A Psiquiatria está sendo atingida, de certo modo tardiamente, pelas profundas modificações operadas nas idéias e interpretações do comportamento humano baseadas apenas no indivíduo isolado de seu grupo.As raízes metafísicas da psicopatologia muito contribuiram para retardar a evolução que hoje se processa, colocando a ciência do comportamento em flagrante atraso em relação às outras ciências do homem. A abertura freudiana inegavelmente representou rotura de certos tabus, liber¬ tando-nos de entraves incômodos nessa investigação. Entretanto, dogmatismo sectário determinou nova estagnação num campo que se prenunciava auspicioso para conquistas cientificamente bem fundamentadas e contribuiu para retardar a influência do enfoque social sobre a concepção do homem e de seu papel. É que, apenas aparentemente, o psiquiatra vienense teria levado em conta os fatores sociais nas suas concepções sobre o comportamento humano: a evolução do libido e o complexo de Édipo envolvem a constelação familiar, núcleo social por excelência. Também noutros trabalhos, muito ousados, por um processo de extrapolação de concepções ideadas para o indivíduo, Freud levou a conseqüências extremas a análise de fenômenos antropológico-culturais e religiosos, de nível social portanto, numa imperdoável falta de perspectiva filosófica o que, aliás, lhe custou justas e severas críticas. Assim, o espírito da obra freudiana é eminentemente individualista e o dogmatismo de que se reveste decorre precisamente de interpretação do mundo anímico do adulto, isolado do resto do universo e sujeito a leis e esquemas que já não mais sofrem as influências do mundo externo. Uma vez processada a marcha do indivíduo do nascimento aos 5 anos de idade, todo seu destino está traçado e o resto de sua vida é inteira e fatalmente sujeito às injunções que esses primeiros anos predeterminaram. O ego, mera instância de compromisso, é escravo do id, cujo poder desmesurado acabará por esmagá-lo nos casos de desobediência extrema. E o superego, forjado naquela fase pretérita, apesar de representar a introjeção de valores culturais, não vai pautar-se pelas normas atuais impostas pela existên-cia, mas sim pelo que do passado trouxe.Nos trabalhos em que analisa fenômenos sociais, o criador da psicaná-lise tomou às avessas o caso, e o comportamento grupai, mais complexo, foi por ele interpretado apenas como dimensão maior do fenômeno individual, psicológico. Os fatos sociais seriam, à luz da doutrina psicanalítica,