanos, isso não quer dizer que os homens não possam mudar o seu destino, portanto, está errado, sob seu ponto de vista, achar que os homens não gozam de nenhuma liberdade. Porque os eventos no universo possuem três causas, o destino ou a ação dos deuses ou natureza, o acaso e a ação voluntária dos homens 50 . Quanto ao bem, Epicuro proclama a valorização da independência individual, quer dizer, quanto menos o indivíduo precisar de coisas exteriores a si mesmo para a felicidade, mais facilmente ele a alcançará. Quem se contenta com pouco, melhor desfruta da abundância se ela ocorrer, não sofre se ela não acontecer e, por outro lado, tudo o que é natural é fácil de conseguir, ao passo que o vão é difícil de alca...
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