IntroduçãoNo transcorrer dos últimos cem anos, os países industrializados, pólos centrais da economia mundial, observaram uma profunda transformação em seu perfil epidemiológico, caracterizada pela gradual e progressiva queda das doenças infecciosas e parasitárias e pela ascensão das doenças crônico-degenerativas e, particularmente, das doenças cardiovasculares, como principal causa de morte.Os países chamados 'em desenvolvimento', situados na periferia do sistema econômico mundial, sofreram, também, nos últimos 30 a 40 anos, uma transformação em seus perfis de morbidade e de mortalidade semelhante, porém não idêntica, àquela verificada nos países centrais.No Brasil, essas transformações tornaram-se evidentes a partir de 1960 e se acentuaram progressivamente de modo que, ao chegar à década dos noventa, o país apresentava um perfil epidemiológico polarizado, cujas causas e consequências para a atual política de saúde devem ser analisadas.
A transição epidemiológica nos países desenvolvidosA gradual e progressiva melhora nos níveis de saúde dos países do hemisfério norte se acentuou a partir das transformações sociais associadas à revolução industrial, que resultaram em mudanças sensíveis na disponibilidade de alimentos, nas condições de moradia e em medidas de saneamento básico. As alterações nos padrões de morbidade e mortalidade desses países correspondem a uma fase mais recente de um processo histórico secular, ao qual Omram, em 1971, denominou de 'transição epidemiológica'. 1 Segundo a teoria de OMRAM, a humanidade teria atravessado três fases epidemiológicas ao longo da sua história: a) A 'Era da Fome das Pestilências', que durou desde o início dos tempos históricos até o fim da Idade Média, foi caracterizada por altos índices de natalidade, altas taxas de mortalidade por doenças infecciosas endêmicas e epidemias que assumiam, com frequência, caráter pandêmico, devastando as populações. Nessa fase, a expectativa de vida estava em torno de 20 anos e o crescimento demográfico foi lento. b) A 'Era do Declínio das Pandemias', correspondendo historicamente ao período que vai da Renascença até o início da Revolução Industrial, foi caracterizada pelo progressivo desaparecimento das grandes pandemias, embora as doenças infecciosas continuassem a ser a principal causa de morte. Nesse período verificou-se uma gradual melhora no padrão de vida e a expectativa de vida alcançou os 40 anos. Como as taxas de mortalidade declinaram até níveis de 30 por 1000 e a natalidade continuava acima de 40 por 1000, iniciou-se um longo período de crescimento populacional. c) A 'Era das Doenças Degenerativas e das Causadas pelo Homem' estende-se da Revolução Industrial até os tempos modernos. Caracterizou-se por uma progressiva melhora do padrão de vida das populações (habitação, saneamento, alimentação, educação) e um correspondente declínio das doenças infecciosas, que se iniciou várias décadas antes do aparecimento das sulfas e dos antibióticos e se acentuou após esses progressos da medicina. A expectativa de vida foi aumentando até ...