Resumo No Brasil, o conjunto de medidas administrativas, judiciais, legais, a aplicação de atividades compensatórias, de ações educativas e de políticas de memória assumidas ao acerto de contas com a violência cometida pelos agentes do Estado durante a ditadura civil-militar (1964-1985) levam em conta ações compensatórias, educativas e políticas de memória e verdade agenciadas por meio dos trabalhos da Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos, da Comissão de Anistia e da Comissão Nacional da Verdade. Questiona-se aqui a possibilidade de as representações feitas pelas medidas de justiça de transição implementadas pelas comissões de reparação e de verdade assumirem um sentido terapêutico, condicionando a perlaboração dos traumas decorrentes das atrocidades perpetradas pelos agentes da repressão. Para isso, no contexto no qual o Estado brasileiro implementa medidas ao reconhecimento, à reparação, à reconciliação, ao esclarecimento e à responsabilização dos crimes da repressão, submetem-se as narrativas produzidas pelas comissões de reparação e de verdade a uma análise que leva em conta o processo de perlaboração do trauma dessas experiências. Averiguado que as debilidades do processo transicional brasileiro inibem o debate e o engajamento social, dificultam o reconhecimento da violência, colocam obstáculos à simbolização e à apreensão coletiva de suas representações e conduzem os seus termos ao esquecimento ou à revisão, conclui-se que as representações feitas pelas medidas de justiça transicional não condicionam a perlaboração social dos legados traumáticos da violência cometida pelos agentes da repressão durante a ditadura civil-militar no Brasil. Tais condições seguem dificultando que um trabalho de memória da violência da ditadura se configure em um trabalho de perlaboração dos legados de seus traumas.