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1 Narradoras indígenasEmbora tenha nascido em Belém, na Amazônia e seja incontestável minha descendência indígena, a primeira inserção consciente nas zonas de conflitos culturais entre os povos indígenas e seus outros aconteceu já na condição de professora, no Planetário do Pará, em 1999, quando estive pela primeira vez com os Tembé-Tenetehara. Eu fazia parte de uma equipe interdisciplinar, cujo principal objetivo era traduzir de forma didática os conceitos da astronomia ocidental para os estudantes de Belém e das cidades vizinhas.Os Tembé e os saberes de astronomia agenciados pelas narrativas indígenas de diferentes sociedades logo me faziam perceber outras cosmologias. Se nos cursos de capacitação oferecidos pelo Planetário aprendíamos a demarcar os limites científicos entre a astrofísica e a mitologia grega, os saberes indígenas, os únicos que nos deixavam ver o céu da Amazônia, inscreviam-se em uma outra epistemologia. Nestapara mim nova -perspectiva, ciência, arte e religião estavam imbricadas e era possível perceber diferentes dimensões do tempo presente.Um grupo de 20 tembé esteve no Planetário, diante de nós, explicando sua cosmologia, a forma como os caminhos do céu se entrelaçavam com os da terra, da água, do vento. Suas experiências de vida não se encerravam num passado finalizado. O céu, então, pluralizava-se aos meus olhos e passava a ser uma grande colcha de retalhos. Naquele momento conheci as manchas de jenipapo no rosto de Zahy, as flechinhas por meio das quais os animais chegam ao céu e podem virar estrelas. Definitivamente não estava diante de uma literatura pós-colonial ou pré-colonial.Havia um grande interesse por parte dos Tembé em nos fazer conhecer seus saberes, suas estrelas, suas narrativas. Faz parte da história dessa sociedade, contactada há mais de 400 anos, a constante acusação de 1 Doutora em linguística e professora da Universidade Federal do Pará (UFPA), Belém, PA, Brasil. E-mail: ivanianeves@ufpa.br ------------As histórias de Murué Suruí e Kudã'í Tembé estudos de literatura brasileira contemporânea, n. 53, p. 149-175, jan./abr. 2018. 150que não são mais indígenas. Seus saberes de astronomia, assim como as narrativas cosmológicas, provavelmente anteriores ao contato, ainda que atualizadas pelas movências históricas desta sociedade, não foram criadas para o deleite do colonizador, nem o tomaram como referência. Eles percebiam a questão política que envolvia esses saberes como afirmação identitária. Já naquele primeiro momento também conheci outro gênero de narrativa desse povo, aquele que King (2004) classificou como polêmica: as histórias do contato na versão indígena.As narradoras indígenas destacaram-se em minhas pesquisas e a condição de mulher me deu acesso a lugares femininos, nos quais aprendi a entender as relações de poder entre os núcleos familiares. No rastro dessa epistemologia de colchas de retalhos no céu, agora considero essas narradoras sujeitas de sua história, em desalinho com a história da colonização brasileira, instituída e forjada por sujeitos autorizados po...
1 Narradoras indígenasEmbora tenha nascido em Belém, na Amazônia e seja incontestável minha descendência indígena, a primeira inserção consciente nas zonas de conflitos culturais entre os povos indígenas e seus outros aconteceu já na condição de professora, no Planetário do Pará, em 1999, quando estive pela primeira vez com os Tembé-Tenetehara. Eu fazia parte de uma equipe interdisciplinar, cujo principal objetivo era traduzir de forma didática os conceitos da astronomia ocidental para os estudantes de Belém e das cidades vizinhas.Os Tembé e os saberes de astronomia agenciados pelas narrativas indígenas de diferentes sociedades logo me faziam perceber outras cosmologias. Se nos cursos de capacitação oferecidos pelo Planetário aprendíamos a demarcar os limites científicos entre a astrofísica e a mitologia grega, os saberes indígenas, os únicos que nos deixavam ver o céu da Amazônia, inscreviam-se em uma outra epistemologia. Nestapara mim nova -perspectiva, ciência, arte e religião estavam imbricadas e era possível perceber diferentes dimensões do tempo presente.Um grupo de 20 tembé esteve no Planetário, diante de nós, explicando sua cosmologia, a forma como os caminhos do céu se entrelaçavam com os da terra, da água, do vento. Suas experiências de vida não se encerravam num passado finalizado. O céu, então, pluralizava-se aos meus olhos e passava a ser uma grande colcha de retalhos. Naquele momento conheci as manchas de jenipapo no rosto de Zahy, as flechinhas por meio das quais os animais chegam ao céu e podem virar estrelas. Definitivamente não estava diante de uma literatura pós-colonial ou pré-colonial.Havia um grande interesse por parte dos Tembé em nos fazer conhecer seus saberes, suas estrelas, suas narrativas. Faz parte da história dessa sociedade, contactada há mais de 400 anos, a constante acusação de 1 Doutora em linguística e professora da Universidade Federal do Pará (UFPA), Belém, PA, Brasil. E-mail: ivanianeves@ufpa.br ------------As histórias de Murué Suruí e Kudã'í Tembé estudos de literatura brasileira contemporânea, n. 53, p. 149-175, jan./abr. 2018. 150que não são mais indígenas. Seus saberes de astronomia, assim como as narrativas cosmológicas, provavelmente anteriores ao contato, ainda que atualizadas pelas movências históricas desta sociedade, não foram criadas para o deleite do colonizador, nem o tomaram como referência. Eles percebiam a questão política que envolvia esses saberes como afirmação identitária. Já naquele primeiro momento também conheci outro gênero de narrativa desse povo, aquele que King (2004) classificou como polêmica: as histórias do contato na versão indígena.As narradoras indígenas destacaram-se em minhas pesquisas e a condição de mulher me deu acesso a lugares femininos, nos quais aprendi a entender as relações de poder entre os núcleos familiares. No rastro dessa epistemologia de colchas de retalhos no céu, agora considero essas narradoras sujeitas de sua história, em desalinho com a história da colonização brasileira, instituída e forjada por sujeitos autorizados po...
Specifically Canadian approaches to postcolonial studies acknowledge and trace the legacies of colonialism within Canada in relation to Indigenous peoples, Quebec, and English Canada within a framework of officially recognized multiculturalism in a bilingual context. Particular to the Canadian context of postcolonial studies is the foundational recognition of Canada's history as a colony that was responsible for the subjugation and colonization of Indigenous peoples. This highlights the complicated nature of postcolonialism in Canada – as a colony that colonized intranationally. In addition, postcolonialists consider the history of the independence movement in Quebec and the ongoing critical engagement with cultural and linguistic diversity and official multiculturalism. Contemporary postcolonialism in Canada emerged out of the study of world literatures written in English, with an emphasis on issues of marginalization, hybridity, local language development, educational reform, and “writing back.” It persists in conjunction with studies of critical race, diaspora, globalization, environmentalism, and Indigenous rights.
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