O ingresso das mulheres no ensino superior brasileiro teve início no final do século XIX, expandindo-se de modo significativo em várias carreiras a partir dos anos setenta do século XX, gerando um processo que tem sido chamado de feminização. Com esse termo, entendemos que a literatura especializada se refere não apenas a um aumento estatístico, mas às interferências de gênero nas escolhas e no exercício das atividades profissionais. Consideramos ainda que tal processo é tributário de vários fatores, notavelmente os avanços da escolarização das mulheres, apontados em pesquisas de Nara AZEVEDO e Luiz Otávio FERREIRA (2006), bem como em um estudo posterior liderado por este último em 2008, por exemplo.A primeira pesquisa constata que as políticas educacionais implantadas no Brasil a partir da década de 1920, gradativamente institucionalizadas no período Vargas, favoreceram a inserção profissional das mulheres na academia e na produção do conhecimento, tendo impacto significativo nos sistemas de gênero (AZEVEDO; FERREIRA, 2006). A segunda dá continuidade ao tema e investiga a crescente escolarização das mulheres no nível superior a partir dos anos 40, indicando suas repercussões na institucionalização do conhecimento científico e na profissionalização da pesquisa. Os/as autores analisam artigos de quatro revistas científicas publicadas entre os anos de 1939 e 1969, observando que, embora aqueles elaborados pelas mulheres não atingissem nem mesmo a metade da produção masculina, constituíam um avanço em relação aos períodos anteriores (FERREIRA, AZEVEDO, Moema GUEDES, Bianca CORTES, 2008).Na década anterior, Maria Helena Bueno TRIGO (1994) constatou a importância da criação da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade de São Paulo (USP), em 1934, para o ingresso das mulheres na academia e as consequentes mudanças de valores de gênero dentro e fora dessa instituição. O estudo sugere justamente que essa entrada em certas carreiras exerce, direta ou indiretamente, influência sobre escolhas e projetos profissionais, contribuindo para uma visão mais ampla das oportunidades e uma revisão dos valores tradicionais.Em um livro que se tornou um marco referencial na área, Fanny TABAK (2002) afirmou que até os anos 90 do século XX as carreiras científicas e tecnológicas ainda não eram uma prioridade para as estudantes do segundo grau. No caso da Medicina, a autora ressalta a feminização do campo a partir dos anos 70, lembrando, por exemplo, que na Universidade Federal do Rio de Janeiro, apenas 35% do contingente do curso de graduação eram compostos por mulheresno ano de 1977, ao passo que em1990 a proporção quase dobrava, chegando a 62%. Os dados levantados pela autora nessa instituição mostraram que uma situação semelhante ocorreu nas Engenharias, outra área ocupada majoritariamente pelos homens.Moema de Castro Guedes (2008), em uma perspectiva também histórica, focalizou a presença das mulheres nos cursos universitários e nas pós-graduações, situando-a no contexto das grandes mudanças da sociedade brasileira. A...