Desde a campanha presidencial de 2018, Jair Bolsonaro anunciava para diversos públicos que, se eleito, não demarcaria mais um centímetro de terra indígena. Ao iniciar seu mandato, em 2019, buscou colocar em prática uma nova relação entre o Estado e os povos indígenas, atingindo principalmente o núcleo duro da política indigenista brasileira: a Fundação Nacional do Índio (Funai)[1]. Nesse contexto, este artigo visa a analisar as políticas executadas pela Funai entre 2019 e 2022 à luz da legislação nacional e internacional, baseando-se, para tanto, no estudo sistemático de matérias jornalísticas, de instrumentos normativos infralegais, de manifestações dos povos indígenas e no estudo de caso sobre as ações da Funai em uma ação judicial específica. A atuação da entidade indigenista sob Bolsonaro configura um tipo de violência institucional, ainda não definido em lei; um tipo mais direto, uma vez que, nesse caso, a missão institucional do órgão passa a ser invertida. É a “cupinização” que corrói por dentro as estruturas, os aparatos, os procedimentos, as normas, as rotinas institucionais, tornando a Funai não apenas uma instância obsoleta e ineficiente em termos de execução, mas, ao contrário, uma instituição extremamente eficiente no seu novo mister: favorecer grupos contrários aos interesses dos povos indígenas.
[1] Utilizamos, aqui, a nomenclatura anterior da atual Fundação Nacional dos Povos Indígenas, já que estamos retratando um período histórico específico (entre 2019 e 2022).