RESUMO Esse trabalho visa compreender, por meio de uma análise sociogenética e psicogenética, com base em dados obtidos por meio da História Oral, História de Vida e observação participante, os constrangimentos institucionais que alimentam as relações de consumo e as expressões culturais entre os Kalunga e como essas afetam a organização do grupo em torno da identidade quilombola na atualidade, formalizada pelo etnônimo Kalunga. A prerrogativa sincrônica e diacrônica adotada é que cada um desses afrodescendentes do nordeste goiano interseccionam a memória coletiva a que tiveram acesso durante sua experiência de vida, fundada na tradição, objetivada por seus habitus, com a lógica formal legitimada, a medida e de acordo com a intensidade do contato estabelecido com o ambiente técnico-informacional globalizado do mercado e burocrático-instrumental do estado. O acesso aos saberes e aos bens se faz mediante uma processualidade histórica e hierarquizante de longa duração (sociogênese), estabelecida por uma rede intricada de controles sobre a cognição e a volição dos indivíduos (piscogênese). Esse jogo do poder, por sua vez, efetiva diferentes níveis de contatos com os valores tidos universais, gerando um ambiente simbólico múltiplo e desigual, que suporta tanto a universalidade quanto a particularidade, tanto a identidade quanto a diferença. Tal constatação, no entanto, frustra o ideal de autenticidade edificado pela gnosiologia moderna, que tem inspirado o reconhecimento de comunidades tradicionais rurais no Brasil, já que esperam encontrar unidades coletivas, com uma cultura autêntica e independente, que se afirma em relação às outras culturas.