O ensino das ciências sociais e humanas na graduação em saúde coletiva: entre desafios e oportunidades de transgressões

Abstract

Resumo A implantação, em 2009, do curso de graduação em saúde coletiva (GSC) no Brasil e sua progressiva disseminação trouxe à tona velhas questões de ordem epistemológica, prática ou político-institucional relacionadas ao ensino das ciências sociais e humanas (CSH) nesse contexto e fez emergir outras. Sobretudo, esse novo curso recoloca no centro do debate a questão da identidade do campo da saúde coletiva ou as especificidades de seus objetos, atores/agentes, conhecimentos e práticas. Afinal, tanto os projetos pedagógicos (perfil de egresso, estrutura curricular etc.) quanto seu modus operandi refletem uma dada concepção do campo. Propõe-se, neste artigo, discutir peculiaridades e desafios do ensino das CSH na GSC, considerando esses elementos a partir da análise da experiência de um curso em particular ou, melhor dito, do compartilhamento de vivências e impressões das autoras que integram seu corpo docente. Na primeira parte do texto, são esboçados argumentos em defesa da formação emancipatória e do conhecimento pluriuniversitário, apoiados no diálogo com Boaventura de Souza Santos. Entende-se que tais perspectivas são especialmente bem-vindas na GSC, a qual tem se revelado um espaço profícuo de experimentação de novas formas de agir na educação e na saúde.

O ensino na graduação em saúde coletiva: o que dizem os projetos pedagógicos

“…As ciências sociais e humanas estarem em menor percentual aponta que essas temáticas precisam ter a matriz curricular ampliada, tendo em vista a dificuldade de aprofundamento dos enfoques teóricos e metodológicos. Chama a atenção, sobretudo, a pertinência desses componentes, por tratarem de assuntos relevantes para a teoria e a prática da saúde coletiva no desenvolvimento do pensamento crítico e reflexivo dos alunos, preconizado nas diretrizes 11,18 . Ressalta-se, ainda, a escassez de componentes com o termo de referência "SUS" numa graduação em saúde coletiva, apontado em apenas 18% dos cursos.…”

Antiracist ethos and the collective oral health as a pathway for life

“…Thus, supervised internships in Dentistry at the SUS are another opportunity for this anti-racist ethos, given its intentionality, responsibilities, and objectives 58 . Trad et al 59 propose breaking with the disciplinary format and focusing on practices in territories as the central axis of training, based on the questions: Which territories can provide significant learning? What do we take to the territory, and what do we intend to learn from it?…”

“…In Public Health, the stimulus in the teaching-learning process stems from sensitive and respectful listening to the Other, the critical and dialogical stance, and epistemological surveillance to foster interdisciplinary and interprofessional views among teachers and students that enhance the understanding of the health amid social, cultural, political and ideological processes 59 . The challenge to be overcome and which also limits the teaching staff refers to the existence of racially illiterate university staff or even a low presence of Black teachers.…”

Ethos antirracista em saúde bucal coletiva como imperioso à vida

“…A população negra é quem majoritariamente é usuária do SUS, por isso, os estágios supervisionados em Odontologia no SUS são mais um oportunidade para esse ethos antirracista, dada a sua intencionalidade, responsabilidades e objetivos 58 . Trad et al 59 propõem romper com o formato disciplinar e apostar nas práticas em territórios como eixo central da formação, tendo por base os questionamentos: que territórios podem proporcionar aprendizados significativos? O que levamos ao território e o que pretendemos aprender com ele?…”

“…Em Saúde Coletiva, o estímulo no processo de ensino-aprendizagem parte do exercício da escuta sensível e respeitosa do Outro, a postura crítica e dialógica e a vigilância epistemológica com a finalidade de fomentar entre docentes e discentes olhares interdisciplinares e interprofissionais que potencializem a compreensão da saúde em meio a processos sociais, culturais, políticos e ideológicos 59 . O desafio a ser superado e que também circunscreve o corpo docente refere-se à existência de quadros universitários iletrados racialmente ou, ainda, baixa presença de docentes negros e negras.…”