Meu pai faleceu no dia 04 de outubro de 1984. Durante muitos anos eu acreditei que, para entender a sua morte, deveria restituir sua trajetória, seguir cronologicamente suas experiências, entender suas escolhas e os caminhos que levaram à sua morte. Entretanto, algumas peças não se encaixavam, continuavam não explicando o que o teria levado a cometer um ato suicida (entendimento sobre sua morte recorrente até hoje). Em 2010, Flávia, minha irmã, lançou o premiado documentário Diário de uma busca, 1 no qual narra as histórias e as estórias do nosso pai, da nossa família, de seus amigos, da sua morte. A partir do filme, e principalmente movido pela repercussão, os usos, os comentários suscitados em blogs, artigos de jornais, entrevistas etc., pude então esboçar o que talvez estivesse faltando para mim. Sempre tive a sensação de que havia um descompasso entre o que era dito sobre meu pai e os sentidos que eu atribuía à sua vida/morte. Era como se para os outros houvesse uma sucessão de eventos encadeados de forma linear e quase autoexplicativos. Com início, meio e fim. Como se sua história obedecesse a um roteiro previamente instituído, e o sentido de ações, escolhas e emoções produzidas ao longo da sua vida pudessem ser ressignificados de forma clara e contínua dentro de um determinado campo de possibilidades. O exercício de pensar sua morte tornou-se então para mim a busca por uma perspectiva atemporal, em que o cruzamento entre passado, presente e futuro produzisse algum tipo de entendimento, e não necessariamente uma explicação.No dia 31 de abril de 2012, em frente ao Clube Militar do Rio de Janeiro e em meio à comemoração do 48º aniversário do golpe que depôs o presidente João Goulart, jovens militantes, ex-exilados, filhos e netos de presos políticos e desaparecidos no período do governo militar manifestavam-se